PREFÁCIO
Abilio, o Homem de Ferro
No panteão dos super-heróis, um de meus favoritos é Tony Stark. Ele não tem superpoderes presenteados pela natureza ou pelo acaso; constrói a si mesmo. Acompanho os filmes da franquia Homem de Ferro desde o primeiro, quando Stark é sequestrado por terroristas e cria para si uma armadura que o fortalece nas disputas com oponentes. E vibro com a maneira como, a cada nova produção, ele vai se recriando sob ataque.
No panteão dos empresários brasileiros, o mais parecido com Stark é Abilio Diniz. Reconstruindo-se em todas as adversidades, sejam pessoais, familiares, de negócios ou macroeconômicas, ele sempre volta mais forte e melhor do que antes.
Para descrevê-lo, não basta usar o conceito de resiliência, emprestado do mundo da física. Resiliência pressupõe o retorno do material a seu estado anterior à pressão. Abilio constrói outro estado, aperfeiçoado, e por isso a armadura continuamente melhorada do Homem de Ferro é uma metáfora que lhe cai tão bem.
Você lerá sobre isso nas páginas a seguir. Brigas (com parentes ou com sócios) e crises (do país, do setor ou de seu negócio em particular) só o levaram a tornar sua empresa cada vez mais competitiva e estrategicamente diferenciada. Ele fez isso com o Grupo Pão de Açúcar, com a BRF e, agora, está fazendo com o Carrefour.
Isso não significa que Abilio seja infalível, como, aliás, o Homem de Ferro não é. E eu gosto particularmente desse caráter de humanidade do empresário. Ele é um homem que acredita em Deus, muito ligado à família – seus filhos o idolatram –, que adora praticar esportes.
Tudo isso não se limita à esfera pessoal. Essa preocupação com saúde e qualidade de vida, Abilio estende aos amigos – quantas vezes ele não me doutrinou sobre esse tema, sabedor de que sou um ex-tenista “quebrado” pelas competições (risos). E, sobretudo, estende a seus funcionários, que contam com programas de exercícios no que já mostrou ser uma ação exemplar de responsabilidade social empresarial.
Abilio também levou sua preocupação com saúde a iniciativas de cidadania corporativa. Patrocina com regularidade projetos sociais voltados ao esporte, incluindo, mais recentemente, um sofisticado centro da prefeitura paulistana chamado Núcleo de Alto Rendimento Esportivo de São Paulo (NAR), que avalia e prepara atletas para otimizar o desempenho esportivo.
No que se refere a sua humanidade, gosto especialmente da capacidade de aprendizado constante, apesar de poucas pessoas entenderem de varejo como ele no mundo. Essa é a mesma característica que viabiliza a permanente reconstrução da armadura, no caso do Homem de Ferro.
Quer um exemplo? Abilio é conhecido como um negociador voraz e, de fato, assim foi forjado pelas circunstâncias da vida. Mas, percebendo que esse estilo não funciona mais tão bem como antes, buscou a ajuda de William Ury e tratou de aprender a “flexibilizar-se”.
Outra evidência? Líder descrito como excessivamente duro por tanta gente, Abilio entendeu a mudança de paradigma para um ambiente mais colaborativo e está desenvolvendo novas habilidades na área, tanto com a consultoria de Jim Collins quanto no contato com os jovens da geração Y nas aulas que ministra no curso de liderança da FGV-EAESP.
A permanente disposição de aprender me faz concluir que Abilio aplica bem um dos ensinamentos de ouro de Peter Drucker, o pai da administração moderna: a lição da árvore. Em sua última entrevista antes de falecer, que foi concedida a mim, Drucker disse: “Árvores não crescem até o céu, José.” Assim ele descrevia o limitado ciclo de sucesso da maioria das empresas, de trinta anos em média, e o desafio fundamental da gestão – se o esperado é o fracasso dos negócios depois de determinado tempo, o que os gestores precisam fazer é “enganar” a natureza, levando-os a renascer tantas vezes quanto for possível.
Abilio, assim como o Homem de Ferro e como Peter Drucker, é a própria materialização dessa simbologia da árvore. Reinventou seu Pão de Açúcar em sucessivas ocasiões e reconstrói-se o tempo todo diante de nossos olhos (o paralelo com a árvore se aplica também aos gestores que com ele trabalham).
Deve ser por essa razão que ele nunca deixa de acreditar no Brasil. Poderia ter se aposentado há muito tempo, mas continua investindo no país, sem recuar, sem querer ir morar em Miami, mesmo com todos os percalços pelos quais já passou.
Quero terminar este prefácio propondo dois novos desafios ao felizmente eterno aprendiz Abilio (eu sei quanto ele gosta de ser desafiado). O primeiro é o de internacionalizar seus negócios e sua gestão, algo que ele começa a fazer com sua participação no Carrefour.
O segundo é o de gerar novos Abilios, a exemplo do que Jorge Paulo Lemann, do fundo 3G, sempre busca fazer. Abilio já cria novos líderes, sem dúvida, mas ainda não criou novos Abilios. Ele tem de seguir o exemplo de Homem de Ferro 3, em que Tony Stark desenvolve uma multidão de superarmaduras.
Abilio tem, a meu ver, esse desafio pessoal a vencer. Mesmo que ele não o faça, estou certo de que este livro inspirará o surgimento de novos Abilios entre os jovens gestores e empreendedores.
A história desse grande – e polêmico – empresário brasileiro nunca foi bem contada. Agora será. E o poder que isso tem é tão imprevisível quanto o poder do Homem de Ferro em permanente reconstrução.
José Salibi Neto
Cofundador da HSM