Resiliência | Sextante
Livro

Resiliência

Este livro pertence à coleção INTELIGÊNCIA EMOCIONAL

Harvard Business Review

Resiliência faz parte da Coleção Inteligência Emocional, que reúne os melhores artigos da Harvard Business Review sobre as habilidades sociais necessárias para encarar os desafios profissionais.

 

“Resiliência” se tornou a palavra da moda no mundo corporativo – e por uma boa razão.

A aptidão para se adaptar, crescer e prosperar em meio às adversidades tem sido a chave para o sucesso de muitas pessoas e para a existência de negócios duradouros.

Este livro ajudará você a entender como tirar lições mesmo das críticas mais amargas e se tornar capaz de enfrentar os diferentes estresses do dia a dia, abordando temas como:

  • O mecanismo da resiliência
  • Como avaliar, gerenciar e fortalecer sua resiliência
  • Como grandes líderes se reergueram após desastres em suas carreiras
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Ficha técnica
Lançamento 17/04/2020
Título original Resilience (HBR's Emotional Intelligence Series)
Tradução Paulo Geiger
Formato 12 x 18 cm
Número de páginas 144
Peso 200 g
Acabamento brochura
ISBN 978-85-431-0966-4
EAN 9788543109664
Preço R$ 39,90
Ficha técnica e-book
eISBN 978-85-431-0967-1
Preço R$ 24,99
Ficha técnica audiolivro
ISBN 9786555640137
Duração 02h 20min
Locutor Pérola Paes
Lançamento 17/04/2020
Título original Resilience (HBR's Emotional Intelligence Series)
Tradução Paulo Geiger
Formato 12 x 18 cm
Número de páginas 144
Peso 200 g
Acabamento brochura
ISBN 978-85-431-0966-4
EAN 9788543109664
Preço R$ 39,90

E-book

eISBN 978-85-431-0967-1
Preço R$ 24,99

Audiolivro

ISBN 9786555640137
Duração 02h 20min
Locutor Pérola Paes
Preço US$ 7,99

Leia um trecho do livro

O mecanismo da resiliência

Três traços de quem dá a volta por cima

Diane L. Coutu

Quando comecei minha carreira jornalística como repórter de uma revista de circulação nacional, havia na redação um homem a quem chamarei de Claus Schmidt. Ele tinha uns 50 e poucos anos e, para uma jovem facilmente impressionável, era a encarnação do jornalista das antigas: às vezes cínico, mas implacavelmente curioso e cheio de vida, e com frequência muito engraçado, ainda que de um modo meio grosseiro. Produzia matérias de capa e outros artigos contundentes com uma rapidez e uma elegância com as quais eu apenas podia sonhar. Sempre me surpreendeu o fato de ele nunca ter sido promovido a editor-executivo.

As pessoas que o conheciam melhor do que eu o viam não apenas como um grande jornalista, mas também como um sobrevivente por excelência, alguém que resistia bravamente em um ambiente muitas vezes hostil ao talento. Ele passara por pelo menos três grandes mudanças na liderança da revista, perdendo a maioria de seus melhores amigos e colegas pelo caminho. Em casa, dois de seus filhos sucumbiram a doenças incuráveis e o terceiro morreu em um acidente de trânsito. Apesar de tudo – ou talvez por causa de tudo isso –, ele andava pela redação, dia após dia, orientando os novatos e falando sobre os livros que estava escrevendo, sempre aguardando com expectativa o que o futuro poderia lhe trazer.

Por que algumas pessoas passam por adversidades e não esmorecem? Claus Schmidt poderia ter reagido de forma bem diferente. Todo mundo já viu esse filme. Alguns indivíduos parecem não conseguir readquirir a autoconfiança depois de serem demitidos; outros, deprimidos após o divórcio, passam alguns anos desligados da vida. A pergunta que gostaríamos de ver respondida é: por quê? Qual é exatamente essa característica da resiliência que faz com que pessoas sigam em frente?

Trata-se de uma questão que me fascina desde que aprendi sobre os sobreviventes do Holocausto no ensino fundamental. Na faculdade, e mais tarde durante meus estudos como pesquisadora na Boston Psychoanalytic Society and Institute, retomei o assunto. Nos últimos meses, no entanto, redobrei minha atenção sobre o tema, pois me parece que o terrorismo, a guerra e a recessão tornaram a compreensão acerca da resiliência mais importante do que nunca. Tenho estudado tanto a natureza da resiliência individual quanto o que torna algumas organizações mais resilientes do que outras. Por que algumas pessoas e algumas organizações cedem sob pressão? E o que faz com que outras se curvem e, no final, voltem a se erguer?

Minhas pesquisas me ensinaram muito, embora a resiliência seja um tema que jamais entenderemos por completo. De fato, é um dos grandes mistérios da natureza humana, como a criatividade e a religiosidade. Mas, ao estudar as pesquisas psicológicas e ao refletir sobre as numerosas histórias de resiliência que ouvi, consegui vislumbrar um pouco mais do coração e da mente de pessoas como Claus Schmidt e, assim, também observei com mais profundidade a psique humana.

O frenesi acerca da resiliência

No ambiente corporativo, a resiliência é um assunto em alta. Há pouco tempo, eu conversava com um sócio sênior de uma respeitada consultoria sobre como selecionar os melhores profissionais com MBA – o quesito mais importante naquele setor. O sócio, Daniel Savageau (nome fictício), assinalou os itens de uma longa lista de qualidades que sua empresa procurava nas contratações: inteligência, ambição, integridade, capacidade analítica e assim por diante.

– E quanto à resiliência? – perguntei.

– Bem, é uma qualidade bastante popular no momento – disse ele. – É a palavra da moda. Os candidatos chegam a nos dizer que são resilientes antes mesmo de perguntarmos. Francamente, eles são jovens demais para saber. Resiliência é algo que só descobrimos que temos depois de passar por alguma experiência.

– Mas, se fosse possível, você faria um teste para averiguar? Isso tem importância no mundo dos negócios?

Savageau fez uma pausa. Ele tem quase 50 anos e é bem-sucedido nas esferas pessoal e profissional. No entanto, não teve uma trajetória totalmente tranquila até o topo. Começou a vida em Woonsocket, Rhode Island, nos Estados Unidos, como um canadense de origem francesa de poucos recursos, que perdera o pai aos 6 anos. Teve a sorte de receber uma bolsa de estudos para jogar futebol americano, mas foi expulso duas vezes da Boston University por embriaguez. Quando tinha 20 e poucos anos, sua vida deu uma reviravolta – casou, se divorciou, voltou a casar e criou cinco filhos. No caminho, conseguiu juntar e perder duas fortunas antes de ajudar a criar a empresa de consultoria que atualmente dirige.

– Tem, sim – falou por fim. – Na verdade, provavelmente importa mais do que qualquer característica que em geral buscamos nas pessoas.

Durante o período que passei estudando para escrever este artigo, ouvi a mesma declaração várias vezes. Como relata Dean Becker, presidente e CEO da Adaptiv Learning Systems, empresa de King of Prussia, na Pensilvânia, que desenvolve e vende programas de treinamento para resiliência:

“Mais do que a escolaridade, mais do que a experiência, mais do que o treinamento, é o nível de resiliência que determina quem é bem-sucedido e quem fracassa. Isso pode ser verificado na ala de oncologia dos hospitais, nos Jogos Olímpicos e na sala de reuniões.”

A pesquisa acadêmica sobre a resiliência começou há cerca de 40 anos, com os estudos pioneiros feitos por Norman Garmezy, hoje professor emérito da Universidade de Minnesota, em Minneapolis, Estados Unidos. Depois de pesquisar por que muitos filhos de pais esquizofrênicos não sofriam males psicológicos, apesar da convivência, ele concluiu que um tipo de resiliência tem um papel maior na saúde mental do que se suspeitava.

Hoje em dia, sobram teorias acerca do que compõe a resiliência. Ao analisar vítimas do Holocausto, Maurice Vanderpol, ex-presidente da Boston Psychoanalytic Society and Institute, descobriu que muitos dos sobreviventes saudáveis dos campos de concentração tinham o que ele chama de “escudo plástico”. O escudo era composto por vários fatores, entre eles o senso de humor. Com frequência o humor era mórbido, mas ainda assim fornecia um senso de perspectiva crítico. Outras características essenciais eram a capacidade de estabelecer relações com os outros e de delimitar um espaço psicológico interno, o que protegia os sobreviventes das invasões de pessoas abusivas. Pesquisas sobre outros grupos revelaram diferentes qualidades associadas à resiliência.

O Search Institute, organização sem fins lucrativos baseada em Minneapolis especializada na resiliência e na juventude, descobriu que crianças mais resilientes têm uma capacidade excepcional de fazer com que os adultos as ajudem. Outras pesquisas ainda mostraram que jovens resilientes que moram em bairros pobres com frequência têm talentos, tais como habilidade esportiva, que atraem outras pessoas.

Muitas das teorias iniciais sobre resiliência enfatizavam o papel da genética. Algumas pessoas simplesmente nascem resilientes, diziam os argumentos. Existe alguma verdade nisso, claro, mas um conjunto cada vez maior de evidências empíricas demonstra que a resiliência – seja em crianças, em sobreviventes de campos de concentração ou em negócios ressurgidos do nada – pode ser aprendida. Por exemplo, George Vaillant, diretor de Estudos de Desenvolvimento Adulto da Harvard Medical School, em Boston, observa que, entre diversos grupos analisados durante um período de 60 anos, alguns indivíduos se tornaram marcadamente mais resilientes com o passar dos anos. Outros psicólogos alegam que pessoas não resilientes desenvolvem habilidades de resiliência com mais facilidade do que aquelas com uma vantagem inicial.

A maioria das teorias com que me deparei durante a pesquisa é bastante sensata. Mas também observei que quase todas se sobrepõem de três maneiras. Pessoas resilientes, afirmam, possuem três características: uma aceitação ferrenha da realidade; uma crença profunda, com frequência baseada em valores enraizados, de que a vida tem sentido; e uma capacidade excepcional de improvisar. É possível se recuperar de reveses com apenas uma ou duas dessas qualidades, mas a pessoa só é realmente resiliente se tiver as três. Essas três características também valem para as organizações. Vamos dar uma olhada em cada uma delas.

Enfrentar a realidade

Uma crença comum acerca da resiliência é a de que ela seria resultado de uma natureza otimista. Isso é verdadeiro apenas se esse otimismo não distorcer a noção de realidade. Em situações extremamente adversas, o pensamento cor-de-rosa pode, na verdade, significar desastre. Esse ponto me foi relatado de forma comovente pelo pesquisador de administração e escritor Jim Collins, que se deparou com esse conceito em sua pesquisa para Empresas feitas para vencer, livro sobre como as companhias se transformam a partir da mediocridade. Collins tinha o palpite (equivocado) de que as empresas resilientes estavam repletas de gente otimista. Ele apresentou essa ideia ao almirante Jim Stockdale, preso e torturado pelos vietcongues durante oito anos.

Collins recorda: “Perguntei a Stockdale: ‘Quem não conseguiu sair dos campos?’ E ele disse: ‘Ah, isso é fácil. Foram os otimistas. Eram eles que diziam que iríamos sair até o Natal. E depois disseram que sairíamos até a Páscoa, e depois até o Quatro de Julho, e até o Dia de Ação de Graças, e depois novamente no Natal.’ Então Stockdale se virou para mim e disse: ‘Sabe, acho que todos morreram de desilusão.’”

No mundo dos negócios, Collins teve contato com a mesma atitude impassível, compartilhada por executivos nas empresas mais bem-sucedidas que estudou. Como Stockdale, pessoas resilientes têm uma visão bastante sóbria e sensata em relação às partes da realidade que importam para a sobrevivência. Não quero dizer com isso que não há espaço para o otimismo: a fim de reverter uma força de venda desmoralizada, por exemplo, evocar um sentimento de possibilidade pode ser uma ferramenta bastante poderosa. Mas, para desafios maiores, uma noção de realidade mais indiferente, quase pessimista, é muito mais importante.

Talvez você se pergunte: “Realmente compreendo – e aceito – a realidade da minha situação? Minha empresa compreende?” São boas perguntas, principalmente porque a pesquisa sugere que a maioria das pessoas entra em negação como mecanismo de sobrevivência. Enfrentar a realidade, realmente enfrentá-la, é um trabalho extenuante. De fato, pode ser desagradável e com frequência é devastador em termos emocionais. Vamos analisar a seguinte história sobre resiliência organizacional e ver o que significa confrontar a realidade.

Antes de 11 de setembro de 2001, o famoso banco de investimentos Morgan Stanley era o maior locatário do World Trade Center. A empresa tinha cerca de 2.700 funcionários trabalhando na torre sul, em 22 andares, entre o 43º e o 74º. Naquele dia terrível, o primeiro avião acertou a torre norte às 8h46 da manhã, e o Morgan Stanley começou a ser evacuado um minuto depois. Quando o segundo avião se abateu contra a torre sul, 15 minutos depois, os escritórios do Morgan Stanley estavam praticamente vazios. A empresa perdeu sete de seus funcionários, apesar de ter sido praticamente atingida em cheio.

É óbvio que foi pura sorte a organização estar localizada na segunda torre. A empresa de serviços financeiros Cantor Fitzgerald, cujos escritórios foram atingidos no primeiro ataque, não poderia ter feito nada para salvar seus funcionários. Ainda assim, foi o realismo implacável do Morgan Stanley que possibilitou que a empresa se beneficiasse de sua sorte. Logo depois do ataque de 1993 ao World Trade Center, os gestores seniores reconheceram que trabalhar em um local tão simbólico, espelho do poder comercial dos Estados Unidos, tornava a empresa vulnerável à atenção de terroristas e a possíveis ataques.

Com essa compreensão sombria, o Morgan Stanley lançou um programa de preparação em nível micro. Poucas empresas levam a sério o exercício de simulação de incêndio, mas isso não acontece no Morgan Stanley, cujo vice-presidente de segurança do Grupo de Investimento Individual, Rick Rescorla, adotou uma disciplina militar no trabalho. Veterano condecorado do Vietnã e altamente resiliente, Rescorla fez questão de assegurar que as pessoas saberiam exatamente o que fazer no caso de uma catástrofe. Quando o desastre se instalou no 11 de Setembro, Rescorla pegou o megafone e mandou os funcionários manterem a calma e seguirem as regras que já tinham praticado tanto, embora alguns supervisores do edifício insistissem que estava tudo bem. Infelizmente, o próprio Rescorla, cuja história de vida foi bastante examinada nos últimos meses, foi um dos sete que não conseguiram se salvar.

“Quando se trabalha na área financeira, onde se depende muito da tecnologia, o planejamento de contingência é grande parte do negócio”, diz o presidente e diretor-executivo de operações Robert G. Scott. Mas o Morgan Stanley estava preparado para uma realidade bastante crua. Tinha não apenas um, mas três pontos de encontro para os funcionários, de onde o trabalho poderia seria conduzido caso os escritórios fossem danificados. “Ter escritórios para emergências parecia uma enorme extravagância no dia 10 de setembro”, reconhece Scott. “Mas, no dia 12 de setembro, virou uma ideia genial.”

Talvez fosse genial; sem dúvida, foi uma obra da resiliência. O fato é que, quando encaramos a realidade, podemos nos preparar para agir, nos tornando capazes de enfrentar e sobreviver a adversidades extremas. Nós nos treinamos a sobreviver antes que o fato aconteça.

A busca por significado

A capacidade de enxergar a realidade está intimamente ligada ao segundo tijolo que forma a resiliência: a propensão a ver sentido nos tempos terríveis. Todos nós conhecemos aqueles que, no sofrimento, jogam as mãos para o alto e gritam: “Como isso pode estar acontecendo comigo?” Enxergam a si mesmos como vítimas e não aprendem nada ao passar por momentos difíceis. Mas pessoas resilientes elaboram cenários sobre seu sofrimento, a fim de criar uma espécie de significado para si mesmas e para os outros.

Tenho uma amiga, a quem chamarei de Jackie Oiseaux, que passou por diversos episódios de psicose durante um período de dez anos por sofrer de transtorno bipolar não diagnosticado. Atualmente, ela tem um ótimo emprego em uma das principais editoras do país, constituiu família e é membro importante de sua comunidade religiosa. Quando lhe perguntam como se recuperou das crises, ela passa as mãos no cabelo. “Às vezes as pessoas dizem: ‘Por que eu?’ Mas eu sempre disse: ‘Por que não eu?’ É verdade, perdi muitas coisas ao longo de minha doença, mas encontrei muitas mais: amigos incríveis que me ajudaram durante os tempos mais sombrios e que darão sentido à minha vida para sempre.” Essa dinâmica de dar sentido é, segundo a maioria dos pesquisadores, o modo como pessoas resilientes constroem pontes que ligam os dias de adversidade a um futuro melhor, mais completo. Essas pontes tornam o presente administrável – por falta de palavra melhor – ao remover a sensação de que ele é insuportável. Esse conceito foi lindamente articulado por Viktor E. Frankl, psiquiatra austríaco e sobrevivente de Auschwitz. Em meio a um sofrimento assombroso, Frankl inventou a “terapia do sentido”, ou a logoterapia, uma técnica de terapia humanística que ajuda os indivíduos a tomar os tipos de decisão que vão criar significado para sua vida.

Em seu livro Em busca de sentido, Frankl descreveu o momento fundamental, no campo de concentração, em que desenvolveu a terapia do sentido. Estava a caminho do trabalho forçado, decidindo, preocupado, se deveria trocar seu último cigarro por um prato de sopa. Perguntava-se como iria trabalhar com um novo capataz que sabia ser particularmente sádico. Então ficou desgostoso ao constatar como sua vida tinha se tornado trivial e sem sentido. Percebeu que, para sobreviver, teria que encontrar algum propósito. Frankl passou a se imaginar dando uma palestra, depois da guerra, sobre a psicologia do campo de concentração, a fim de ajudar os que haviam ficado do lado de fora a entender o que ele havia enfrentado. Mesmo sem ter certeza de que sobreviveria, Frankl estabeleceu alguns objetivos concretos para si. Assim, conseguiu superar os sofrimentos do momento. Como escreveu em seu livro: “Não devemos nunca esquecer que podemos encontrar o sentido da vida mesmo quando confrontados com uma situação desanimadora, quando enfrentamos um destino que não pode ser mudado.”

A teoria de Frankl é a base da maioria dos treinamentos de resiliência nos negócios. De fato, fiquei surpresa com a frequência com que sua obra é mencionada por homens de negócios. “Treinamento de resiliência – o que chamamos de endurecer – é uma forma de ajudar as pessoas a dar sentido ao cotidiano”, explica Salvatore R. Maddi, professor de psicologia da Universidade da Califórnia em Irvine e diretor do Hardiness Institute, em Newport Beach, Califórnia. “Quando as pessoas percebem a força do treinamento em resiliência, em geral dizem: ‘Doutor, isso é psicoterapia?’ Mas psicoterapia é para as pessoas cuja vida se desmantelou de modo drástico e precisa de conserto. Vemos nosso trabalho como um modo de mostrar habilidades e atitudes para a vida das pessoas. Talvez essas lições devessem ser ensinadas em casa ou na escola, mas não são. Então acabamos fazendo isso na empresa.”

No entanto, o desafio que treinadores em resiliência enfrentam é quase sempre mais difícil do que podemos imaginar. O sentido pode ser fugidio, e só porque o encontramos uma vez isso não significa que vamos mantê-lo ou encontrá-lo de novo. Vejamos o exemplo de Aleksandr Soljenítsin, que sobreviveu à guerra contra os nazistas, à prisão no gulag e ao câncer. Quando se mudou para uma fazenda no pacífico e seguro estado americano de Vermont, não conseguiu lidar com o “Ocidente infantil”. Não conseguiu identificar nenhum significado real naquilo que considerava ser uma liberdade destrutiva e irresponsável. Incomodado com seus críticos, exilou-se em sua casa com cercas e trancas e quase nunca mais foi visto em público. Amargurado, Soljenítsin retornou à Rússia em 1994.

Uma vez que encontrar sentido no contexto pessoal é um aspecto muito importante da resiliência de cada indivíduo, não deveria ser surpresa que as organizações e pessoas mais bem-sucedidas possuam fortes sistemas de valor. Valores fortes infundem sentido num ambiente porque oferecem meios de interpretar e moldar acontecimentos. Embora hoje em dia esteja em voga ridicularizar os valores, certamente não é coincidência que a organização mais resiliente do mundo seja a Igreja Católica, que sobreviveu a guerras, corrupção e rupturas por mais de dois mil anos, em grande parte devido a seus dogmas. Os negócios que sobrevivem também têm crenças que lhes fornecem um propósito além de simplesmente ganhar dinheiro. É notável como muitas empresas descrevem isso em termos religiosos. A gigante farmacêutica Johnson & Johnson, por exemplo, chama de O Credo sua carta de princípios, entregue a todos os novos funcionários. A UPS constantemente cita seu Propósito Nobre.

Sistemas de valor em empresas resilientes mudam muito pouco com o passar dos anos e as sustentam em tempos de crise. O presidente e CEO da UPS, Mike Eskew, acredita que o Propósito Nobre tenha auxiliado a empresa a se recuperar depois da terrível paralisação de 1997. Ele diz: “Foi uma época muito difícil, como uma briga de família. Todo mundo tinha amigos dos dois lados e foi complicado escolher uma posição. O que nos salvou foi o Propósito Nobre. Independentemente do lado que assumiram, todos compartilhavam um conjunto comum de valores. Esses valores são essenciais para nós e nunca mudam; eles moldam nossas decisões mais importantes. Nossa estratégia e nossa missão podem mudar, mas nossos valores, nunca.”

A conotação religiosa de palavras como “credo”, “princípios” e “propósito nobre”, no entanto, não deve ser confundida com o conteúdo real do que defendem. As empresas podem ter valores eticamente questionáveis e ainda assim ser bastante resilientes. Vejamos a Phillip Morris, que demonstrou resiliência impressionante diante da impopularidade crescente. Como observa Jim Collins, a Phillip Morris tem valores bastante fortes, ainda que não concordemos com eles – por exemplo, aquele que defende a “escolha adulta”. Mas não há dúvida de que os executivos da Phillip Morris acreditam nesses valores, e a força de sua crença diferencia a empresa da maioria das outras companhias de tabaco. Nesse contexto, é importante notar que a resiliência não é nem má nem boa em termos éticos. Trata-se apenas da habilidade e da capacidade de ser forte sob condições de estresse e durante grandes mudanças. Como escreveu Victor Frankl: “Em geral, somente conseguiram se manter vivos aqueles prisioneiros que, depois de passarem anos indo de um campo a outro, haviam perdido todos os seus escrúpulos na luta pela existência; eles estavam preparados para usar qualquer meio, honesto ou não, até mesmo brutal… a fim de se salvarem. Nós que voltamos… sabemos: os melhores não retornaram.”

Valores positivos ou negativos são, na verdade, mais importantes para a resiliência nas organizações do que ter pessoas resilientes na folha de pagamento. Se os funcionários resilientes estão todos interpretando a realidade de modo diferente, suas decisões e ações podem muito bem entrar em conflito, colocando em jogo a sobrevivência da organização. E, quando a fraqueza de uma organização se torna evidente, indivíduos altamente resilientes têm maior probabilidade de descartar a organização do que de colocar a própria sobrevivência em risco.

Criatividade ritualizada

O terceiro tijolo com o qual se constrói a resiliência é a capacidade de se virar com o que está disponível. Os psicólogos seguiram o exemplo do antropólogo francês Claude Lévi-Strauss, que chamou essa capacidade de bricolagem.1 Surpreendentemente, a raiz dessa palavra está intimamente ligada ao conceito de resiliência, que literalmente significa “se recuperar rapidamente”. Lévi-Strauss diz: “Antigamente o verbo bricoler […] era usado em referência a algum movimento diferente, peculiar: uma bola que rebate, um cão que se desgarra ou um cavalo que dá uma guinada a fim de evitar um obstáculo.”

Bricolagem, no sentido moderno, pode ser definida como um tipo de criatividade, a capacidade de improvisar uma solução para um problema sem ter as ferramentas ou os materiais adequados. Os bricoleurs estão sempre mexendo em alguma coisa – montando rádios com peças caseiras ou consertando o próprio carro. Tiram o máximo do que têm e encontram novos usos para os objetos. Nos campos de concentração, por exemplo, prisioneiros resilientes recolhiam pedaços de fio ou fiação sempre que os encontravam. Aquilo poderia se tornar útil mais tarde – talvez para consertar um par de sapatos que, em temperaturas baixíssimas, poderia fazer a diferença entre a vida e a morte.

Quando as situações se desdobram, os bricoleurs se viram e imaginam possibilidades enquanto os outros ficam confusos. Tenho dois amigos, que vou chamar de Paul Shields e Mike Andrews, que dividiram o quarto durante os anos de faculdade. Não foi surpresa para ninguém quando, depois de se formarem, montaram um negócio juntos para vender material educativo para escolas, empresas e consultorias. No começo, a empresa foi um grande sucesso, tornando os dois fundadores milionários. Mas a recessão do começo da década de 1990 atingiu a empresa em cheio, e muitos clientes debandaram. Na mesma época, Paul passou por um divórcio difícil e por uma depressão que o impossibilitou de trabalhar. Mike se ofereceu para comprar a parte de Paul, mas foi surpreendido por um processo judicial, sob a alegação de que estava tentando roubar o negócio. Nesse momento, uma pessoa menos resiliente poderia simplesmente se afastar da confusão. Mas não Mike. Enquanto o caso tramitava pelos tribunais, ele manteve a empresa como podia – transformando várias vezes o negócio até achar um modelo que funcionasse: formar joint- -ventures para vender material de treinamento em inglês para empresas chinesas e russas. Mais tarde, ele diversificou para a publicação de newsletters para clientes. A certa altura, chegou a escrever roteiros de vídeo para os concorrentes. Graças a toda essa bricolagem, quando o processo foi decidido a seu favor, Mike tinha um negócio completamente diferente e bem mais sólido do que aquele que havia começado.

A bricolagem também pode ser praticada em um nível mais elevado. Richard Feynman, ganhador do Prêmio Nobel de Física em 1965, exemplificou o que gosto de chamar de bricolagem intelectual. Por pura curiosidade, Feynman se tornou um especialista em arrombar cofres, não apenas observando a mecânica do arrombamento, mas também juntando percepções psicológicas sobre pessoas que usam cofres e definem os códigos. Ele arrombou muitos dos cofres de Los Alamos, por exemplo, porque imaginou que físicos teóricos não criariam códigos com números aleatórios, fáceis de esquecer, mas usariam, pelo contrário, uma sequência com significado matemático. No final, descobriu que os códigos dos três cofres que continham todos os segredos da bomba atômica foram definidos com a mesma constante matemática e, cujos seis primeiros dígitos são 2,71828.

Organizações resilientes estão lotadas de bricoleurs, ainda que nem todos sejam um Richard Feynman. De fato, empresas que sobrevivem encaram o improviso como habilidade essencial. Vejamos a UPS, que dá poder aos motoristas para fazer o que for preciso a fim de entregar pontualmente uma encomenda. O CEO Eskew afirma: “Dizemos a nossos funcionários para fazer o trabalho. Se precisarem improvisar, eles vão improvisar. De outra forma, não poderíamos fazer o que fazemos todos os dias. Pense em tudo que pode dar errado: um semáforo quebrado, um pneu furado, uma ponte interditada. Se uma nevasca atingir Louisville hoje à noite, um grupo de pessoas vai se reunir e discutir como resolver o problema. Ninguém pede a elas que façam isso. Elas se reúnem porque essa é a nossa tradição.”

Fiel a essa tradição, a empresa realizou entregas no sudeste da Flórida apenas um dia depois de o furacão Andrew ter devastado a região em 1992, causando bilhões de dólares em danos. Muitas pessoas estavam vivendo em seus carros porque suas casas haviam sido destruídas. No entanto, os motoristas e gerentes da UPS classificavam pacotes em outro local e faziam entregas mesmo para aqueles que estavam confinados nos automóveis. Em grande parte, foi sua capacidade de improvisação que permitiu que ela continuasse a funcionar depois da catástrofe. E esse fato criou um sentido de propósito e significado em meio ao caos.

A improvisação do tipo praticado pela UPS, no entanto, passa longe da criatividade desenfreada. Na verdade, de modo muito similar aos militares, a UPS vive de acordo com regras e regulamentos. Como diz Eskew: “Os motoristas sempre colocam a chave no mesmo lugar. Fecham a porta do mesmo modo. Usam o uniforme do mesmo jeito. Somos uma empresa de precisão.” Ele acredita que, embora pareçam sufocantes, foram as regras que permitiram à empresa reagir rapidamente após o furacão Andrew, pois possibilitaram que as pessoas se concentrassem nos reparos essenciais para continuar o trabalho.

A opinião de Eskew encontra eco em Karl E. Weick, professor de comportamento organizacional na Escola de Administração da Universidade de Michigan em Ann Arbor e um dos mais respeitados pensadores da psicologia organizacional. “Existem muitas evidências de que, quando colocadas sob pressão, as pessoas regridem aos modos mais habituais de reação que conhecem”, escreveu Weick. “O que não esperamos sob pressão, em risco de vida, é ter criatividade.” Em outras palavras, as regras e os regulamentos que fazem com que algumas empresas pareçam menos criativas podem, na verdade, torná-las mais resilientes em épocas de turbulência real.

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