Prefácio
A idade decisiva
Num raro estudo sobre o aumento da expectativa de vida, pesquisadores das Universidades de Boston e de Michigan examinaram dezenas de histórias de vida escritas por pessoas proeminentes e bem-sucedidas com idade bastante avançada.1 Eles estavam interessados em identificar as experiências que mais afetaram a trajetória dos indivíduos. Embora muitos eventos importantes tenham ocorrido do nascimento à morte, aqueles que foram mais determinantes para o futuro estavam concentrados no período dos 20 aos 30 anos.
Ao sairmos de casa, concluirmos a faculdade e nos tornarmos mais independentes, seria de esperar que ocorresse um surto de “autocriação”, um período em que o que fazemos determina quem nos tornaremos. E pode até parecer que a vida adulta é uma longa sequência de experiências edificantes. Mas isso não é verdade.
A partir dos 30 anos, começa a haver menos experiências significativas. Provavelmente já teremos terminado a faculdade. Teremos investido tempo em nossa carreira ou optado por não fazê-lo. Pode ser que já estejamos com parceiros estáveis e tenhamos formado uma família. Talvez tenhamos uma casa própria ou outras responsabilidades que dificultem uma mudança de direção. Como cerca de 80% dos fatos mais importantes da vida ocorrem até os 35 anos, depois disso geralmente damos prosseguimento – ou corrigimos – as ações que iniciamos na década anterior.
A triste ironia é que os 20 anos podem não ser tão significativos. Podemos imaginar que as experiências mais importantes da vida são aprendidas nos grandes momentos e nos encontros empolgantes, mas não é assim que as coisas acontecem.
Os pesquisadores nesse mesmo estudo descobriram que a maioria dos fatos substanciais e com consequências duradouras – aqueles que levaram ao sucesso na carreira, a uma boa situação financeira, à felicidade pessoal ou à falta dela – se desenvolveu ao longo de dias, semanas ou meses, tendo pouco efeito imediato. A importância dessas experiências não ficou clara na época em que aconteceram, mas, retrospectivamente, haviam definido nosso futuro. Isso significa que, na maioria das vezes, nossa vida é decidida por momentos cuja ocorrência podemos nem perceber.
Este livro ensina a reconhecer esses momentos. Ele explica por que a fase dos 20 anos importa e como tirar o máximo proveito dela.
Introdução
Tempo real
“Cansado de deitar-se sob o sol, de ficar
em casa observando a chuva
Você é jovem e a vida é longa, e há
tempo para matar hoje
E então um dia você descobre que
10 anos ficaram para trás
Ninguém lhe disse quando correr, você
perdeu o tiro de largada.”
Pink Floyd, trecho da música “Time”
Quase invariavelmente, o crescimento e o desenvolvimento possuem o que se denomina “período crítico”. Existe um período específico de maturação no qual, com o tipo certo de estimulação externa, a capacidade subitamente se desenvolve e amadurece. Antes e depois disso, é mais difícil ou impossível.
– Noam Chomsky, linguista
Quando começou sua terapia, Kate trabalhava como garçonete e morava – e brigava – com os pais havia mais de um ano. Seu pai ligou para marcar a primeira consulta dela, e ambos presumiam que os problemas de pai e filha logo viriam à tona. Mas o que mais me impressionou em Kate foi ver que seus 20 anos estavam sendo desperdiçados. Ela havia crescido em Nova York e agora morava na Virgínia, mas, aos 26 anos, ainda não tirara sua carteira de motorista, embora isso limitasse suas oportunidades de emprego e fizesse com que se sentisse uma passageira em sua própria vida. O que também explicava os constantes atrasos para as nossas consultas.
Depois que ela se formou na faculdade, esperava aproveitar a liberdade da juventude, algo que seus pais a encorajaram fortemente a fazer. A mãe e o pai se casaram logo após saírem da universidade porque queriam viajar juntos para a Europa e, no início da década de 1970, isso não seria tolerado pela família de nenhum dos dois, a menos que se tornassem marido e mulher. Passaram a lua de mel na Itália, e ela retornou grávida. O pai de Kate foi seguir carreira, enquanto a mãe se ocupava criando quatro filhos, dos quais a minha paciente era a mais nova. Até então, ela despendera a própria liberdade recém-conquistada tentando compensar o que os pais perderam. Achava que deveria estar vivendo a melhor época da vida, mas se sentia tensa e ansiosa na maior parte do tempo. “Minha juventude está paralisante”, ela disse. “Ninguém me contou que essa fase seria tão difícil.”
Kate preenchia a mente com seus conflitos emocionais para esquecer como a vida estava de fato, e parecia fazer o mesmo nas horas de terapia. Quando vinha às sessões, chutava para longe os sapatos, arregaçava as pernas da calça jeans e contava as novidades do fim de semana. Nossa conversa com frequência se tornava multimídia, pois ela me mostrava e-mails e fotos; além disso, ela recebia mensagens de texto com as últimas notícias no meio das nossas sessões. Em algum ponto entre as novidades contadas, descobri o seguinte: ela achava que talvez fosse gostar de trabalhar com angariação de fundos e esperava descobrir o que queria fazer quando chegasse aos 30 anos. “Os 30 são os novos 20”, ela disse. Esta foi a minha deixa.
Sou muito entusiasta dessa fase para deixar que Kate, ou qualquer outra pessoa com a mesma idade, desperdice o próprio tempo. Como psicóloga clínica especializada em desenvolvimento adulto, vi inúmeros jovens desperdiçarem muitos anos vivendo sem perspectiva. O pior são as lágrimas vertidas na casa dos 30 e dos 40 por pagarem um preço alto – no lado profissional, afetivo, financeiro e reprodutivo – pela falta de visão na juventude. Eu gostei de Kate e queria ajudá-la, por isso insisti que chegasse na hora às sessões. Interrompia relatos sobre sua última transa para perguntar se ela já tinha providenciado a carteira de motorista e como andava a busca de um emprego. Talvez mais importante: Kate e eu debatíamos como deveria ser a terapia – e de que maneira estava vivendo seus 20 anos.
Ela se perguntava se deveria ficar alguns anos na terapia analisando seu relacionamento com o pai ou se deveria utilizar aquele dinheiro e aquele tempo para viajar pela Europa em busca de autoconhecimento. Não recomendei nenhuma das duas alternativas. Expliquei a Kate que, embora a maioria dos terapeutas concorde com Sócrates, que disse que “a vida não analisada não vale a pena ser vivida”, uma frase menos conhecida do psicólogo americano Sheldon Kopp poderia ser mais relevante aqui: “A vida não vivida não vale a pena ser analisada.”
Falei que seria irresponsável da minha parte ficar quieta assistindo aos anos mais fundamentais da vida de Kate se esvaírem. Seria insensato focarmos o passado dela quando eu sabia que o futuro é que corria risco. Não parecia razoável conversar sobre os fins de semana quando eram seus dias úteis que a deixavam tão infeliz. Eu também sentia genuinamente que o relacionamento de Kate com o pai continuaria o mesmo enquanto ela não trouxesse algo de novo que contribuísse para uma melhoria.
Pouco tempo após essas conversas, Kate desabou no divã do meu consultório. Lacrimejante e agitada como nunca, olhava pela janela e balançava as pernas, nervosa, enquanto me contava sobre um brunch no domingo com quatro amigos da faculdade. Dois estavam na cidade para uma conferência, outro havia retornado da Grécia, pois tinha ido a uma gravação de canções de ninar para sua pesquisa de doutorado, e o último levou consigo a noiva. Em meio a todos eles, Kate olhou em volta e sentiu que ficava para trás. Ela queria o que os amigos tinham – um trabalho, um objetivo ou um namorado – e passou o resto do dia na internet procurando empregos (e homens). A maioria não lhe pareceu interessante, e os poucos que lhe chamaram a atenção ela achou inacessíveis. Kate foi dormir sentindo-se vagamente desnorteada.
No meu consultório, ela disse: “Já passei dos 25. Sentada naquele restaurante, percebi que eu não tinha nada para mostrar. Nada no currículo. Nenhum relacionamento. Não sei nem o que estou fazendo nesta cidade.” Pegou um lenço e irrompeu em lágrimas. “Eu era dominada pela ideia de que definir claramente o próprio caminho era algo careta. Gostaria de ter sido mais, sei lá… objetiva.”
Não era tarde demais para Kate, mas ela precisava começar a agir. Quando recebeu alta da terapia, minha paciente já tinha seu próprio apartamento, carteira de motorista, um namorado legal, e também estava angariando fundos para uma organização sem fins lucrativos. Até o relacionamento com o pai vinha melhorando. Em nossas últimas sessões, Kate me agradeceu por ajudá-la a recuperar o tempo perdido. Disse que enfim sentia estar vivendo sua vida “em tempo real”.
O período que vai dos 20 aos 30 anos é real e deve ser vivido como tal. Uma cultura que considera os 30 como os novos 20 nos faz achar que estes últimos não importam. Freud certa vez disse: “Amor e trabalho, trabalho e amor… é tudo que existe”, e esses dois fatores têm tomado forma mais tarde do que costumavam tomar antigamente.
Quando os pais de Kate estavam na casa dos 20 anos, em geral uma pessoa de 21 anos estava casada e cuidando de um bebê recém-nascido.1 Apenas se estudava até a conclusão do ensino médio ou, quando muito, da faculdade, e os pais, jovens, se concentravam em ganhar dinheiro e cuidar da casa. Como apenas uma fonte de renda costumava ser suficiente para sustentar uma família, os homens trabalhavam, mas dois terços das mulheres não. A expectativa de quem tinha uma profissão era permanecer no mesmo ramo a vida toda.
No decorrer de uma geração, houve uma enorme mudança cultural.2 Os métodos anticoncepcionais se popularizaram, e as mulheres invadiram o mercado de trabalho. Com o novo milênio, apenas cerca de metade dos jovens estava casada aos 30 anos, e menos ainda tinha filhos, transformando os 20 numa época de liberdade. Começamos a ouvir que talvez a faculdade fosse cara demais e menos necessária, enquanto a pós-graduação deveria ser priorizada; e que em ambos os casos haveria tempo de “folga”.
Durante centenas de anos, os jovens passaram diretamente de filhos e filhas para maridos e esposas. Há poucas décadas, porém, um novo período de desenvolvimento surgiu. Acordando diariamente em algum ponto entre o lar da família e sua casa própria, jovens como Kate não sabiam direito como empregar o próprio tempo.
Quase por definição, os 20 anos tornaram-se um período intermediário. Um artigo de 2001 na Economist apresentou a “Economia Bridget Jones”3 e uma capa de 2005 da Time saiu com a
manchete “Conheça os Twixters”, 4 ambos nos informando que a juventude era agora formada por anos a serem usufruídos de acordo com a renda disponível. Em 2007, essa fase foi apelidada de “anos da odisseia”, um tempo para perambular pela vida.5 E jornalistas e pesquisadores de toda parte passaram a se referir a pessoas nessa faixa etária com apelidos idiotas como kidults (contração de kids e adults, crianças e adultos), pré-adultos ou adultescentes.
Há quem diga que os 20 anos são uma extensão da adolescência, enquanto outros os chamam de uma vida adulta emergente.6 Essa mudança da passagem para a vida adulta rebaixou aqueles jovens a “não totalmente adultos” justo quando precisam se esforçar mais.7 Jovens como Kate foram envolvidos por um turbilhão de campanhas publicitárias e mal-entendidos que, em grande parte, trivializou o que é na verdade a década definidora da vida adulta.
No entanto, mesmo quando desprezamos essa fase, fazemos dela um fetiche. Ela nunca foi tão badalada. A cultura popular é quase obcecada pelos 20 anos, a ponto de esse período de liberdade parecer tudo que existe. Celebridades infantis e crianças comuns desperdiçam a infância imitando pessoas dessa faixa etária, enquanto adultos maduros e mulheres de mais idade se vestem, e se modelam, para parecer que têm 29 anos. Os jovens parecem mais velhos e os velhos parecem mais jovens, reduzindo o período de vida adulto a uma longa estada nos 20 anos. Até um termo novo – amortality (amortalidade) – foi cunhado para descrever a vida uniforme, no mesmo pique, de nossa adolescência até a morte.8
Mas isso é contraditório e perigoso. Somos levados a acreditar que os 20 anos ainda não importam. No entanto, com a glamourização dessa fase e a quase obsessão com ela, pouca coisa nos lembra que algo mais chegará a importar. Isso faz com que muitos homens e mulheres paguem um alto preço nas décadas subsequentes por terem desperdiçado os anos mais transformadores da vida adulta.
A nossa atitude cultural em relação aos jovens se assemelha à exuberância irracional americana. Os jovens do século XXI cresceram junto com o surto das empresas pontocom, as porções gigantes de fast-food, o estouro da bolha imobiliária e o boom de Wall Street. Startups imaginaram que sites descolados gerariam dinheiro e demanda; indivíduos ignoraram a gordura e as calorias que as porções gigantes de fast-food continham; mutuários confiaram na valorização constante das casas; investidores previram mercados em permanente alta. Adultos de todas as idades deixaram que o “otimismo irreal” – denominação dos psicólogos para a ideia de que jamais acontecerá algo de ruim com você – se apoderasse da lógica e da razão. Adultos de todas as origens deixaram de fazer contas. Agora os jovens na casa dos 20 estão fadados a ser outra bolha prestes a explodir.
No meu consultório, tenho percebido o estrago.
A Grande Recessão e suas consequências duradouras deixaram muitos jovens se sentindo ingênuos, até devastados. Eles estão mais instruídos do que em qualquer outra época, mas uma pequena porcentagem encontra trabalho assim que sai da faculdade. Muitos empregos básicos deixaram de existir, pois foram transferidos para o exterior, dificultando o início de sua vida profissional.9 Com uma economia em retração e uma população em crescimento, o desemprego atingiu o auge em décadas.10 Um estágio não remunerado é o novo primeiro emprego.11 Cerca de um quarto das pessoas em seus 20 anos não trabalha e outro quarto tem uma ocupação apenas em meio expediente.12 Aqueles que têm empregos remunerados ganham menos do que seus equivalentes na década de 1970, considerando-se os valores corrigidos pela inflação.13
Como o trabalho temporário substituiu as carreiras de longo prazo, os jovens não param quietos. A maioria deles terá experimentado uma série de ocupações ainda aos 20. Um terço se mudará a qualquer momento, deixando família, amigos, currículos e egos dispersos.14 Cerca de um em cada oito retorna para casa a fim de morar com os pais, em parte porque os salários estão baixos e a dívida do crédito universitário é alta.
Parece que todos querem ter 20 anos, exceto quem os tem. Por toda parte, a ideia de que os “30 são os novos 20” começa a despertar uma nova reação: “Meu Deus, espero que não.”
Lido diariamente com jovens que se sentem enganados pela ideia de que os 20 anos deveriam ser os melhores de suas vidas. Imagina-se que fazer terapia com eles é ouvir aventuras e desventuras de pessoas despreocupadas, e isso acontece um pouco. Mas, por trás das portas fechadas, meus clientes têm coisas perturbadoras para dizer:
• Sinto como se estivesse no meio do oceano. Como se pudesse nadar em qualquer direção, mas sem ver terra em lado algum, não sabendo portanto em que direção ir.
• Sinto que preciso ficar me envolvendo com qualquer um para ver no que vai dar.
• Eu não sabia que ficaria chorando no banheiro do trabalho todos os dias.
• Ter 20 anos proporciona uma forma totalmente nova de pensar no tempo. Existe esse período de tempo e uma série de coisas que precisa acontecer.
• Minha irmã tem 35 anos e está solteira. Morro de medo de que isso aconteça comigo.
• Não vejo a hora de ficar livre dos meus 20 anos.
• Tomara que eu não esteja mais fazendo isso aos 30.
• Na noite passada, rezei para que tivesse ao menos uma coisa segura na minha vida.
Existem 50 milhões de jovens na faixa dos 20 anos só nos Estados Unidos, a maioria vivendo com uma quantidade desconcertante, sem precedentes, de incerteza. Muitos não têm ideia do que estarão fazendo, onde estarão morando ou com quem estarão daqui a dois ou mesmo dez anos. Não sabem quando serão felizes nem quando conseguirão arcar com suas contas. Ficam em dúvida se devem ser fotógrafos, advogados, estilistas ou banqueiros. Não sabem se estão a poucos namoros ou a muitos anos de um relacionamento estável. Estão preocupados e se perguntam se terão famílias e se seus casamentos durarão. Em resumo, não sabem se suas vidas darão certo nem o que fazer.
A incerteza deixa as pessoas ansiosas, e as distrações são o ópio das massas do século XXI. Assim, jovens como Kate são tentados, e até encorajados, a não se preocuparem, a fecharem seus olhos e esperarem pelo melhor. Um artigo de 2011 da revista New York, argumentando que “os jovens na verdade estão bem”, explicou que, embora enfrentem uma das piores condições econômicas desde a Segunda Guerra Mundial, os jovens atuais estão otimistas.15 O artigo concluiu que, com música grátis on-line, “você não precisa de dinheiro para comprar uma enorme coleção de discos” e que Facebook, Twitter, Google e aplicativos grátis “tornaram a vida de quem tem o orçamento apertado bem mais divertida”.
Reza um ditado que “a esperança é um bom desjejum, mas um péssimo jantar”.16 Embora tê-la implique um estado mental útil que pode ajudar muitos jovens frustrados a saírem da cama de manhã, ao final do dia eles precisam de mais do que otimismo, porque, aos 30, muitos deles vão querer mais do que diversões e coleções de discos.
Sei disso porque ainda mais convincentes do que minhas sessões com jovens problemáticos são as com ex-twixters, pessoas agora com seus 30 e 40 anos que gostariam de ter feito algumas coisas de outra forma. Tenho testemunhado a verdadeira dor que acompanha a percepção de que a vida não será bem-sucedida. Podemos ouvir que os 30 são os novos 20, mas – com ou sem recessão –, quando se trata de trabalho, amor, cérebro e corpo, os 40 definitivamente não são os novos 30.
Muitos jovens na faixa dos 20 supõem que a vida começará a dar certo após os 30, e pode ser que dê. Mas ainda assim será uma vida diferente. Imaginamos que, se nada acontecer aos 20, tudo continuará sendo possível na década subsequente. Achamos que, evitando decisões agora, mantemos todas as nossas opções em aberto para depois – mas não fazer escolhas também é uma escolha.
Quando muita coisa foi deixada pendente, a pressão aos 30 é enorme para seguir adiante, casar-se, escolher uma nova cidade para morar, ganhar dinheiro, comprar uma casa, curtir a vida, fazer pós-graduação, abrir um negócio, obter uma promoção, poupar para a faculdade dos filhos e a aposentadoria, e ter dois ou três filhos dali a um período de tempo bem menor. Muitas dessas coisas são incompatíveis e, como as pesquisas estão começando a mostrar, simplesmente mais difíceis de se fazerem ao mesmo tempo após o período dos 20.17
Aos 30, a vida não termina, mas dá uma sensação categoricamente diferente. Um currículo razoável que costumava refletir a liberdade da juventude subitamente parece suspeito e vergonhoso. Um bom primeiro encontro não mais sucita fantasias românticas sobre a “alma gêmea”, mas nos leva a fazer cálculos sobre a época mais breve em que será possível nos casarmos e termos um bebê.
Claro que muitos conseguem isso e, após o nascimento do primeiro filho, casais nos seus 30 anos costumam falar de um novo propósito e um novo sentido. Também pode ocorrer uma sensação pungente de arrependimento ao saberem que será difícil dar ao filho tudo o que gostariam; ao descobrirem que problemas de fertilidade ou a simples exaustão impedem o aumento da família que agora desejam; ao perceberem que estarão com quase 60 anos quando os filhos forem para a faculdade e talvez 70 quando se casarem; ao reconhecerem que talvez jamais conheçam seus netos.
Pais como os de Kate estão tão empenhados em proteger os filhos do próprio tipo de crise de meia-idade – o arrependimento por terem se estabilizado tão cedo – que deixam de ver que uma crise de meia-idade totalmente nova, pós-virada do milênio, está se desenvolvendo. Esta vem ocorrendo porque, enquanto estávamos ocupados nos certificando de que não perdíamos nada, nos preparávamos para perder algumas das coisas mais importantes da vida. Porque fazer algo mais tarde não é o mesmo que fazê-lo melhor. Inúmeras pessoas inteligentes e bem-intencionadas em seus 30 e 40 sofrem um pouco ao se defrontarem com uma vida baseada em recuperar o tempo perdido. Olham para si mesmas – e para mim sentada diante delas no consultório – e dizem sobre seus 20 anos: “O que eu estava fazendo? Em que eu estava pensando?”
Insisto para que os jovens recuperem seus 20 anos, sua posição de adultos e seu futuro. Este livro mostrará por que devem fazê-lo e como conseguir.
Nas próximas páginas, quero convencê-lo de que os 30 não são os novos 20. Não porque os jovens na casa dos 20 não devam se estabilizar mais tarde do que seus pais. A maioria concorda que o trabalho e o amor estão ocorrendo mais tarde, não apenas por opção, mas também por motivos financeiros. Quero persuadi-lo de que os 30 não são os novos 20 exatamente porque nos estabilizamos mais tardiamente do que no passado. Isso não transformou os 20 anos num período morto e irrelevante, e sim em um período privilegiado de um desenvolvimento que só ocorre uma vez.
Em quase todas as áreas de desenvolvimento existe o chamado período crítico,18 uma época em que estamos preparados para o crescimento e a mudança, quando uma simples exposição pode levar a uma transformação radical. Crianças aprendem facilmente qualquer idioma que ouvem antes dos 5 anos. Desenvolvemos a visão binocular entre os 3 e 8 meses de idade. Esses períodos críticos são janelas de oportunidade durante os quais o aprendizado ocorre rapidamente. Depois, as coisas deixam de ser tão fáceis.
Os 20 anos constituem o período crítico da vida adulta, quando será mais fácil iniciar a vida que queremos. E não importa o que façamos, ele é um ponto de inflexão – a grande reorganização –, uma época em que nossas experiências têm uma influência desproporcional sobre a vida adulta que levaremos.
Nas seções intituladas “Trabalho”, “Amor” e “O cérebro e o corpo”, aprenderemos sobre quatro períodos críticos separados – mas interligados – que ocorrem nos 20 anos. Em “Trabalho”, descobriremos por que os empregos nessa idade provavelmente serão os mais consequentes que teremos, em termos profissionais e financeiros – embora possam não parecer tão bons. Em “Amor”, saberemos por que nossas opções de relacionamentos na juventude podem ser ainda mais importantes do que aquelas relativas a trabalho. E, em “O cérebro e o corpo”, aprenderemos por que nosso cérebro ainda em desenvolvimento na juventude está determinando os adultos que nos tornaremos da mesma forma que nosso corpo aos 20 está iniciando seu período mais fértil.
Os jornalistas podem criar alarde com manchetes que dizem “O que acontece com os jovens de 20 anos?”19 ou “Por que eles simplesmente não crescem?”,20 mas os 20 anos não são um mistério. Sabemos como essa fase funciona, e os jovens merecem saber também.
Nos capítulos a seguir, mesclo as pesquisas mais recentes sobre desenvolvimento de adultos com os relatos dos meus pacientes e alunos. Compartilho o que psicólogos, sociólogos, neurologistas, economistas, executivos de recursos humanos e especialistas em reprodução sabem sobre o poder singular dos 20 anos e como eles moldam nossa vida. Ao longo do livro, desafio algumas concepções equivocadas veiculadas pela mídia sobre esse período e mostro como o pensamento convencional sobre essa faixa etária costuma estar errado.
Descobriremos: por que as pessoas que mal conhecemos, e não nossos amigos mais próximos, é que melhorarão mais substancialmente a nossa vida; de que forma entrar para o mundo profissional faz com que nos sintamos melhor, não pior; por que morar junto pode não ser o melhor meio de testar um relacionamento; como nossa personalidade muda mais durante os 20 do que em qualquer outro período anterior ou posterior; como escolhemos nossas famílias, e não apenas nossos amigos; por que a autoconfiança surge não de dentro para fora, mas de fora para dentro; e o motivo de as histórias que contamos sobre nós mesmos afetarem quem namoramos e os empregos que obtemos. Começaremos com o porquê de a pergunta “Quem sou eu?” ser mais bem respondida não após uma crise de identidade prolongada, mas através de algo chamado “capital de identidade”.
Há pouco tempo, jovens de 20 anos como os pais de Kate já definiam seus rumos antes de refletirem sobre quem eles eram. Eles tomavam as decisões mais importantes da vida antes que seu cérebro soubesse como fazê-lo. Agora os jovens do século XXI têm a oportunidade de construir a vida que querem – em que trabalho, amor, cérebro e corpo podem estar interligados. Mas para isso não basta idade ou otimismo. É preciso, como disse Kate, objetividade e algumas boas informações, para não perdermos a chance. E por muito tempo boas informações foram difíceis de achar.
Aos 20, mesmo uma pequena mudança pode alterar radicalmente aonde iremos parar aos 30 e depois disso. Eles integram um período turbulento, mas, se conseguirmos descobrir como navegar, ainda que aos poucos, poderemos chegar mais longe, com mais rapidez, do que em qualquer outro estágio da vida. Trata-se de um período crucial em que as coisas que fazemos – e deixamos de fazer – terão um efeito significativo ao longo dos anos e até sobre gerações futuras.
Portanto, bola pra frente. O momento é agora.