Introdução
Somos uma partícula que surge na arena da existência e logo desaparece. Apesar da pequenez do ser humano, nosso pensamento caminha na esfera da imaginação mais rápido do que a luz, e é mais fértil do que o solo mais rico.
Sabemos muitas coisas sobre o mundo que nos cerca, mas sabemos pouquíssimo sobre nós mesmos, sobre a nossa psique. O que é pensar? Quais os limites e alcances dos pensamentos? Quem somos? O que somos? O que é existir? O que é a morte? Quem é o Autor da existência? Deus é real ou uma construção articulada pelo mundo das ideias? Se Deus existe, por que se esconde atrás da cortina do tempo e do espaço?
Embora milhões de pessoas não percebam, a oração do Pai-Nosso toca frontalmente em todas essas questões. Apesar de ser o texto mais recitado e conhecido da história, talvez seja o menos compreendido. Um texto aparentemente simples, mas bombástico para quem esquadrinha o que está em suas entrelinhas.
A obra Os segredos do Pai-Nosso se divide em duas partes. A primeira analisa o trecho da oração que se inicia com “Pai-Nosso” e termina com “Seja feita a Tua vontade assim na terra como no céu” (Mateus 6:10). Nela, estudamos algumas fascinantes características da personalidade de Deus, bem como as suas necessidades psíquicas fundamentais.
A segunda parte, que estuda o trecho da oração que começa com “O pão nosso de cada dia nos dá hoje” (Mateus 6:11), aborda as necessidades psíquicas fundamentais dos seres humanos, assim como algumas características relevantes de nossa personalidade.
A primeira parte disseca a alma de Deus e a segunda disseca a alma humana. Neste livro trataremos da primeira parte.
O conteúdo da oração do Pai-Nosso, juntamente com diversas palavras ditas por Jesus em suas biografias – os evangelhos –, revelam algumas características de Deus que passaram despercebidas aos olhos da teologia.
A oração do Pai-Nosso resgata-nos do entorpecimento e nos dá um choque de lucidez. Ela oxigena a nossa mente e implode nosso conformismo. É instigadora e provocativa, uma fonte perturbadora de enigmas que nos liberta do cárcere da rotina.
Ao estudá-la neste livro precisamos reconhecer nossa pequenez e nossas limitações. Devemos sempre nos lembrar de que somos andarilhos que vagam no traçado da existência em busca de grandes respostas no pequeno parêntese do tempo.
Capítulo 1
O homem que proferiu a oração do Pai-Nosso
A brevidade da vida é espantosa, e os fenômenos que a envolvem são assombrosos. Choramos ao nascer, sem compreender o mundo em que entramos. Morremos em silêncio, sem entender o mundo de que saímos.
Quem nos colocou no anfiteatro da existência para saborear a vida e depois de alguns momentos nos fazer despedir dela?
Ao longo deste livro falarei das ideias de grandes ateus. A maioria deles existiu por causa das loucuras praticadas pelas religiões, como a discriminação, a exclusão, as injustiças, as guerras e os massacres.
Esforcei-me muitíssimo para eliminar Deus como possibilidade de ser o Autor da existência, mas, depois de muito estudo, vi que isso era impossível.
Antes da existência do mundo, de qualquer ser, de micro-organismos, galáxias, planetas, estrelas, átomos ou partículas atômicas, havia o “nada”, o vácuo existencial. Em meu discurso ateísta pensei: “No princípio era o nada e o nada gerou todas as coisas.”
Mas o nada jamais poderá ser despertado do sono da irrealidade, pois vive o pesadelo eterno da inexistência. O nada e o vácuo existencial não são criativos. Só a existência pode gerar existência.
Tal abordagem leva a uma grande tese filosófica: Deus não é uma hipótese da fé, mas uma verdade científica. Se eliminarmos Deus do processo criativo, eliminamos a própria existência, retornamos ao vácuo completo, imergimos na esterilidade tirânica do nada.
Pode-se usar qualquer teoria para explicar o mundo e a natureza – do big-bang à teoria da evolução biológica –, mas nenhuma delas pode incluir o “nada” ou o “vácuo existencial” na origem. Em algum momento da cadeia de indagações, Deus – ou o nome que se queira dar a ele – tem de aparecer. Só não aparecerá se a sequência de perguntas for interrompida, seja pelo ateísmo, pelo preconceito, seja, principalmente, pela dificuldade de expandir a arte da dúvida e o mundo das ideias.
A oração do Pai-Nosso, uma parada estratégica
As sociedades evoluíram em muitos aspectos, em alguns, estacionaram e, ainda, em outros, involuíram. Evoluímos muito na medicina curativa e preventiva. Prolongamos a vida. Algumas populações vivem em média 80 anos.
No passado, vivia-se menos, mas a vida passava mais devagar. Hoje as pessoas estão sempre apressadas, estressadas, sem tempo para conviver com aqueles que amam e para cuidar de si mesmas. Não sabem fazer pausas estratégicas para corrigir suas rotas.
A oração do Pai-Nosso é uma dessas excelentes paradas estratégicas que Jesus fez para pensar os segredos que tecem a vida e refletir sobre os seus mais importantes projetos.
O tempo parou para que ele analisasse os ditames da vida. Jesus instigou seus ouvintes a expandir sua capacidade de observar, interiorizar, deduzir, criticar e agir. Não queria gerar servos tímidos, frágeis, submissos, mas pensadores livres que mudassem a geografia da história, pelo menos da própria história.
Nesse clima, ele ensinou a sua famosa oração. Ela é dirigida a todo ser humano, mas em especial aos que têm coragem para se esvaziar e se tornar eternos aprendizes, aos que procuram a serenidade e a mansidão, aos que têm sede e fome de justiça, aos que querem construir uma nova sociedade.