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As engrenagens do sucesso: o que faz alguém ser bem-sucedido?
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As engrenagens do sucesso: o que faz alguém ser bem-sucedido?

“Fora de série – Outliers” revista a trajetória de personalidades distintas e identifica padrões que ajudaram na construção do êxito. Para Malcolm Gladwell, “as realizações extraordinárias resultam mais das oportunidades do que do talento”.

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“Fora de série – Outliers” revista a trajetória de personalidades distintas e identifica padrões que ajudaram na construção do êxito. Para Malcolm Gladwell, “as realizações extraordinárias resultam mais das oportunidades do que do talento”

A proposta de Fora de série – Outliers é das mais instigantes: desbravar os caminhos que levam certas pessoas a se destacarem num ofício, eventualmente se firmando como verdadeiros fenômenos. Personalidades como os Beatles e Bill Gates estão na lista, mas há também homens e mulheres, fora dos holofotes, com trajetórias tão ou mais excepcionais que os colegas famosos.

A máxima nos lembra que “o único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário”. Mais que confirmar a sabedoria, o livro de Malcolm Gladwell investiga o novelo do êxito e apresenta denominadores comuns que perpassam trajetórias muito distintas entre si. O talento é apenas uma das forças convergentes. Como o escritor propõe desde o início, é preciso sempre olhar além do indivíduo. E o que isso significa?  Em parte, “aceitar a idéia de que os valores do mundo que habitamos e as pessoas que nos cercam exercem um grande efeito em quem nós somos”.

Acumular vantagens

Colunista da prestigiada revista The New Yorker, Gladwell visita vários personagens ao longo dos nove capítulos do livro – além da introdução e do epílogo – que exploram a teoria defendida pela publicação: “há algo profundamente errado com o modo como entendemos o sucesso”. Por si só, ele frisa, as qualidades individuais – personalidade, nível de inteligência, estilo de vida – não o explicam. Ao contrário. Afinal, é o acúmulo constante de vantagens  uma de suas marcas recorrentes. Ou seja, quando e onde nascemos, qual é a profissão dos nossos pais e as circunstâncias de nossa criação são determinantes para carreiras bem-sucedidas. Uma vantagem leva a outra. Tendo isso em vista, o autor acredita que é possível melhorar nosso desempenho a partir do que ele chama de legado cultural, herança sem a qual é impossível compreender a dinâmica do mundo.

Num trecho do livro, o jornalista confirma seu espanto quando Jeb Bush, à época candidato ao governo da Flórida, nos Estados Unidos, afirmou ser “um homem que se fez sozinho”. Ora, o sobrenome não engana: Jeb  é filho de um presidente norte-americano, irmão de um presidente americano e neto de um rico senador e banqueiro de Wall Street. Se fez sozinho? A ideia de alguém que surge do nada é veementemente refutada por Gladwell.

O contexto o interessa profundamente, e sua análise desnuda os argumentos por trás da ideia de meritocracia. “Somente perguntando de onde elas são poderemos deslindar a lógica por trás de quem é ou não bem-sucedido”, afirma. A descoberta de padrões é algo fascinante, como o jornalista mostra ao analisar os times de hóquei do Canadá (a maioria dos jogadores nasceu entre janeiro e março) e os principais nomes envolvidos na revolução digital no Vale do Silício (Bill Gates, Paul Allen, Steve Ballmer, Steve Jobs, por exemplo, todos nascidos de 1953 a 1956). Em “Fora de série – Outliers”, ele mostra as engrenagens por trás de certas coincidências.

O tempo do sucesso e a oportunidade

Dez mil horas. Segundo o neurologista Daniel Levitin, cujo pensamento foi aproveitado no livro, esse é o tempo mínimo de prática que define a excelência em qualquer atividade (de jogador de basquete à escritor). Dez mil horas, ou três horas por dia, 20 por semana, durante dez anos. O número mágico, Gladwell explica, é fruto da análise de diversos estudos sobre expertise. Esse tempo se aplica, inclusive, a Mozart, um dos mais renomados compositores da história, que criou suas obras-primas quando tinha mais de uma década de prática.

O jornalista lapida o termo – “A prática não é aquilo que uma pessoa faz quando se torna boa em algo, mas aquilo que ela faz para se tornar boa em algo” – e ressalta que, justamente por levar muito tempo, a expertise é algo raro, dificilmente alcançada por um adulto jovem sem algum tipo de incentivo ou apoio. Mais uma vez aqui, o contexto sociocultural sobressai e a ideia de meritocracia afunda.

Além do tempo, há outro substantivo elementar nessa conversa: a oportunidade. “As realizações extraordinárias resultam mais das oportunidades do que do talento”, sintetiza.

Foi ela que selou o passe rumo ao estrelato dos Beatles, quarteto composto por John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr. O escritor lembra que dez anos separam os primeiros encontros do que viria a ser a banda de suas realizações artísticas mais aclamadas, caso dos discos Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967) e Álbum Branco (1968). Da mesma forma, ainda sobre o começo da carreira, Gladwell identifica a importância das apresentações feitas em casas de shows de Hamburgo, na Alemanha, iniciativa de um empresário local que contratou grupos de rock, ainda sem muita experiência de palco, para tocar por horas seguidas. Numa entrevista, Lennon contou que o show por lá durava até oito horas, sete dias na semana.

Os números sopram a favor do sucesso dos garotos de Liverpool: “Na época em que começaram a estourar, em 1964, já haviam se apresentado ao vivo cerca de 1.200 vezes. Você tem idéia de quanto isso é extraordinário? A maioria das bandas atuais não toca 1.200 vezes nem durante toda a carreira. A prova de Hamburgo foi o que fez com que os Beatles se destacassem dos demais grupos de rock”, avalia o jornalista, reforçando a importância desse intensivo na formação do quarteto. Para Gladwell, Hamburgo representou justamente a oportunidade, um elemento recorrente ao analisar a trajetória de outras figuras: “Golpes de sorte não costumam ser exceção entre bilionários do software, celebridades do rock e astros dos esportes. Pelo contrário, parecem constituir a regra”.

Este post foi escrito por:

Filipe Isensee

Filipe é jornalista, especialista em jornalismo cultural e mestrando do curso de Cinema e Audiovisual da UFF. Nasceu em Salvador, foi criado em Belo Horizonte e há oito anos mora no Rio de Janeiro, onde passou pelas redações dos jornais Extra e O Globo. Gosta de escrever: roteiros, dramaturgias, outras prosas e alguns poucos versos estão em seu radar.

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