Autor: Filipe Isensee
O que um monge pode ensinar a um executivo sobre liderança?
fira as lições de “O monge e o executivo” sobre a essência da liderança. O livro, que já vendeu mais de 3,5 milhões de exemplares no país, é uma das principais referências sobre o tema
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Confira as lições de “O monge e o executivo” sobre a essência da liderança. O livro, que já vendeu mais de 3,5 milhões de exemplares no país, é uma das principais referências sobre o tema
Segundo James C. Hunter, um líder eficiente é “aquele que desenvolve as habilidades e as qualidades morais que o capacitam a inspirar e influenciar um grupo de pessoas”. É justamente sobre a complexa formação dessa figura que “O monge e o executivo” se concentra. Num primeiro momento, o autor parece ostentar uma visão excessivamente romântica da função, especialmente ao dizer que a liderança tem a ver com “amar as pessoas de verdade, identificando e satisfazendo suas necessidades legítimas”. Mas a leitura logo suplanta a sensação: não há ingenuidade, mas, sim, uma proposição concreta sobre a eficiência e as relações dos chefes com sua equipe. “O teste definitivo da liderança é saber se, depois de algum tempo sob o comando de um líder, as pessoas saem da experiência melhores do que eram antes”, completa. Para muitos trabalhadores, a herança positiva de uma relação do tipo parece distante.
O que torna um livro campeão de vendas?
Desde o lançamento, em 2005, foram mais de 3,5 milhões de livros vendidos no Brasil, o que transformou “O monge e o executivo” num invejável campeão de vendas. Ao falar sobre o sucesso do título no país, Hunter arremata: para ele, isso “demonstra claramente que os brasileiros estão querendo mais de seus líderes”. O autor está certo, não está?
O título faz referência ao seu encontro com Leonard Hoffman, ex-executivo de uma das maiores empresas dos Estados Unidos, que trocou a carreira para se tornar frade num mosteiro. No processo, ele mudou de nome, passando a ser identificado como irmão Simeão. Vasculhando artigos em revistas, Hunter encontrou uma matéria, publicada no fim dos anos 1980, que narrava o sumiço do então empresário: aos 60 e poucos anos, ele se demitiu da empresa meses após a morte de sua esposa em consequência de um aneurisma cerebral.
A soma dos diferentes
Os dois se conhecem num momento delicado para Hunter, que, às voltas com problemas na vida profissional e familiar, busca ajuda num retiro. O encontro com irmão Simeão, dono “dos olhos mais acolhedores e cheios de compaixão que eu já vira”, o fez repensar inúmeros valores e decisões. A sensível troca entre eles, durante os setes dias em que compartilharam princípios de liderança, é a razão de ser do livro.
O tema é abordado numa linguagem simples, que realça a conversa e aproxima o mundo corporativo das relações humanas mais básicas. Não à toa, uma das primeiras lições de Simeão a Hunter tem a ver com a prática de uma escuta atenta: “Ouvir é uma das habilidades mais importantes que um líder pode escolher para desenvolver”.
Em outro momento, o monge afirma que sempre que duas ou mais pessoas se reúnem com um propósito há uma oportunidade de exercer a liderança. O que torna a tarefa tão complexa é que cada líder deve tomar decisões pessoais sobre a aplicação destes princípios a suas vidas, o que requer uma enorme doação pessoal.
O tempo todo, o monge sublinha o dever de conduzir um grupo de pessoas tão diferentes, num exercício de gestão que exige cuidado e sensibilidade, características escassas, segundo ele: “Eu me admirava, quando estava no mercado de trabalho, ao constatar a forma displicente e até petulante com que os líderes desempenhavam essa responsabilidade. Há muita coisa em jogo e as pessoas contam com vocês”, afirma Simeão, dimensionando o papel do líder aos olhos de Hunter, que admite jamais ter pensado sobre o impacto de suas ações na vida das outras pessoas.
Esse é a apenas o primeiro fio de consciência que ele recupera sobre seu ofício. Abaixo, você conhece outros ensinamentos da conversa entre “O monge e o executivo”.
1 – Para Simeão, compreender como se desenvolve a influência de um líder em sua equipe pressupõe refletir sobre a diferença entre poder e autoridade. A primeira palavra, segundo o monge, diz respeito à “faculdade de forçar ou coagir alguém a fazer sua vontade, por causa de sua posição ou força, mesmo que a pessoa preferisse não o fazer”. Já autoridade é “a habilidade de levar as pessoas a fazerem de boa vontade o que você quer por causa de sua influência pessoal”. Ele insiste: autoridade tem a ver com quem você é como pessoa, com seu caráter e com a influência que estabelece sobre as pessoas.
2 – Outra lição do monge foca na harmonia necessária entre entrega das tarefas e relacionamento. “Liderar é conseguir que as coisas sejam feitas pelas pessoas. Ao trabalhar com pessoas e conseguir que as coisas se façam por elas, sempre haverá duas dinâmicas em jogo – a tarefa e o relacionamento. É comum o líder perder o equilíbrio, concentrando-se apenas em uma das dinâmicas em detrimento da outra”, afirma.
Ele também enfatiza que a chave é executar as tarefas enquanto se constroem relacionamentos saudáveis, o que inclui toda a rede que envolve o trabalho, dos diretores e fornecedores, passando pelo principal: os clientes. “Se nossos clientes nos deixam e vão para os concorrentes, temos um problema de relacionamento. Não estamos identificando nem satisfazendo suas legítimas necessidades. E a regra número um dos negócios é: se não correspondermos às necessidades de nossos clientes, alguém o fará”.
3 – O monge também dá uma lição sobre dinheiro ao dizer que há um consenso de que ele é importante, mas que existem outros valores que são considerados até mais valiosos. Essa noção é essencial para se pensar na maneira de lidar com colaboradores. Afinal, não adianta pagar um bom salário e ignorar os pormenores de uma troca confiável entre o líder e o grupo. “As pesquisas feitas neste país durante décadas sobre o que as pessoas mais esperam de suas organizações mostraram sempre o dinheiro no quarto ou quinto lugar da lista. O tratamento digno e respeitoso, a capacidade de contribuir para o sucesso da organização e o sentimento de participação sempre apareceram acima do dinheiro. Infelizmente, a maioria dos líderes optou por não acreditar nas pesquisas”, lamenta.
4 – Simeão recorre a personagens históricos como Jesus e Gandhi para exemplificar como a liderança prescinde de algum tipo de sacrifício. Para ele, a construção da autoridade é realizada “sempre que servimos aos outros e nos sacrificamos por eles. O papel da liderança é servir, isto é, identificar e satisfazer as necessidades legítimas. Nesse pro cesso de satisfazer necessidades será preciso frequentemente fazer sacrifícios por aqueles a quem servimos”. A balança entre serviço e sacrifício é definida pela vontade, uma soma de intenção e ação: “Só quando nossas ações estiverem de acordo com nossas intenções é que nos tornaremos pessoas harmoniosas e líderes coerentes”.
5 – Outra preciosidade lançada por Simeão envolve aproximar a ideia de amor, com base nas definições registradas no Novo Testamento, da de liderança. No texto bíblico, é usado o termo grego ágape para falar de um amor cujo significado é traduzido pelo comportamento e pela escolha. A epístola aos Coríntio diz que o amor “é paciente, bom, não se gaba nem é arrogante, não se comporta inconvenientemente, não quer tudo só para si, não condena por causa de um erro cometido, não se regozija com a maldade, mas com a verdade, suporta todas as coisas, aguenta tudo. O amor nunca falha”. Para o monge, ágape e liderança são sinônimos. “Amor não é como nos sentimos a respeito dos outros, mas como nos comportamos com os outros”, sintetiza.