PREFÁCIO
Todo o meu trabalho tem cunho prático. Considero o empreendedorismo um instrumento de desenvolvimento social (não só de crescimento econômico) e o dissemino por meio da educação para que possa produzir mudança cultural. Este e outros nove livros foram escritos para servir de suporte às minhas propostas educacionais.
Em 1992, na UFMG, criei o curso de empreendedorismo. Testada lá, a metodologia Oficina do Empreendedor bateu asas, estando já em cerca de 400 instituições de ensino superior do Brasil e da América do Sul. Para disseminá-la, ofereci pessoalmente seminários para mais de 4 mil professores universitários.
Em 2000, com a ajuda de um grupo de professores e o apoio da organização não-governamental Visão Mundial, finquei uma modesta cunha no que considero o ponto central de um país que deseja buscar o desenvolvimento: o ensino básico e, dentro dele, a educação empreendedora para crianças a partir de quatro anos e para adolescentes. Mas é importante advertir que não desejo transformar cada criança em um agente de criação de empresas. A atividade empresarial é apenas uma das infindáveis formas de empreender. A minha visão de empreendedorismo é abrangente, contempla toda e qualquer atividade humana e, portanto, inclui empreendedores na pesquisa, no governo, no terceiro setor, nas artes, em qualquer lugar. O empreendedor é definido pela forma de ser, e não pela maneira de fazer. A meta é que todos se preparem para empreender na vida.
Em 2003, depois de testes extensos e cuidadosos e sempre com a ajuda de uma equipe de educadores, comecei a implementar a Pedagogia Empreendedora (este é o nome da metodologia e do livro que tratam de empreendedorismo para crianças) em escolas que oferecem ensino fundamental, médio e educação infantil. Em menos de dois anos, o alcance desse trabalho superava as previsões mais otimistas: redes públicas municipais de 126 cidades, totalizando cerca de 10 mil professores, 300 mil alunos e centenas de escolas já haviam levado a metodologia para a sala de aula.
Uma palavra ao novo empreendedor
Em minha vivência no ensino de empreendedorismo, uma coisa chama a atenção: o fascínio despertado nos alunos (e em mim também) pelos empreendedores que convido à sala de aula para narrar suas experiências. É sempre sobre sua vida que falam, tendo a empresa apenas como pano de fundo. Contam sobre família, infância, juventude, estudos e casamento. Como desenvolveram uma idéia, como foram afetados pela empresa, as novas amizades, a nova maneira de ver o mundo, as emoções que acompanham cada ato, cada decisão. Falam com entusiasmo e paixão sobre a aventura de sua vida.
Por intermédio deles, consegui entender algo que sempre li nos livros: a empresa é um sonho que se fez realidade. Já tive oportunidade de ouvir empreendedores narrando alguns dos seus fracassos. É como se estivessem falando de um ser amado e perdido. Nessas ocasiões, a emoção domina a sala de aula, e alguns de nós acompanhamos o narrador em suas lágrimas.
A história de Luísa é um pouco de tudo o que tenho vivenciado. A maneira simples de contá-la foi inspirada nos relatos ouvidos em anos de trabalho. É uma pequena novela sobre a criação de uma empresa, baseada na crença de que prazer e emoção constituem temperos imprescindíveis ao ato de aprender. Sempre com a emoção em primeiro lugar, tentei construir uma nova forma de apresentar às pessoas o que há de mais avançado no mundo na área de empreendedorismo.
Uma nota sobre a metodologia
Este livro destina-se ao leitor de qualquer formação ou idade, que pode não ter nenhum conhecimento sobre empresas, mas que tem uma idéia na cabeça e deseja transformá-la num negócio. O único pré-requisito para a leitura é, portanto, o desejo de abrir uma empresa.
Por trazer inúmeras novidades, este texto interessa também a quem já tem experiência, mas quer conhecer a última palavra nas pesquisas de empreendedorismo. Com certeza, ele é também uma ferramenta útil para professores e alunos dos cursos de criação de empresas.
De forma simples, clara e minuciosa, procuro explicar ao leitor os dois processos básicos para a criação de uma empresa: a formação de uma idéia e o caminho para sua validação por meio do Plano de Negócios.
É verdade que muitos empreendedores de sucesso abriram suas empresas sem conhecer exatamente o que é um Plano de Negócios. Mas também é certo que milhares de outros colheram insucessos fatais por causa de erros elementares que poderiam ter sido evitados. Sem dúvida, grande número de negócios de alto potencial torna-se inviável em virtude do despreparo dos empreendedores. Contudo, milhares de pessoas abrem e continuarão a abrir empresas, estando ou não preparadas. Meu objetivo é tentar diminuir a alta taxa de mortalidade infantil dessas iniciativas.
As estatísticas do Sebrae indicam que 60% das 500 mil pequenas e microempresas que são abertas todos os anos no Brasil fecham as portas antes de completar cinco anos.
A literatura especializada raramente contempla o empreendedor emergente. Também é muito comum um aluno de administração de empresas obter o diploma sem ter nenhuma noção do processo de criação desses empreendimentos. Num país como o Brasil, isso é lastimável, uma vez que a mentalidade empreendedora ainda esbarra em tabus, e as pequenas e médias empresas estão longe do mercado global e fora da era da tecnologia da informação.
Ora, se considerarmos que as empresas, quase sempre, começam pequenas, isso chega a ser um paradoxo. Principalmente porque, no mundo de hoje, as pequenas empresas constituem a principal fonte de empregos e são responsáveis, em muitos países, por mais de 50% do produto interno bruto (PIB) e pelo maior volume de exportações, além de serem as maiores geradoras de inovações tecnológicas desde a Segunda Guerra Mundial.
Este texto tenta dramatizar o processo de criação de uma empresa. Nele, o assunto é abordado contextualmente; ou seja, é o problema que constitui a motivação para o aprendizado, porque é assim que o empreendedor realmente aprende: primeiro, estabelecendo onde quer chegar; depois, buscando os conhecimentos e os meios necessários para alcançar os objetivos traçados.
A metodologia também é diferente do tradicional “estudo de casos”, largamente utilizado no ensino de administração de empresas. Aqui, o assunto é tratado por meio de uma história narrada em tom coloquial, muito perto da realidade vivenciada por centenas de alunos dos cursos de empreendedorismo que criamos. O centro das preocupações é a pessoa, e não a técnica, a ferramenta. Na atividade empreendedora, o conhecimento é volátil, mutante, nervoso, emocional. O ser é mais importante do que o saber, razão pela qual o empreendedor precisa ser alguém preparado para aprender a aprender.
Para alguns, a primazia do ser sobre o saber pode soar óbvia, principalmente neste início de século. Mas em muitas áreas ainda não o é. Na administração, por exemplo, ainda é uma idéia nova, que supõe rebeldia para lutar contra as correntes que ainda buscam a verdade numa única maneira de fazer as coisas, em um método ou modelo ideal de gerenciamento. É por termos essa cultura que, ao atuar no campo da administração, aceitamos as panacéias que nos chegam de tempos em tempos e que geralmente não passam de um novo nome para conceitos antigos. Procuramos um instrumento que resolva todos os problemas, esquecendo de investir na formação do ser criativo, capaz de definir a partir do indefinido, de conceber e gerar sistemas, e não somente de operá-los.
A aventura de Luísa na Goiabadas Maria Amália Ltda. é típica do empreendedor emergente: sem recursos para contratar pesquisa de mercado, sem condições de buscar financiamentos nem o apoio de um capitalista de risco — figura ainda rara no Brasil — e tendo ainda que prover o seu próprio sustento, Luísa conta somente com o love money, isto é, o dinheiro dos pais, da família. Ela mesma faz sua pesquisa, apesar de ter poucas horas livres no dia. Teimosa e persistente, vai atrás, briga. E vence.
Sua história é algo muito real, que vejo acontecer com meus alunos a cada ano. Mesmo assim, fica a advertência para os leitores: não há como garantir o sucesso de um empreendimento. O que se busca são elementos que permitam a diminuição do risco, e não a sua eliminação.
A idéia deste livro nasceu da minha vivência no ensino de criação de empresas, no início dos anos 1990. A maravilhosa experiência de criar e lecionar a disciplina “O empreendedor em informática”, no Departamento de Ciência da Computação da UFMG, permitiu-me partir em busca de projetos mais ambiciosos. O principal era ver o ensino de empreendedorismo ser disseminado em universidades pelo país afora. Esse objetivo está sendo alcançado, principalmente em função do CNPq, cujos projetos são um divisor de águas na educação empreendedora do país. Assim, por meio de programas promovidos por organismos como CNI-IEL, Sebrae, Softex e centenas de instituições de ensino superior de todo o Brasil, minha metodologia Oficina do Empreendedor, como já foi dito, começa a romper as fronteiras do país depois de espalhar-se pelas escolas superiores brasileiras.
Isso representa uma importante alternativa à tendência centenária das nossas universidades de formar empregados.
Essa prática, aliada a ensinamentos obtidos por meio da leitura, do convívio com pesquisadores de todo o mundo e da constante participação em congressos internacionais, mostrou-me que faltava uma metodologia para o ensino de criação de empresas. Os candidatos a empreendedor, de qualquer área, idade ou formação, têm algo em comum: a falta de uma linguagem que lhes permita conhecer e selecionar as ferramentas necessárias à criação e à gerência de um negócio. Essa carência muitas vezes os deixa amedrontados ou desmotivados.
A proposta deste livro é mostrar ao leitor — de forma inovadora — como usar seus próprios recursos para adquirir esse instrumental.
A primeira grande inovação diz respeito à metodologia utilizada, que associa o prazer e a emoção ao ato de aprender. Com uma narrativa próxima à de um romance, este livro conta a história de Luísa, o caminho que percorreu desde a concepção da idéia até a elaboração do seu Plano de Negócios. Ao longo da história, o leitor vai conhecendo o perfil do empreendedor e as condições necessárias para o sucesso.
O livro aborda uma técnica pouco difundida no Brasil: o Plano de Negócios. O empreendedor — suas emoções, comportamentos, atitudes e reações — é flagrado durante o processo de elaboração do seu Plano de Negócios, e isso constitui um exemplo completo à disposição do leitor.
Conteúdos de marketing, finanças, organização e gerenciamento são apresentados de forma simples e clara, de modo a fazer compreender que, na concepção e no lançamento da empresa, as análises mercadológica e financeira são indelegáveis. O empreendedor iniciante terá que assumi-las.
Com a preocupação de servir às condições brasileiras e tornar as coisas mais fáceis para o usuário leigo em Plano de Negócios e informática, foi construído o software MakeMoney,* que poderá ser adquirido pelo leitor. Desde seu lançamento, ele já teve 15 mil cópias vendidas e foi usado por cerca de 40 mil pessoas.
A metodologia adotada também inova ao utilizar a pergunta como forma de indução ao conhecimento. No ensino do empreendedorismo, os papéis se invertem, uma vez que quem busca as respostas — assim como faz o empreendedor na vida real — é o aluno. Cabe a nós, que lidamos com o ensino, fazer as perguntas pertinentes.
Mas a maior novidade é a estrutura flexível do livro, que permite diferentes leituras. Ao tomar contato com a história de Luísa, o leitor testemunhará todo o processo que leva à criação de uma empresa. Quando mergulhar nos links ou “boxes”, no papel, ele terá acesso a conhecimentos técnicos sobre empreendedorismo, Plano de Negócios, marketing, finanças, organização e demais ferramentas gerenciais. Mais do que isso, o texto faz a ligação entre as ações de Luísa e os conteúdos instrumentais, como se, ao lado do leitor, estivesse um mestre a interpretar as ações do empreendedor e a vincular prática e teoria.
Para ler este livro
Em seus capítulos, o texto faz a caracterização de Luísa como empreendedora; trata do estudo de mercado que ela faz; mostra o projeto de organização da empresa; apresenta a análise financeira da futura empresa; e leva ao coroamento do trabalho: o Plano de Negócios da GMA. Depois, vêm o pôr em marcha da empresa e sua consolidação.
A linguagem é dinâmica, e o leitor é chamado a interpretar detalhes do comportamento e da personalidade de Luísa. A teoria e as informações relativas à criação de empresas vão surgindo à medida que a história evolui, na mesma velocidade e no ritmo em que Luísa aprende. Na verdade, aprendemos junto com ela. O fato, o problema, a emoção antecedem sempre a necessidade do conhecimento. Este chega ao leitor, portanto, dentro de um contexto.
Vinculadas às diferentes passagens da história, aparecem caixas que comentam, interpretam e informam, ampliando o alcance do texto. A leitura do conteúdo das caixas pode ser dosada pelo leitor, que decidirá que volume de informações deseja absorver. Desse modo, várias leituras podem ser feitas. Um romance que trata do empreendedor, se o leitor assim o quiser. Um estudo detalhado de mercado ou uma análise financeira, se forem esses os seus interesses. Ou a montagem do Plano de Negócios para aqueles que desejam projetar sua empresa.
Neste livro, é dada grande importância às características do empreendedor, às atitudes e aos comportamentos que conduzem ao sucesso. O que se pretende é indicar ao leitor que qualidades deve desenvolver para se tornar um empreendedor bem-sucedido. Sabemos que nessa área não lidamos somente com conhecimentos, como finanças, marketing, gerenciamento. Portanto, ainda que uma pessoa domine muito bem todas as técnicas e ferramentas para administrar uma empresa, isso não quer dizer que, necessariamente, será um empreendedor de sucesso. É preciso algo mais. É preciso sonhar e buscar a realização do sonho. Ao agir em busca de concretizar o sonho, o indivíduo é dominado por forte emoção e liberta o empreendedor que existe dentro dele, tornando dinâmicas algumas características presentes em todos nós: protagonismo, perseverança, criatividade, liderança etc. O que faz um empreendedor é um conjunto de atitudes e comportamentos que o predispõem a ser criativo, a identificar a oportunidade, a saber agarrá-la. E a encontrar e gerenciar os recursos necessários para transformar a oportunidade em um negócio lucrativo.
O conhecimento que interessa ao empreendedor é aquele que possa ser aplicado na sua empresa. E o principal conhecimento do empreendedor não está nos livros, mas à sua volta, nas pessoas, no mercado, no mundo. A leitura e a interpretação que o empreendedor faz do ambiente é que irão conduzi-lo ou não ao sucesso. Assim, estar preparado para adquirir conhecimentos significa: saber identificar aquilo de que se precisa no momento próprio e na intensidade adequada; saber assimilá-lo e, o mais importante, saber aplicá-lo. Desse modo, preocupamo-nos em preparar pessoas que aprendam a aprender, para que saibam buscar sozinhas o conhecimento necessário ao sucesso de sua empresa.
Convidamos o leitor a analisar constantemente o comportamento de Luísa. A ficar atento a todas as atitudes e características pessoais da protagonista desta história. A tentar interpretar suas ações, seu modo de ser, seu comportamento como filha, aluna, noiva, estudante, cidadã. Propomos que discuta com amigos e empresários, pois, ao entender o comportamento de Luísa, saberá identificar as atitudes que poderão levá-lo ao sucesso como empreendedor.
Bom trabalho!