“Queridos discípulos:
à multidão, prefiram a solidão.
À agitação, a calma.
Ao barulho, o silêncio.”
Últimas palavras de Buda
Introdução
Um livro diferente
Livros de desenvolvimento pessoal costumam ser cheios de conselhos que supostamente nos ajudam a alcançar a serenidade em poucos dias. Considerando o fato de que o próprio Buda levou muitos anos para atingi-la, eu não estava convencida de que esses “manuais”, com suas soluções prontas, cumpriam bem esse papel.
Durante as minhas leituras, muitas vezes reprimi a vontade de gritar um sonoro e vigoroso “Então, prove!” a quem quer que defendesse algum “método milagroso” sem que a própria vida refletisse a sabedoria que pregava.
Então achei que eu precisava escrever um tipo diferente de livro. E assim, para evitar a ira dos leitores mais céticos, coloquei nestas páginas diversos casos reais, exemplos, exercícios e histórias.
Na hora de decidir sobre o que escrever, o tema do silêncio surgiu por si só, como se uma deidade benevolente respondesse ao grito desesperado de uma monja que não suportava mais a cacofonia ao seu redor. Para onde quer que olhasse, eu via a falta de calma e bem-estar no mundo moderno, em que nossas atividades incessantes aumentaram o volume a níveis insuportáveis. Com as pessoas cada vez mais plugadas em seus dispositivos eletrônicos, usando fones de ouvido para criar um casulo sônico reconfortante, o silêncio parece ter sido relegado ao esquecimento. Então eu me perguntei: como seria se reaprendêssemos a arte do silêncio, tornando-a a prática determinante do século 21? Uma nova forma de ser. Quem sabe uma revolução!
A abordagem que tenho seguido ao longo dos anos e que compartilho com você agora me ensinou a abraçar o silêncio e a descobrir o imenso poder que todos possuímos escondido dentro de nós. Através do esforço real e contínuo, você pode trilhar o mesmo caminho, e lhe garanto que há uma vista deslumbrante além da montanha.
Ao percorrer estas páginas – em ordem ou aleatoriamente –, você encontrará uma série de exercícios. Fique atento, pois eles têm o poder de mudar sua vida. Porque, já que eu iria escrever um livro, explorando longamente algumas práticas e revelando diversos trechos de minha história pessoal, achei que ele teria que servir para alguma coisa. Então, abra-o por sua conta e risco, sabendo que mudanças profundas estão à sua espera. Dizem que muitas pessoas preferem uma situação desagradável, porém familiar, a algo novo e imprevisível. E você?
Enquanto parte do seu cérebro pondera cuidadosamente sobre essa questão, deixe-me dar algumas informações a respeito desses exercícios. Eles foram pensados para serem integrados com facilidade no seu dia a dia. Não é preciso acordar mais cedo nem roubar horas de seu dia para inserir as práticas na rotina. Será mais como salpicar algumas pitadas de consciência e concentração às suas atividades normais, como se acrescentasse um tempero sutil ao prato. Experimente e verá: o sabor das horas pode ser modificado, revelando aromas surpreendentes.
Levar mais tempo para fazer as coisas – saboreando longos períodos de tranquilidade – pode trazer ainda mais benefícios para a sua vida. Para os privilegiados que dispõem de tempo livre para isso (pense na sua sorte nesta sociedade hiperativa!), falaremos sobre os retiros monásticos ou as curas de silêncio feitas em casa mesmo, durante um ou vários dias.
Espero que você encontre nas páginas a seguir ideias e práticas que lhe sejam úteis. Pense nelas como pepitas que carregará secretamente no bolso – uma maneira de entrar em contato com a fonte de sua riqueza interior.
Imagine que estou lhe dando as chaves de um edifício. Ele é grande e tem muitas portas, mas você pode optar por abrir algumas e deixar outras fechadas; a escolha é sua. E mais tarde você pode voltar e abrir outras, porque, ao chegar ao fim do livro, terá um monte de chaves à sua disposição.
(Este livro contém ainda alguns arroubos líricos que o fascínio diante da natureza ou da beleza das criaturas fez brotar em mim. Se você é mais racional, fique à vontade para pular essas passagens. Prometo que não irei culpá-lo.)
Para começar, um pedido de desculpas
Este livro sobre o silêncio contém mais de 30 mil palavras. Um paradoxo, não é mesmo? Todas essas páginas para descrever o indizível quando um quadro de Rembrandt ou uma composição de Erik Satie teria sido suficiente. De fato, convidar o silêncio para o banquete da vida é simples: basta focar a atenção por uma fração de segundo, ter os ouvidos atentos e escutar, admirar um pássaro cruzando o céu… ou deixar que qualquer coisa igualmente espontânea nos surpreenda.
No meu caso, o problema é que, tanto para pintar quanto para dedilhar as teclas de um piano, tenho a delicadeza e a calma de um jogador de futebol numa final de campeonato. Logo, para explicar a magia do silêncio, precisei recorrer aos meios disponíveis para mim: uma saraivada de palavras emergindo do limbo até encontrar seu lugar no papel. Ideias, frases e pequenas histórias surgiram aos montes, uma atrás da outra, desenhando pouco a pouco a trama deste livro. Assisti a tudo isso bastante surpresa, fazendo-me as seguintes perguntas: de onde vêm estas palavras? Que consciência é essa que tagarela sem parar na minha mente? O mistério ainda permanece, mas o resultado é esta obra – de cuja verborragia espero sinceramente que você me perdoe.
Meus primeiros passos no caminho do zen
Fui criada numa família católica nos subúrbios de Paris: um ambiente impregnado de um tipo de catolicismo da classe trabalhadora mais interessada em sindicatos do que no estudo da Bíblia. Aprendi muito com a minha criação, inclusive o que mais tarde se tornaria o alicerce da minha espiritualidade: assistência mútua, fraternidade, vida em harmonia e oração. Então as primeiras lufadas de incenso que respirei na missa de domingo, nos braços do meu pai, provavelmente contribuíram tanto para a minha futura carreira monástica quanto as escrituras budistas em que mergulhei durante meus estudos. Naquela época, a paróquia era amistosa e vibrante, e me lembro das festas de rua, com representantes de todos os continentes e de todas as cores de pele.
Nos anos da adolescência, no entanto, me distanciei do catolicismo. Eu não estava satisfeita com as respostas que recebia sobre questões como justiça social, vida após a morte ou mesmo, em termos mais gerais, o sentido de estarmos aqui. Mas, acima de tudo, eu queria explorar diferentes continentes. E o budismo – com o qual tive contato por meio dos livros do Dalai Lama – me pareceu uma “terra” apropriadamente distante para um novo começo. Esse foi o início da minha aventura, e me atirei na espiritualidade asiática com indisfarçado entusiasmo.
Depois de me formar em direito público, comecei a trabalhar como jornalista e professora de canto. Mas, em paralelo, logo me vi atraída pelos mosteiros zen, frequentando retiros em diferentes partes da França. O apelo da espiritualidade era muito intenso para eu continuar levando uma vida “comum”. Dia após dia, eu me sentia como se estivesse sendo guiada por uma força interior, que me convidava – com um sorrisinho irônico – a mudar de vida.
Então, após cinco ou seis desses retiros budistas, minha perambulação chegou ao fim na Alsácia, no mosteiro Ryumonji Zen, onde o mestre Olivier Reigen Wang-Genh me deu calorosas boas-vindas e eu descobri uma equipe motivada e dinâmica.
E lá fiquei durante quase dezesseis anos: dezesseis anos de vida monástica intensa e aprendizado extraordinário.
A dança dos rótulos
Quando as pessoas me perguntam o que faço da vida, tenho vontade de responder: “Bem, um monte de coisas. Eu ando, como, durmo, olho para o céu, respiro, brinco com meus gatos, medito, canto… E você?” Mas não é isso que esperam ouvir. Quando conversamos com uma pessoa, precisamos decidir em que categoria vamos colocá-la, por isso todo mundo acaba usando uma espécie de rótulo para ser catalogado corretamente. Ficamos muito desconfortáveis quando vemos alguém sem um rótulo! Então, para tranquilizar meus interlocutores, também adotei uma série de etiquetas que posso colar e descolar de acordo com as circunstâncias.
Geralmente adoto o rótulo de “monja zen-budista”. É, sem dúvida, o que se impregna cada vez mais profundamente em mim. Depois de um tempo, ficou parecendo mais uma tatuagem que uma etiqueta. Há quinze anos esta tem sido a minha nobre ocupação, ainda que a palavra “monja” não seja totalmente apropriada.
Embora exprima bem o aspecto espiritual da minha vida, deixa de fora várias coisas. Na minha tradição zen, podemos nos casar (tenho um companheiro encantador), ter filhos (eu não quis) e exercer uma atividade profissional além da responsabilidade monástica. Assim, a palavra monja parece um tanto obsoleta e parecerá ainda mais quando você descobrir que passo grande parte do meu tempo trabalhando na internet. Além de escrever no meu blog, sou responsável pelas redes sociais do mosteiro e de outras associações budistas. Em suma, uma monja do século 21, com um pé na antiga tradição e outro nas maravilhas do mundo moderno (o que me apresenta desafios cotidianos muito agradáveis e exige uma boa dose de equilíbrio!).
Outras atividades também surgiram com o tempo e ganharam espaço cada vez maior na minha vida: recepcionar os recém-chegados ao mosteiro, ensinar meditação, dar conferências e entrevistas, escrever artigos para revistas, trocar ideias com os colegas, etc. Ou seja, dias bem cheios e muito interessantes!
Às vezes, adoto o rótulo de terapeuta. Há alguns anos trabalho como hipnoterapeuta, uma corrente da terapia comportamental que utiliza os estados alterados da consciência para induzir mudanças. As áreas de ação são as mais diversas: depressão, preparação para provas, autoconfiança, tratamento de fobias… Essa atividade me fascina, e conhecer o outro me fornece muito material para meus ensinamentos budistas. Na minha tradição zen, trabalhamos algumas horas por semana para nosso sustento, pois não recebemos apoio financeiro de qualquer organização religiosa. E é melhor assim. O fato de enfrentarmos as mesmas dificuldades que as outras pessoas – arranjar emprego, ganhar dinheiro – sem dúvida nos permite estar mais sintonizados durante as conversas, palestras, conferências e outras interações.
Em outros momentos, também sou professora de canto e de oratória, minha primeira profissão, iniciada em 1998. Voltarei a esse assunto outras vezes.
Por fim, há dois anos trabalho como voluntária cuidando de cavalos. Nada a ver com os demais rótulos! Conhecer esses animais vivendo praticamente livres em seu hábitat foi um aprendizado tão importante que não resistirei ao prazer de me estender sobre o assunto ao longo do livro. Antes, como uma típica garota da cidade, meu conhecimento do universo equino se resumia aos personagens de “Meu pequeno pônei”. Hoje você pode me encontrar regularmente sentada em um trator para levar feno ao pasto ou com os dedos enfiados na boca dos cavalos para verificar a condição de seus dentes. Escovo a pelagem deles, preparo a comida, arrumo o ambiente para eles passarem o inverno, faço carinho, cócegas e, sobretudo, fico horas a fio com esses animais para estudar… o silêncio!
E agora assumi o rótulo de escritora. Que Victor Hugo me perdoe a audácia, mas vamos em frente!
O comitê de redação
Várias pessoas e alguns outros elementos contribuíram para a elaboração deste livro. Por exemplo, Lala, minha princesa felina, alongando-se frequentemente em volta do meu computador, me inspirou a fazer pausas. Sem ela e suas sugestões benevolentes, minhas costas estariam acabadas. E, percorrendo o escritório com elegância da direita para a esquerda, ela também me fez praticar a ioga dos olhos, permitindo que eu descansasse minhas pupilas.
A ajuda para escrever também veio da senhora de 93 anos que encontrei na loja de chá do meu bairro e que exclamou com seu magnífico sotaque da Alsácia: “Leio seus textos com uma lupa antes de dormir. Eles me fazem muito bem…” Pensar nela me dava motivação quando batia o desânimo.
Havia ainda aquele furtivo sol de inverno atravessando a janela nos dias cinzentos e se derramando sobre minha mesa, como se dissesse: “Vamos! Anda! Ao trabalho!”
Além disso, também foram fundamentais o elo invisível com Sophie R., minha primeira leitora constantemente em meus pensamentos, os amigos, o vento, os pássaros, os cafés, os cavalos, as redes sociais e, sobretudo, as montanhas de livros devorados desde os 5 anos, quando minha amorosa avó me ensinou a ler em seu colo aconchegante. Sem essas coisas, essas pessoas, essas leituras, essas palavras guardadas nos abismos da minha mente, essas expressões que ressurgem, alegres, do fundo da minha memória, estas páginas teriam permanecido vazias. Silenciosas.
Os moradores do mosteiro e sua paciência ao me ver zanzar de um lado para outro, da floresta ao refeitório, dos cavalos ao dojo, com uma caneta na mão e mil ideias na cabeça também tiveram papel importante. De uns tempos para cá, não tenho andado muito disponível para a prática cotidiana, mas observo, de longe e cheia de gratidão, o engajamento comunitário.
E há você, meu irmão de alma, que me acompanha por todos esses anos. Não lhe direi nada, deixarei que meu silêncio o envolva. I Shin Den Shin. Este livro é dedicado a você.
Onde escrevi este livro
Para escrever este pequeno manifesto espiritual, levei meu notebook aos mais diversos lugares, tanto na cidade quanto no campo.
Por exemplo, ao mosteiro zen de Weiterswiller, na França, onde morei por mais de quinze anos. Esse lugar mágico encontra-se na Alsácia, nas montanhas de Vosges do Norte, perdido às margens de uma floresta. Volto sempre lá, sobretudo no inverno, quando a pequena cabana onde vivo vira uma geladeira. Foi o que aconteceu no último inverno: com temperaturas perto de -10ºC, encanamentos congelados e vento glacial atravessando as paredes de madeira, desisti da vida de eremita e fui me refugiar no mosteiro para observar, do quentinho, as geadas passarem. Nesse ambiente, o tempo tem um sabor todo especial. Estamos conectados à atualidade, ligados ao mundo graças à internet, mas o mosteiro emana uma energia serena que nos convida a desacelerar. Com meditações de manhã e à noite, o lugar é envolto por uma nuvem de ondas positivas, coberto por um manto de boas vibrações que permitem que a mente se acalme. (A respeito da internet, e só para não deixar qualquer dúvida quanto a isso, esclareço que as pessoas em retiros de curta duração são convidadas a desligar seus smartphones, a fazer um verdadeiro detox digital, e vocês compreenderão por que mais adiante.)
Uma vez por semana, eu visitava a capital, Estrasburgo, para escrever em lugares como o Michel (famoso restaurante que abrigou, no passado, os estudantes do Maio de 1968), o Solidarité (com suas imensas janelas), o Atlantico (uma barcaça com vista para o rio) e o Centro de Budismo Zen, nosso local de prática em pleno centro da cidade.
Juntar frases num café ou restaurante, cercada de estudantes, mensageiros e funcionários de escritórios, com uma trilha sonora de reggae ou R&B pode ser um barato! Embora o mundo corresse apressado à minha volta e o tempo passasse zunindo, eu me sentava num cantinho do balcão e entrava discretamente em outro espaço-tempo. Comia meu almoço devagar, observando com atenção as pessoas ao redor, saboreando o clima do momento – e mais importante – sem pressa. Eu me permitia levar o tempo que fosse necessário para escrever, para ouvir o espaço entre duas frases, para sorrir aos passantes e para me dar conta de que o barulho pode ser a melhor vitrine para o silêncio. Pois quanto mais ruidosa a cidade, mais o silêncio dentro de você se revela, em perfeita simetria.
Modo de usar
A maioria dos temas e exercícios aqui descritos foi ilustrada com exemplos reais. Isso parte do seguinte princípio: se alguém testou algo e obteve sucesso, a porta está aberta para que outros entrem. Quando eu estava estudando hipnose, exploramos amplamente o domínio da programação neurolinguística (PNL): um nome complicado para uma espécie de treinamento da mente. Aprendi como funciona nosso cérebro, deixando de fora os aspectos puramente médicos e focando em como direcioná-lo da forma correta para nossos objetivos. É de uma eficácia formidável!
Um dos princípios da PNL é a modelagem. Para alcançar uma meta, progredir numa determinada área ou promover alguma mudança na vida, os criadores da PNL nos propõem simplesmente observar as pessoas que conseguiram fazer o mesmo que desejamos… e imitá-las! Para tornar a técnica interessante, chamaram essa prática de “modelagem”, mas a verdade é que não passa de um aprendizado por imitação.
Após esses estudos, comecei a modelar o tempo todo. Quando uma pessoa fazia uma coisa interessante ou exibia um talento especial, eu a estudava com cuidado para extrair o máximo de informações possível. Assim, tive que encher alguns dos meus interlocutores de perguntas. Foi o que fiz, por exemplo, com a monja Michèle, que dá mostras de uma serenidade imperturbável diante das observações impertinentes de outra praticante. Convidei-a para tomar um chá e a bombardeei com perguntas: “Como você faz para não ficar nervosa?”, “O que sente quando uma pessoa a agride?”, “Como faz para não pensar mais nisso?”, etc. Ela permaneceu firme diante da enxurrada de questões inesperadas e pude aprender muito espelhando seu comportamento.
É isso que proponho que você faça com este livro. Quando um exemplo tocá-lo, imite-o! Modele, explore, imite, junte-se à aventura! Ao agir assim, você descobrirá novos recursos e novas maneiras de ver o mundo que poderá adaptar e, principalmente, compartilhar!