ABERTURA
Atendendo a pedidos, especialmente da minha mãe, dona Antonia Olivetto, e dos meus editores da Estação Brasil/Sextante, aqui está Direto de Washington: Edição extraordinária, uma continuação de minha autobiografia publicada em 2018.
A verdade é que o livro de 2018 tinha uma qualidade que era também um defeito: a ausência de cronologia.
Isso gerou uma autobiografia em que o autobiografado não conta quando, como nem onde nasceu. Também revela pouco de sua infância e adolescência, e quase não fala dos familiares próximos ou distantes. Quase nada comenta sobre o seu início como redator de publicidade e a sua decisão de, depois de 14 anos como o mais bem-sucedido diretor de criação do mercado, virar dono de uma agência.
Essas omissões, por si sós, já justificam a reinvindicação de dona Antonia por mais um livro.
Para escrever esta continuação, pedi a amigos como Lauro Jardim, Pedro Bial, Guime Davidson, Rynaldo Gondin, Marcelo Conde e Eiji Kosaka que me escrevessem sobre coisas de que sentiram falta no primeiro livro e relembrassem histórias que viveram comigo ou souberam a meu respeito que mereciam ser contadas neste segundo.
A colaboração desses amigos foi extremamente útil para o início do trabalho. Além de prestar atenção nas sugestões deles, acrescentei ao meu cotidiano um método de seleção e registro de memória que recomendo a todo e qualquer contador de histórias.
Toda vez que me lembrava de alguma coisa que pudesse ser contada, comentada ou relembrada, estivesse onde estivesse, eu passava imediatamente um e-mail para mim mesmo documentando a lembrança. Boa parte desses e-mails gerou as páginas deste novo livro.
Ao contrário do Direto de Washington, que foi escrito entre São Paulo, Rio e Londres, este livro foi escrito inteirinho na capital inglesa, onde minha família está morando adoravelmente adaptada, enquanto eu me divirto como consultor criativo da McCann Europa sediado na McCann London – até porque sou um consultor mais paparicado do que consultado.
O trabalho de escrita deste Direto de Washington: Edição extraordinária foi feito um pouco em casa e um pouco na agência. Em casa fui muitas vezes interrompido pela minha filha Antônia, que está obcecada com os preparativos da sua festa de 15 anos. Acompanhei os preparativos e os orçamentos dessa festa; e, pelo preço que vai custar, seria interessante se Antônia aproveitasse a oportunidade para também se casar.
Theo foi outro que me interrompeu várias vezes para falar de rock and roll e, em especial, de cinema, assunto que, por vocação e por admiração pelo trabalho do irmão Homero, ele acompanha avidamente desde os 5 anos. Assiste a vários filmes por semana, faz cursos aos sábados, lê tudo sobre atores, roteiristas e diretores. Enfim, Theo sabe, com menos de 15 anos, coisas que eu não sei com mais de 60 – e olha que eu me julgo muito bem informado. Além de rock e cinema, ele fala muito de outros dois assuntos: política, que, ao contrário do pai, ele aprecia e acompanha, e Corinthians, que, assim como o pai, ele ama e pelo qual torce.
Ao contrário de casa, onde minha escrita foi interrompida várias vezes pela família e até mesmo pelos latidos da nossa cadela Rosinha, na agência escrevi sempre em pleno sossego. Como tenho uma carga de trabalho muito leve, se comparada à que eu estava habituado nesses anos todos de estrada, sobrou tempo para escrever à vontade. Curiosamente, meus colegas ingleses, que ficaram maravilhados com a repercussão e o número de exemplares vendidos do Direto de Washington no Brasil, mas não puderam ler o livro porque não sabem português, também não imaginavam que eu estava escrevendo um segundo volume. Só souberam quando ficou pronto. Como me viam concentrado escrevendo durante horas, achavam que eu estava preparando algum plano mirabolante e essencial para um cliente ou prospect europeu. Assim, não me interrompiam jamais. (English people.)
Mantive, neste segundo livro, algumas coisas de que gosto e que deram certo no primeiro. A escrita fácil, o senso de humor, a não cronologia e o último capítulo com coisas que eu esqueci ou preferi não contar na abertura e nos demais capítulos.
Procurei eliminar assuntos que foram exaustivamente abordados no primeiro, como os prêmios e as palestras, que aqui são citados em raríssimos momentos, só nos casos em que fazem parte do eixo da história.
E mantive o lado mais forte e sagrado da minha ideologia profissional, contando algumas histórias em que a criatividade e a intuição foram fundamentais para gerar publicidade bem-sucedida. Acho isso importantíssimo, sobretudo neste momento em que muitos, burramente, tentam transformar a publicidade, que é fundamentalmente uma ciência humana, numa ciência exata. Neste momento em que tentam reinventar a roda, criando uma roda quadrada.
Estou feliz com o resultado final e espero que os leitores gostem deste segundo livro ainda mais do que gostaram do primeiro. Assim como espero que, por coerência, quem não gostou do primeiro também não goste deste.
Só posso garantir que esta é a minha segunda e última autobiografia. Pretendo continuar escrevendo muito, e até já tenho uma ideia para um próximo livro, mas ainda estou em dúvida se ela vai funcionar. Juro que será algo do presente ou do futuro, jamais do passado. O passado já era, e não quero ser considerado nem me sentir como um daqueles chatos que têm saudades de si próprios.