Introdução
Nas últimas décadas, diversos modismos ali-
mentares nasceram e morreram, mas os conselhos médicos sobre o que constitui um estilo de vida saudável permaneceram mais ou menos inalterados: opte por uma alimentação pobre em gordura, exercite-se mais e nunca, jamais, pule uma refeição. Durante esse mesmo período, a quantidade de pessoas obesas no mundo só fez aumentar.
Será que existe alguma abordagem diferente sustentada em fatos comprovados? Uma abordagem baseada na ciência, não na opinião? Nós acreditamos que sim: o jejum intermitente.
Quando ouvimos falar dos supostos benefícios do jejum intermitente, nós, como muitos, ficamos céticos. O jejum parecia uma prática radical e difícil – e ambos sabíamos que dietas, de modo geral, estão fadadas ao fracasso. No entanto, depois de termos analisado o método em profundidade, experimentando-o pessoalmente, estamos convencidos de seu impressionante potencial. Como disse um dos médicos especialistas entrevistados para o livro: “Nada que você possa fazer com seu organismo é tão poderoso quanto o jejum.”
Jejum: uma ideia antiga, um método moderno
O jejum não é novidade. Como veremos no próximo capítulo, nosso organismo foi projetado para jejuar. Evoluímos numa época em que a comida era escassa; somos o produto de um período de milhares de anos em que abundância e escassez se alternavam. Talvez o que nos leve a reagir tão bem ao jejum intermitente seja o fato de o jejum imitar, com precisão muito maior do que nossas tradicionais três refeições por dia, o ambiente no qual nós, humanos modernos, nos desenvolvemos.
O jejum, é claro, continua sendo uma prática religiosa para muita gente. Os jejuns da Quaresma, do Yom Kippur e do Ramadã são apenas alguns dos exemplos mais conhecidos. Os cristãos ortodoxos gregos são encorajados a jejuar durante 180 dias do ano (segundo São Nicolau de Zicha, “a gula deixa o homem triste e medroso, mas o jejum o torna alegre e corajoso”), ao passo que os monges budistas jejuam na lua nova e na lua cheia de cada mês lunar.
Entretanto, um número muito maior de pessoas come o tempo todo. Raramente sentimos fome. Mesmo assim, estamos insatisfeitos – com nosso peso, nosso corpo e nossa saúde.
O jejum intermitente pode nos colocar em contato novamente com nossa verdadeira natureza. É um caminho não apenas para o emagrecimento, mas também para a saúde e o bem-estar a longo prazo. Os cientistas estão apenas começando a descobrir e provar que o jejum pode ser uma ferramenta poderosa.
Este livro nasceu das investigações de ponta realizadas por esses cientistas e de seu impacto sobre as atuais crenças a respeito de emagrecimento, resistência a doenças e longevidade. Além disso, é resultado de nossas experiências pessoais.
Tanto a esfera do laboratório quanto do estilo de vida são relevantes aqui, por isso estudamos o jejum intermitente a partir de duas perspectivas complementares. Primeiro, o Dr. Michael Mosley, que usou o próprio corpo e sua formação em medicina para testar o potencial do jejum, explica a fundamentação científica do jejum intermitente (JI) e da Dieta dos 2 Dias – para os quais chamou a atenção do mundo em meados de 2012.
Em seguida, Mimi Spencer apresenta um guia prático para quem deseja fazer a dieta de forma segura, eficaz e duradoura, e que pode ser incorporado facilmente ao seu cotidiano. Mimi examina em detalhes o que é o jejum, o que se pode esperar no dia a dia, o que comer e quando comer, oferecendo uma série de dicas e estratégias que podem ajudá-lo a obter os maiores benefícios.
Como você vai ver a seguir, a Dieta dos 2 Dias mudou a nossa vida. Esperamos que ela faça o mesmo por você.
A motivação de Michael – Uma perspectiva masculina
Aos 55 anos, antes de explorar a fundo o jejum intermitente, eu estava um pouco acima do peso: com 1,80 metro de altura, eu pesava quase 85 quilos e tinha um índice de massa corporal de 26, o que me enquadrava na categoria de sobrepeso. Até os 30 anos, eu era magro, mas, como acontece com muitas pessoas, fui engordando gradualmente, cerca de meio quilo por ano. Não parece muita coisa, mas, passadas algumas décadas, isso me incomodava. Percebi que estava começando a me parecer com meu pai, que teve problemas de peso a vida toda e morreu aos 70 e poucos anos de complicações associadas ao diabetes. Em seu enterro, muitos dos seus amigos comentaram que eu estava cada vez mais parecido com ele.
Durante a produção de um documentário para a BBC, por sorte me mandaram fazer uma ressonância magnética. O exame revelou que eu era magro por fora e gordo por dentro. A gordura visceral talvez seja o tipo mais perigoso de gordura, pois se concentra em torno dos órgãos internos e eleva o risco de desenvolvimento de doenças cardíacas e diabetes. Exames de sangue realizados mais tarde revelaram que eu estava caminhando para o diabetes e que meu colesterol estava muito alto. Obviamente, eu teria que tomar alguma providência. Tentei seguir os conselhos-padrão, mas as medidas não surtiram grande efeito. Meu peso e meu perfil sanguíneo estacionaram na zona do “perigo adiante”.
Eu nunca havia tentado fazer dieta antes porque nunca encontrara uma em que eu acreditasse. Tinha visto meu pai experimentar várias delas, da dieta de Scarsdale à do Dr. Atkins, passando pela dieta de Cambridge e outras mais. Ele conseguia emagrecer com todas elas, mas, passados alguns meses, recuperava todo o peso perdido, e um pouco mais.
Foi então que, no início de 2012, Aidan Laverty, editor da série de ciência Horizon, da BBC, me procurou perguntando se eu gostaria de servir de cobaia para explorar a ciência por trás da longevidade. Eu não sabia ao certo o que iríamos encontrar, mas, junto com a produtora Kate Dart e o pesquisador Roshan Samarasinghe, logo decidimos que a restrição calórica e o jejum seriam áreas bem interessantes para explorarmos.
A restrição calórica é uma medida muito radical; envolve comer muito menos do que se esperaria de uma pessoa normal e fazê-lo todos os dias da sua longa vida. A razão pela qual as pessoas se submetem à restrição calórica é que se trata da única intervenção que comprovadamente prolonga o tempo de vida, pelo menos em animais. Existem no mínimo 10 mil adeptos da dieta CRON (do inglês Calorie Restriction with Optimum Nutrition – restrição calórica com nutrição ideal) ao redor do mundo, e conheci vários deles. Apesar de seu perfil bioquímico quase sempre fantástico, nunca fiquei tentado a me juntar a eles. Não tenho a força de vontade ou o desejo de manter para sempre uma dieta de pouquíssimas calorias.
Por isso, encantei-me ao descobrir o jejum intermitente (JI), que envolve ingerir menos calorias, mas apenas durante parte do tempo. Se a ciência estivesse certa, o jejum intermitente ofereceria os benefícios da restrição calórica, mas sem os sacrifícios por ela impostos.
Rodei pelos Estados Unidos e conheci cientistas renomados que compartilharam comigo suas pesquisas e suas ideias. Ficou claro que o jejum intermitente não era um modismo. Mas não seria tão fácil quanto eu havia imaginado no início. Como você verá mais adiante neste livro, há diversos estilos de jejum intermitente. Alguns envolvem não ingerir alimento algum durante 24 horas ou períodos ainda mais longos. Outros implicam fazer uma única refeição diária de baixa caloria dia sim, dia não. Experimentei as duas formas, mas não consegui me imaginar seguindo nenhuma delas com regularidade. Para mim, era difícil demais.
Decidi, assim, criar uma versão modificada e segui-la. Durante cinco dias por semana, eu comeria normalmente; nos outros dois, eu iria consumir um quarto da quantidade de calorias que costumo ingerir (ou seja, 600 calorias).
Dividi as 600 calorias em duas porções – mais ou menos 250 calorias no café da manhã e 350 calorias no jantar –, jejuando efetivamente durante umas 12 horas seguidas. Além disso, resolvi espaçar os dias de jejum da seguinte maneira: eu jejuaria às segundas e às quintas-feiras. Tornei-me meu próprio experimento.
O episódio do programa Horizon “Eat, Fast, Live Longer” (Coma, jejue, viva mais), que detalhava minhas aventuras com o que àquela altura estávamos chamando de Dieta dos 2 Dias, foi exibido na BBC durante os Jogos Olímpicos de Londres, em agosto de 2012. Minha expectativa era que o programa se perdesse em meio ao frenesi da mídia em torno das Olimpíadas, mas o que de fato aconteceu foi que ele gerou um frenesi próprio. O episódio teve mais de 2,5 milhões de telespectadores – uma enorme audiência para Horizon – e mais centenas de milhares de pessoas assistiram a ele no YouTube. Meu número de seguidores no Twitter triplicou. Todos queriam experimentar minha versão do jejum intermitente e me perguntavam o que deveriam fazer.
Os jornais publicaram matérias sobre o assunto. Surgiram artigos nos britânicos The Times, Daily Telegraph, Daily Mail e Mail on Sunday. Não demorou para que periódicos do mundo inteiro – Nova York, Los Angeles, Paris, Madri, Montreal, Islamabad, Nova Délhi – também publicassem matérias sobre o assunto. Foram criados grupos de discussão on-line, houve trocas de cardápios e experiências e começaram a pipocar salas de bate-papo sobre jejum. As pessoas me paravam na rua e me contavam como estavam se saindo na Dieta dos 2 Dias. Outras me enviavam e-mails com detalhes de suas experiências. Entre as mensagens recebidas, um número surpreendentemente alto vinha de médicos. Como eu, de início estavam céticos quanto à abordagem, mas resolveram testar o jejum, descobriram que funcionava e passaram a sugeri-lo a seus pacientes. Eles pediam informações, cardápios, detalhes de pesquisas científicas que pudessem analisar. Queriam que eu escrevesse um livro. Eu adiei, procrastinei, até que encontrei uma colaboradora, Mimi Spencer, de quem eu gostava, em quem confiava e que tinha um profundo conhecimento sobre alimentação. E foi assim que surgiu este livro.
A formação do Dr. Michael
Estudei medicina no Hospital Royal College Free, de Londres. Depois de me formar, ingressei na BBC como trainee de assistente de produção. Nos últimos 25 anos, fiz inúmeros documentários sobre ciências e história para a BBC, primeiro por trás das câmeras e mais recentemente como apresentador. Fui produtor executivo dos programas QED; Trust Me, I’m a Doctor; e Superhuman. Trabalhei com John Cleese, Jeremy Clarkson, o professor Robert Winston, sir David Attenborough e com a professora Alice Roberts. Concebi e produzi muitos programas para a BBC e o Discovery Channel, entre eles: Pompeia – O último dia, Supervolcano e Krakatoa: Volcano of Destruction.
Como apresentador, participei de várias séries para a BBC, inclusive Medical Mavericks, Blood and Guts, Inside Michael Mosley, Science Story, The Young Ones, Corpo humano e The Truth About Exercise. Estou fazendo atualmente três novas séries, além de ser repórter científico regular do The One Show, da BBC.
Ganhei vários prêmios, inclusive o de Jornalista Médico do Ano, concedido pela Associação Médica Britânica.
A motivação de Mimi – Uma perspectiva feminina
Comecei o jejum intermitente no dia em que fiquei encarregada de redigir uma matéria para o The Times sobre o programa Horizon, do Dr. Michael. Era a primeira vez que eu ouvia falar em jejum intermitente, e a ideia logo me atraiu, mesmo sendo uma alma cética que passou décadas examinando a curiosa acrobacia da indústria da moda, do negócio da beleza e das dietas.
Aos 40 e poucos anos, eu já havia me aventurado nas dietas antes e emagrecera, só para depois desanimar e voltar a engordar tudo de novo. Embora nunca tenha estado acima do peso, há muito tempo tentava encontrar uma maneira de eliminar os relutantes 3, 4 quilos que engordara durante a gravidez e que, por algum motivo, não conseguia perder. As dietas que experimentei foram sempre muito difíceis de seguir, complicadas demais de implementar, enfadonhas, muito elaboradas, pouco variadas e invasivas, sugando o sumo da vida e deixando apenas os restos. Não havia nada que eu considerasse viável adotar e inserir no meu dia a dia – como mãe, profissional e esposa.
Durante anos argumentei que fazer dieta é um jogo tolo, fadado ao fracasso, por conta das restrições e privações impostas a uma vida feliz, mas naquele momento senti que era diferente. Os indícios científicos eram numerosos e convincentes, e a reação da comunidade médica era positiva (o que foi fundamental para mim). Os efeitos, para o Dr. Michael e para outros, eram impressionantes, surpreendentes até. No documentário Horizon, Michael chamou o jejum intermitente de “o início de algo grande, que poderia transformar radicalmente a saúde do país”. Não consegui resistir. Tampouco consegui encontrar motivos para esperar.