“O primeiro princípio é não enganar a si mesmo –
e você é a pessoa mais fácil de ser enganada.”
– Richard P. Feynman
Para quem é este livro?
Este livro é dedicado aos iniciantes na área do raciocínio lógico, principalmente àqueles que – para usar uma expressão de Pascal – são feitos de tal maneira que aprendem melhor por meio de imagens. Selecionei os 19 erros de argumentação mais comuns e usei ilustrações claras e divertidas para explicá-los, complementando com vários exemplos. Minha expectativa é que o leitor aprenda nestas páginas algumas das principais armadilhas encontradas em discursos e debates, para então conseguir identificá-las e evitá-las na prática.
Prefácio
A literatura sobre lógica e falácias lógicas é ampla e variada. Existem diversos livros que se propõem a ensinar o leitor a utilizar as ferramentas e paradigmas que sustentam um bom raciocínio, de forma a produzir debates mais construtivos. No entanto, ler sobre o que não se deve fazer também é muito útil. Em seu livro Sobre a escrita, Stephen King afirma: “Aprende-se mais claramente o que não se deve fazer por meio da leitura de prosa ruim.” Ele descreve essa experiência terrível como “o equivalente literário da vacina contra a varíola”. Já George Pólya teria afirmado em uma conferência sobre o ensino da matemática que, além de se entender bem a disciplina, é necessário saber como não entendê-la. Este livro trata fundamentalmente do que não se deve fazer em uma argumentação.
O diferencial aqui está no uso de ilustrações bem-humoradas para descrever os erros de raciocínio que assolam o debate público atual. Elas são inspiradas em parte por alegorias como as de A revolução dos bichos, de George Orwell, e pelo humor nonsense presente nos textos de Lewis Carroll. Mas, ao contrário do que acontece nessas obras, aqui não há uma história costurando as ilustrações; trata-se de cenas distintas, conectadas somente pelo estilo e pelo tema. Cada falácia está exposta apenas em uma página, o que, espero, tornará mais fácil que cada falha de argumentação seja aprendida, lembrada e sirva de referência muitas vezes.
Muitos anos atrás, trabalhei desenvolvendo software. Era uma forma intrigante de raciocinar por meio da matemática, em vez da linguagem falada. Trazia precisão no lugar da ambiguidade em potencial e rigor aonde antes havia um certo improviso.
Nessa mesma época, li alguns livros sobre lógica, tanto modernos quanto medievais, entre eles Nonsense: A Handbook of Logical Fallacies (Nonsense: Um manual sobre falácias lógicas), de Robert Gula. Esse livro me fez lembrar de uma lista de normas que eu havia anotado uma década antes sobre a arte de argumentar – conclusões que tirei após vários anos debatendo com estranhos na internet – incluindo, por exemplo: “Tente não fazer generalizações.” Hoje sei que isso é óbvio, mas, para o jovem estudante que eu era, foi uma descoberta e tanto.
Logo ficou evidente para mim que formalizar o raciocínio traz benefícios como clareza de pensamento e expressão, aumento de objetividade e autoconfiança. A capacidade de analisar os argumentos dos outros também ajuda a perceber o momento certo de se retirar de discussões infrutíferas.
Hoje, com as redes sociais, há cada vez maior participação no debate público sobre fatos do dia, política, liberdades civis. Mas há uma notável falta de raciocínio lógico e fundamentação em boa parte desse discurso. Espero contribuir de alguma forma para aprimorar essas discussões.
Claro que a lógica não é a única ferramenta usada em debates e é bom estar ciente das outras. A retórica provavelmente é a mais importante, seguida de conceitos como o ônus da prova e a navalha de Occam (princípio segundo o qual na explicação de um fenômeno devem se apresentar apenas as premissas necessárias, eliminando todas as outras; também é conhecido como o princípio da parcimônia). O leitor interessado pode consultar a ampla literatura existente sobre o assunto.
É preciso ressaltar que as regras da lógica não são leis do mundo natural, nem constituem a totalidade do raciocínio humano. Como afirma o cientista cognitivo Marvin Minsky, é difícil explicar o simples bom senso em termos de princípios lógicos, bem como as analogias. Ele acrescenta: “A lógica não consegue explicar como pensamos, assim como a gramática não consegue explicar como falamos.” A lógica não gera novas verdades, mas permite que se verifiquem a consistência e a coerência das cadeias de pensamento existentes. Exatamente por isso é uma ferramenta eficaz para a análise e a comunicação de ideias e argumentos.
Ali Almossawi, São Francisco, outubro de 2013