Em novo livro, autora de “A morte é um dia que vale a pena viver” recorda as lições de pacientes que enfrentaram graves doenças: “A presença iminente da morte foi capaz de despertar o melhor de cada um”
O livro “A morte é um dia que vale a pena viver” ajudou a lançar um renovado facho de luz sobre a trajetória de Ana Claudia Quintana Arantes, médica especializada no cuidado de pessoas em processo de morrer. O olhar mais humanizado é a base dos chamados Cuidados Paliativos, endereçado tanto ao paciente quanto ao núcleo que o protege e acompanha (familiares e amigos). Se a finitude é irreversível, profissionais como Ana Claudia defendem que a despedida seja menos abrupta e corrosiva, desvinculada da dor e do sofrimento; que seja possível viver bem, com consciência da própria vida, até o inevitável fim. A obra foi uma das inspirações para “Bom Sucesso”, recente novela da TV Globo na qual Antonio Fagundes viveu um editor que descobre uma doença terminal. No último capítulo, o personagem morreu sorrindo, em paz, reconfortado pela medicina e pelos familiares.
Pois bem, “Histórias lindas de morrer” amplia a delicadeza que “A morte é um dia que vale a pena viver” apresentou. Dessa vez, Ana Claudia se concentra no processo vivido por homens e mulheres diante desse mistério que nos conduz ao fim da vida… ao menos da vida como a conhecemos. São mais de dez histórias destrinchadas pela médica. Como pode se supor, trata-se de uma leitura guiada pela emoção. Mas quem estiver embarcando pela primeira vez no mergulho que Ana Claudia propõe vai se surpreender ao constatar o quanto essa jornada também pode ser modelada pelo humor, pela alegria e pela felicidade.
A importância dos Cuidados Paliativos fica mais evidente quando a progressão da doença atinge níveis elevados, ressalta a médica, há mais de duas décadas envolvida nesse tipo de prática. Habilidades técnicas, como avaliar histórico clínico e escolher remédios, apenas compõem um processo muito mais abrangente. Aqui, a diferença se faz também na disposição e no interesse real na vida do outro.
À medida que costura as experiências de vida, Ana Claudia reflete sobre o exercício da medicina e encoraja profissionais a se aproximarem mais das histórias de seus pacientes. “Estudos mostram que os pacientes querem falar. Falar sobre a morte deles, sobre como vai ser. Querem que respeitem o que falam. Mas ninguém quer escutar. Os médicos deveriam conversar sobre vida com seus pacientes, não sobre cura. Para que você quer a cura? A resposta para isso envolve a vida. É justo esconder a morte?”, questiona-se. A leitura ratifica que “Histórias lindas de morrer” é resultado de um gesto contínuo de escuta, sem a qual a verdadeira empatia não se cumpre.
A morte mostra que viver é urgente
“Cada um dos personagens é um convidado de honra na minha existência como médica e como ser humano”, frisa ela, lembrando que as histórias reunidas no livro “contemplaram a diversidade de aprendizados que torna a vida tão bela e tão cheia de sentido exatamente porque termina”. Em seu novo livro, Ana Claudia partilha momentos em que “a presença iminente da morte foi capaz de despertar o melhor de cada um, transformando o final da existência em uma epifania, uma descoberta”. A despeito da fragilidade que os consome, esses personagens confirmam a certeza de que viver é urgente. Ao refletir sobre a experiência de relatar essas histórias, a médica conclui: “Cada uma delas me fez muito melhor. Mais do que a afeição que nos uniu, elas me habitam. Ocupam um espaço imenso no meu coração. Integram meus atos e pensamentos”.