Como a nossa vida é linda | Sextante

Como a nossa vida é linda

Kyong Ja An e Chan Jae Lee

Uma celebração do amor

Uma celebração do amor

 

Um testemunho comovente dos laços de amor entre avós e netos dispersos pelo mundo.

“Cada post ensina uma lição, compartilha uma lembrança e leva uma mensagem. Um livro encantador!” — BBC

 

 

Vovô Chan e vovó Marina viviam em São Paulo quando sua filha decidiu voltar para a Coreia, terra de seus antepassados, levando os dois netos, Arthur e Allan.

Saudoso e entristecido, Chan começou a retratar situações do dia a dia em aquarelas delicadas, acompanhadas de textos escritos por Marina.

Publicados no Instagram, os posts eram apenas um projeto familiar. Um jeito original de preservar a conexão com os netos e, ao mesmo tempo, restaurar no avô o entusiasmo pela vida.

Mas as postagens viralizaram e ganharam fãs no mundo inteiro.

Este livro reúne vários desses desenhos e textos, numa celebração do amor familiar que atravessa gerações e não se deixa limitar pela geografia.

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Ficha técnica
Lançamento 14/06/2022
Título original Looking Back Life Was Beautiful
Tradução Ana Ban
Formato 14 x 19 cm
Número de páginas 304
Peso 390g
Acabamento Brochura
ISBN 978-65-5564-392-3
EAN 9786555643923
Preço R$ 59,90
Ficha técnica e-book
eISBN 978-65-5564-393-0
Preço R$ 39,99
Lançamento 14/06/2022
Título original Looking Back Life Was Beautiful
Tradução Ana Ban
Formato 14 x 19 cm
Número de páginas 304
Peso 390g
Acabamento Brochura
ISBN 978-65-5564-392-3
EAN 9786555643923
Preço R$ 59,90

E-book

eISBN 978-65-5564-393-0
Preço R$ 39,99

Leia um trecho do livro

PREFÁCIO

Hoje, assim como todos os dias, estamos pensando no que vamos desenhar. Estamos sempre em busca de inspiração e conversando sobre nossas ideias. Então, quando meu marido faz um desenho, eu escrevo alguma coisa para acompanhar. Apesar de ele não se considerar um artista – e eu não me considerar escritora –, nós seguimos em frente.

Sempre que penso em nossa vida juntos, uma palavra me vem à mente e faz meu coração disparar, tomado pela emoção. A palavra é in-yeon e significa “encontro do destino” ou algo do tipo. Uma conexão predestinada.

Nós dois nascemos em Seul, na Coreia do Sul, em 1942, o ano do cavalo. Entramos na Faculdade de Educação da Universidade Nacional de Seul em 1961, onde nos conhecemos. No início do nosso terceiro ano, quando a faculdade organizou uma exposição de poemas e pinturas, inscrevi um poema bem curto intitulado “Maçã”, e um aluno que eu nunca tinha visto antes foi designado para ilustrá-lo. Quando vi a pintura que ele fez, fiquei contente. Era uma pintura abstrata e perfeita para o meu poema, e fez com que eu tivesse um novo apreço pelas palavras que havia escrito.

Satisfeita, olhei para o rapaz que tinha feito a pintura. Era Chan Jae Lee.

No último dia da exposição, todos os estudantes que haviam participado comemoraram em uma festa com pipoca. Ao perceber que nossas casas ficavam para o mesmo lado, eu e Chan acabamos indo embora juntos.

Quem poderia imaginar que a semente de um in-yeon plantada em 1963 – aquele poema e a pintura complementar que nos uniu e se transformou no nosso amor – iria dar novos brotos tantos anos mais tarde e produzir uma flor tão bela quanto este livro.

Nós dois passamos pela Guerra da Coreia com a mesma idade e tivemos uma infância pobre antes de conseguirmos entrar na universidade, por isso compartilhamos muitas características e experiências. Quando Chan Jae passou três anos longe, cumprindo o serviço militar obrigatório, sofri como se tivesse ido no lugar dele. No restante do tempo em que namoramos, nós nos encontrávamos quase todo dia e conversávamos sobre tudo que se pode imaginar. Já não me lembro de todos os detalhes daquela época, mas ainda me recordo com clareza de quando nos sentávamos com outros estudantes no gramado da universidade, tocando violão e cantando “Blowin’ in the Wind”, de Bob Dylan.

Nós nos casamos em 1967, quando tínhamos apenas 25 anos. Olhando para trás, parece cedo, mas na época sentíamos que era a coisa certa a fazer. Como estávamos decididos a ser professores, concordamos que não havia necessidade de termos filhos. Começamos nossa vida de casados em um quartinho alugado em Singil-dong. Era só um cômodo pequeno na casa do nosso senhorio, tipo uma quitinete. Ainda consigo visualizar nitidamente aquela casa de tijolinhos vermelhos. Nós dois trabalhávamos em tempo integral como professores de escola; meu marido ensinava ciências, e eu, coreano. Fomos felizes durante alguns anos sem filhos, mas, depois de um tempo, a ideia de ter nossos próprios pequeninos por perto foi se tornando mais atraente. Então, na manhã no dia 1o de março de 1971, dei à luz nosso primogênito. Logo depois que nosso filho nasceu, compramos nosso bem mais precioso, uma câmera Asahi Pentax, só para tirar fotos dele. Éramos um jovem casal muito consciente e aderimos ao slogan do governo: “Independentemente de serem meninas ou meninos, tenha apenas dois filhos e os eduque da maneira correta.” Bom… na verdade não éramos tão conscientes assim. Naquela época, isso era apenas o que todo mundo fazia. Dia e noite, a qualquer lugar que você fosse, deparava com esse slogan, e ele tinha um estranho poder de persuasão que não conseguíamos deixar de seguir.

Na década de 1970, a Coreia do Sul ainda era um país muito pobre e, em 1974, meus pais e irmãos mais novos fizeram as malas e emigraram para o Brasil em busca de uma vida melhor. Então, em março do ano seguinte, nossa filha nasceu. Eu chorei muito, me sentindo completamente sozinha… Não tinha nenhum motivo específico para estar triste, mas eu chorava sem parar. Como naquela época não se falava disso, eu não sabia, mas agora acho que deve ter sido depressão pós-parto. No meio daquele ano, as coisas melhoraram e fiquei animada quando compramos uma geladeira Taihan Electric Wire. Quando a instalamos na cozinha da nossa primeira casa de verdade, sussurramos que aquele era o nosso segundo bem mais precioso, depois da câmera. Começamos a construir uma vida feliz. Criávamos coelhos no quintal e uma trepadeira selvagem de rosas vermelhas cobria a parede externa da casa. O cachorro, Kongkongi, e o peixinho dourado que morava no laguinho do jardim eram os amigos do nosso filho.

Então, um dia, meu pai veio nos visitar. Quando ele e minha mãe se mudaram para o Brasil com meus três irmãos mais novos e minha irmã, deixaram para trás três filhas, inclusive eu, que já tinham se casado. Mas agora meu pai tinha vindo buscar o restante de nós e nossas famílias. Ele se reuniu com cada um dos três genros e perguntou se estavam dispostos a partir. Os três disseram que sim, e então meu pai foi visitar os três casais de sogros para perguntar se permitiriam que seus filhos e noras partissem, e a resposta foi a mesma. Em 1981 embarcamos no aeroporto de Gimpo sem nenhum medo ou temor.

Graças à ajuda dos meus irmãos mais novos, pudemos nos estabelecer em São Paulo com bastante conforto. Dois anos depois, quando já estávamos nos acostumando à vida no Brasil, abrimos uma loja de roupas chamada Boutique Symphony. Meu marido comprava as roupas e nossos três funcionários brasileiros e eu dávamos conta de vender. Nos dois primeiros anos, nossas vendas foram tão boas no Natal que as crianças iam à loja ajudar a dobrar as caixas de presente, e precisamos contratar alguns vendedores temporários. Quem diria que tomar conta de uma loja seria tão emocionante? É mesmo verdade o que as pessoas na Coreia diziam, que ter um negócio é melhor do que ter um Ph.D.! Claro, na época achamos que a economia permaneceria daquele jeito para sempre. Não porque éramos bobos ou porque não líamos os jornais brasileiros. Mas, por sermos pessoas comuns, ambiciosas e trabalhadoras – incapazes de pressentir as incertezas e a época imprevisível que se aproximavam –, apenas vivíamos de acordo com a lei da inércia, esperando que cada dia fosse igual ao anterior. Mas as coisas mudaram, e os coreanos que vivem no Brasil dizem sempre a mesma coisa: “Este ano foi ainda pior do que o anterior. O que podemos fazer?” E então os amigos brasileiros oferecem conforto, dizendo: “Vai melhorar.”

Os anos se passaram e nossos filhos tiveram seus próprios filhos. Arthur e Allan, os dois da nossa filha, nascidos com dois anos de diferença, eram nossos anjinhos. Às vezes, quando eu segurava um deles no colo, era como se acalentasse meu próprio filho, que eu abraçava daquele mesmo jeito, tanto tempo atrás, em Seul. Outras vezes, era como se eles se transformassem na personificação da fofura. O amor por eles foi um enorme presente na minha velhice. Quando o mais velho fez 3 anos, eu me sentia como se tivesse essa mesma idade, e quando eles entraram no ensino fundamental, eu os acompanhei. Nós brincávamos de esconde-esconde e de encontrar o maior número de palavras possível começando com a letra “A”. Depois que o meu marido se aposentou, o trabalho dele passou a ser levar Arthur e Allan para a escola, e ele ficou cinco anos levando os dois de manhã e buscando à tarde.

O tempo que passávamos com nossos netos era muito caloroso e gostoso, até que, de repente, nossa filha anunciou que a família dela iria se mudar para a Coreia. Foi um choque para nós.

Apesar de nosso filho já estar morando longe, em Nova York, foi ele quem ficou mais preocupado com a situação de Chan quando a família da nossa filha partisse para a Coreia, em janeiro de 2015. Ele sabia que o pai acabaria passando o tempo todo assistindo à televisão em estado de letargia. Um dia, do nada, nosso filho sugeriu: “Pai, você deveria desenhar.” Ele se lembrava de como o pai desenhava figuras em pedaços de papelão quando ele era menino. Mas, como tinha ficado cada vez mais teimoso com o passar dos anos, meu marido não deu ouvidos. “Que bobeira! Por que eu começaria a desenhar agora?” Mas eu juntei forças com o nosso filho para convencê-lo. Então ele finalmente cansou de escutar nossas súplicas e desenhou uma paisagem urbana com a legenda “nuvens deprimentes”. Fez também um cavalo, uma estátua e algumas imagens aleatórias como postes de luz, palmeiras e latas de lixo. Comecei a escrever legendas mais longas para os desenhos, e nosso filho nos ensinou a postar no Instagram, para que ele pudesse acompanhar o que estávamos fazendo. Mas, passados alguns meses, a frequência dos desenhos diminuiu à medida que o interesse de Chan foi morrendo.

Algum tempo depois, nosso terceiro neto, Astro, nasceu em Nova York. Ficamos muito felizes e viajamos para os Estados Unidos para conhecê-lo pessoalmente. Um dia, durante o jantar, meu marido de repente perguntou ao nosso filho:

“O que será que Astro vai ser quando crescer?”

“Por que essa pergunta, pai?”, questionou nosso filho.

“Porque até lá eu não vou estar mais aqui.”

Meu filho ficou em silêncio por um momento… Depois disse que nunca tinha refletido sobre a nossa velhice nem sobre a nossa inevitável morte. Então ele teve uma ideia, e sugeriu a Chan que começasse a desenhar para os netos; assim, quando eles crescessem, saberiam o tipo de homem que o avô tinha sido. Também combinamos que, quando eu escrevesse uma historinha para acompanhar cada imagem, nosso filho iria traduzir para o inglês e a nossa filha para o português.

Foi assim que o meu marido começou a desenhar para os nossos netos.

Chamamos a conta do Instagram de “Drawings_for_My_Grandchildren” (Desenhos para os meus netos). Então nosso filho fez um vídeo bem simples para explicar por que e como um velho ranzinza com mais de 70 anos tinha começado a usar o Instagram e postou no Facebook. Gente no mundo todo se identificou com o vídeo e ele logo se espalhou, ganhando milhões de “curtidas”.

É surpreendente, mas, desde que meu marido começou a desenhar para os nossos netos – apesar de normalmente detestar ficar preso a qualquer coisa –, ele continua desenhando todos os dias. Sem que ninguém o obrigue, ele também fotografa os desenhos com o celular e posta no Instagram. E compartilha as imagens e lê os comentários que as pessoas deixam para nós, tudo sozinho. Toma muito cuidado para não cometer nenhum erro, e embora agora já esteja bem acostumado a tudo isso, eu sei que não é nada fácil para ele. É complicado para os mais velhos terem confiança quando se trata de ser criativo, isso sem falar em usar tecnologia. Depois de apenas um ou dois dias sem treinar, computadores e smartphones podem parecer muito confusos!

O vídeo do nosso filho acabou chamando a atenção de um jornalista da BBC, que o compartilhou junto com um artigo sobre nós. Foi assim que “as histórias no Instagram de um avô coreano que mora longe” ficaram famosas. Recebemos uma enxurrada de pedidos de entrevistas de todos os tipos de canais de mídia, e foi muito estranho e maravilhoso quando ex-alunos e amigos de escola começaram a entrar em contato conosco depois de verem a notícia. Os comentários e as mensagens que recebemos do mundo todo nos emocionam até hoje. Coisas como:

“Obrigada por dividir essa história conosco.”
“Essa imagem é tão calorosa.”
“Estou emocionada!”
“Tenho saudade dos meus avós, agora que eles se foram.”

Arthur e Allan deixaram o Brasil e foram para a Coreia do Sul sem ser fluentes em coreano nem em hangul, mas gostaram da vida escolar lá. Foi uma enorme surpresa para mim, e fiquei muito contente. Eles adoravam almoçar na cantina, iam andando juntos para o colégio e experimentavam esportes diferentes no parque com seus novos amigos. Mas viviam nos perguntando: “Vovó! Vovô! Quando vocês vêm ficar com a gente?

E foi assim que retornamos à Coreia no final de outubro de 2017, depois de 36 anos. Enquanto estávamos longe, a Coreia se tornou um país desenvolvido. Um país maravilhoso, mas desconcertante, onde os jovens são todos muito mais altos e nossos celulares apitam com avisos para tomar cuidado com o ar poluído e com notificações para conferir se nosso estoque de remédio para pressão está em dia.

Em agosto de 2019, quando finalmente estávamos adaptados à vida na Coreia, demos pulos de alegria ao recebermos uma notícia maravilhosa vinda de nosso filho, em Nova York.

Hoje demos as boas-vindas a Lua! Mãe e filha passam bem.

Ficamos eufóricos ao ver as fotografias que nosso filho mandou. Assim como seu nome, Lua era brilhante e linda. Víamos em seu rosto a semelhança com a bisavó, a mãe de Chan. E também víamos traços de nosso filho, Ji Byol, e de nossa filha, Miru. Herança genética é uma magia fantástica!

No final de janeiro de 2020, quando viajamos para Nova York e finalmente pegamos a bebê Lua no colo, não conseguimos parar de sorrir, porque Lua nos olhava com um sorriso enorme. Que poder maravilhoso ela tem de deixar feliz qualquer pessoa para quem sorri!

No começo, todos os desenhos levavam a assinatura “For AAA” (“Para AAA”), usando as três iniciais dos nomes de nossos netos: Arthur, Allan e Astro. Agora que Lua chegou, seu avô muito orgulhoso adicionou um “L” às assinaturas e disse a ela:

“Espero que você também leia o meu coração, pequena.”

Mais uma vez de volta à Coreia, retomamos a rotina. Hoje, assim como ontem e como amanhã também, continuamos desenhando e escrevendo para e sobre nossos netos, daqui e dos Estados Unidos, desse mesmo jeito.

 

 

— Vovó Marina com vovô Chan

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Kyong Ja An e Chan Jae Lee

Sobre o autor

Kyong Ja An e Chan Jae Lee

CHAN nasceu em Seul, na Coreia, em 1942. Formou-se em ciências pela Faculdade de Educação da Universidade Nacional de Seul e trabalhou como professor dessa disciplina. Depois de se mudar para o Brasil, administrou uma empresa de vestuário. Já expôs seus desenhos em San José, na Costa Rica, em São Paulo e em Seul, onde vive atualmente.   MARINA também nasceu em Seul, em 1942. Formou-se em ensino de língua coreana pela Faculdade de Educação da Universidade Nacional de Seul e trabalhou como professora de coreano. No Brasil, ajudou a administrar a empresa de vestuário da família, atuou como diretora de uma escola de língua coreana em São Paulo e deu aulas de literatura coreana em uma escola internacional. Vive em Seul com Chan. Os dois estão casados há 55 anos.

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