O maior líder da história | Sextante
Livro

O maior líder da história

Augusto Cury

O PSIQUIATRA MAIS LIDO NO MUNDO NA ATUALIDADE.

Para transformar 12 jovens com graves problemas de personalidade em mentes brilhantes, o pensador da psicologia Marco Polo utiliza as mesmas ferramentas de gestão da emoção que o Mestre dos mestres usou para formar seus discípulos.

                                                    

O extraordinário desafio enfrentado pelo Dr. Marco Polo ao conduzir um treinamento terá consequências surpreendentes

“Pense nesta tese perturbadora: a educação mundial está formando mentes lógicas, mas idiotas emocionais destituídos de gestão da emoção, autocontrole, empatia e resiliência.

No entanto, houve na história um educador ousadíssimo que escolheu a dedo alunos com esse mesmo perfil. O mais forte, Pedro, era ansioso, descontrolado e intolerante. O mais amável, João, era emocionalmente bipolar e ambicioso. O mais pragmático,Tomé, era paranoico, desconfiava de tudo. O mais lógico, Mateus, tinha fama de corrupto. O mais culto e comedido, Judas, era dissimulado.

Você chamaria um time desses para executar seu projeto vida? Seria um fracasso! Todavia, o maior líder da história, o Mestre dos mestres, não apenas os chamou, mas usou sofisticadas ferramentas socioemocionais para torná-los exemplos de mentes saudáveis e brilhantes.

Neste romance psiquiátrico, Marco Polo é desafiado por um grupo de reitores e intelectuais a educar estudantes universitários alienados, agressivos e intratáveis a partir das mesmas ferramentas que Jesus usou. O resultado? Prepare-se para se surpreender!”

DR. AUGUSTO CURY

Compartilhe: Email
Ficha técnica
Lançamento 05/08/2020
Formato 16 X 23 cm
Número de páginas 240
Peso 260 g
Acabamento brochura
ISBN 978-85-431-0990-9
EAN 9788543109909
Preço R$ 59,90
Ficha técnica e-book
eISBN 978-85-431-0991-6
Preço R$ 34,99
Ficha técnica audiolivro
ISBN 9786555641059
Duração 09h 44min
Locutor Jorge Rebello
Lançamento 05/08/2020
Título original
Tradução
Formato 16 X 23 cm
Número de páginas 240
Peso 260 g
Acabamento brochura
ISBN 978-85-431-0990-9
EAN 9788543109909
Preço R$ 59,90

E-book

eISBN 978-85-431-0991-6
Preço R$ 34,99

Audiolivro

ISBN 9786555641059
Duração 09h 44min
Locutor Jorge Rebello
Preço US$ 7,99

Leia um trecho do livro

PREFÁCIO

Pense nesta tese perturbadora: a educação mundial está formando mentes lógicas, mas idiotas emocionais destituídos de gestão da emoção, autocontrole, empatia e resiliência. No entanto, houve na história um educador ousadíssimo que escolheu a dedo alunos com esse mesmo perfil. O mais forte, Pedro, era ansioso, descontrolado e intolerante. O mais amável, João, era emocionalmente bipolar e ambicioso. O mais pragmático, Tomé, era paranoico, desconfiava de tudo. O mais lógico, Mateus, tinha fama de corrupto. O mais culto e dosado, Judas, era dissimulado. Você chamaria um time desses para executar seu projeto de vida? Seria um fracasso! Todavia, o maior líder da história, o Mestre dos mestres, não apenas os chamou, mas usou sofisticadas ferramentas socioemocionais para torná-los exemplos de mentes saudáveis e brilhantes. Desse modo, ele construiu a maior startup mundial de educação para revolucionar a humanidade. Neste romance psiquiátrico, o psiquiatra Marco Polo, reconhecido internacionalmente, é desafiado por um grupo de reitores e intelectuais a usar as mesmas ferramentas que Jesus usou para educar estudantes universitários alienados, agressivos, intratáveis, escórias acadêmicas. O resultado? Prepare-se para se surpreender!

– AUGUSTO CURY

EXPERIÊNCIAS SOCIOLÓGICAS PERIGOSAS

O psiquiatra Marco Polo estava ofegante em seu escritório em Los Angeles, Califórnia. Somente a luz do abajur sobre a mesa permanecia acesa. Hematomas no tórax e na testa, edema no lábio inferior e três pontos na sobrancelha direita marcavam a face de um homem que fora espancado. Mas quem lincharia um intelectual famoso, apaixonado, disposto a contribuir com a sociedade? O velho ditado “Em terra de cego, quem tem um olho é rei” é uma mentira. Na verdade, quem tem um olho é execrado e agredido, principalmente se tiver a coragem de expor suas ideias.

Ele se sentou diante do computador. Não se deixaria abater. Estava determinado a escrever um novo artigo sobre a falência emocional da humanidade. Inspirado, começou a trabalhar. Ia concatenando rapidamente os pensamentos, lendo em voz alta suas ideias à medida que as palavras fluíam para o teclado:

– O ser humano é um ator atormentado no teatro do tempo. Criamos fantasmas e nos assombramos com eles. Maltratar o tempo é um desses monstros indomesticáveis…

Sua concentração era tamanha que não havia percebido que não estava só. Alguém havia entrado sutilmente em seu escritório e ouvia suas palavras com espanto.

– Maltratar o tempo? Monstros indomesticáveis? Como assim, Marco Polo? – indagou Sofia, que também era psiquiatra.

Ele despertou do transe. Ao notar sua presença, Marco Polo não se virou, mas abriu um leve sorriso, dando um suspiro de satisfação. Ela lhe trazia o alívio do prazer em meio a poças de angústia.

– Sofia, você aqui…?

Ela era sua namorada. Depois que Anna, sua esposa, morrera tragicamente em decorrência de uma doença autoimune, o psiquiatra pensava que jamais conseguiria amar outra vez. Mas Sofia, emocionalmente penetrante e intelectualmente lúcida, crítica, debatedora de ideias, entrara na sua história como um terremoto, desconstruindo sofismas.

– É tão bom ouvi-lo, Marco Polo. Eu nunca conseguiria amar alguém que não admirasse.

Fazia dois dias que não se viam. Era pouco tempo, mas, para Marco Polo, 48 horas podiam trazer incontáveis acontecimentos inesperados. Sofia queria beijá-lo, mas, temendo interrompê-lo em seu raciocínio, preferiu acomodar-se numa poltrona para lhe fazer companhia enquanto ele trabalhava mais um pouco em suas teses sobre o tempo. Na penumbra do cômodo, mal conseguia enxergar o rosto dele com clareza. O psiquiatra continuava pensando em voz alta:

– Os colegas nos frustram, os amigos nos decepcionam, os inimigos nos ferem, mas ninguém é tão cruel com o ser humano quanto o tempo. Muitos tentam fugir desesperadamente de suas garras, mas ele os alcança e brada: “Estúpidos mortais! Ninguém pode fugir de mim! Acariciem-me, façam de cada dia uma eternidade!” Muitos querem ser jovens para sempre, tentando enganá-lo com mil procedimentos estéticos, mas o tempo dá uma gargalhada e os adverte: “Tolos! Rejeitem-me, e envelhecerão rapidamente no único lugar em que não se deveria envelhecer – o território da emoção!” Os ricos tentam suborná-lo com seu poder, mas o tempo grita-lhes no silêncio de suas mentes: “Loucos! A vida é brevíssima para se viver e longuíssima para se errar. Quem erra tentando me comprar morre estando vivo. Sou invendável e insubornável!”

Ao ouvir essas palavras de Marco Polo, Sofia ficou fascinada. Sabia que em alguns momentos todo homem e toda mulher assumem esse papel de loucos, tolos e estúpidos, tentando enganar o tempo, comprá-lo ou fugir dele.

– Tem razão. Quando maltratamos o tempo, ele é cruel com o ser humano. – Ela não se conteve e se levantou, aproximando-se dele para beijá-lo. Mas no momento em que Marco Polo se virou, Sofia viu sua face ferida e ficou chocada. – O que aconteceu? Por que esses hematomas, os lábios inchados e esse corte na sobrancelha?

– Fiz uma experiência sociológica. Por um lado, malsucedida; por outro, interessante.

– Como assim? – questionou ela, preocupadíssima.

– Disfarcei-me e tentei falar sobre as loucuras humanas em alguns congressos acadêmicos, políticos e religiosos.

Sabendo que Marco Polo era ousado, que já correra risco de vida outras vezes, ela tentou repreendê-lo:

– Você é tão mortal! Não acha que maltratou o tempo com mais uma experiência fora da curva psicossocial?

– Talvez, talvez – repetiu ele. – Mas tentei ser cuidadoso. Coloquei uma barba postiça e fui, não como mendigo, mas como um simples anônimo, para esses eventos. Foi simplesmente incrível.

Ele soltou uma risada, mas, ao fazê-lo, sentiu sua musculatura se repuxar, suas dores aumentando. Interrompeu o riso ao meio.

Sofia não conseguia entender como um psiquiatra famoso como Marco Polo, um pesquisador internacionalmente respeitado, que escrevera mais de 3 mil páginas sobre uma das últimas fronteiras da ciência – o processo de construção dos pensamentos e da consciência existencial –, poderia ser tão inconsequente com a própria saúde. Mas ele era assim. Um pensador incontrolável. A vida para ele era uma aventura irrepetível.

– Você acha que tem idade para essas aventuras? Como ousa viver experiências que nem jovens rebeldes têm coragem de encarar? Marco Polo, conviver com você é muito mais que uma montanha-russa. Em alguns momentos, eu estou no céu da alegria, no céu do romance e da tranquilidade; em outros, estou no inferno do estresse, da angústia e dos riscos. Viver com você é uma grande aventura, mas às vezes é quase insuportável. Você lembra que nós quase morremos há apenas alguns meses? Fomos perseguidos por inimigos implacáveis, religiosos radicais que diziam que era impossível um psiquiatra estudar a mente de Jesus Cristo. Eu sei que você agiu com maestria. Sei que você fez algo jamais tentado na história das ciências humanas. Você garimpou ferramentas incríveis do Mestre dos mestres e nos levou a compreender que ele conseguiu transformar lágrimas em sabedoria, perdas em ganhos, e fazer poesias quando o mundo desabava sobre ele. Mas não dá, Marco Polo. Eu não suporto! Eu não suporto a possibilidade de, a qualquer momento, te perder. Eu te amo o suficiente para ter medo, o mais dramático medo, o mais primitivo e o mais real: o medo de perder quem eu amo.

Sofia começou a chorar copiosamente. Marco Polo a abraçou, também derramou algumas lágrimas, e disse:

− Eu também te amo. Eu gostaria de ser diferente de quem sou. Posso mudar muitas coisas: posso mudar as rotas em meu carro, posso mudar passagens aéreas, posso ficar de quarentena na minha casa, mas não posso mudar quem eu sou. Sinto muito em te ferir tanto, Sofia. Em te preocupar tanto. Sei que você é uma psiquiatra notável, mas até para uma psiquiatra, o volume de estresse é altíssimo.

Ele olhou demoradamente para ela antes de continuar:

– Mas, querida Sofia, quem não é fiel à própria consciência tem uma dívida impagável consigo mesmo. Você sabe muito bem que sou um crítico do culto à celebridade. Sabe que esse culto, que contamina não apenas atores e cantores, mas também influenciadores digitais, é uma idiotice emocional. Não há célebres nem anônimos no palco do tempo. Somos todos simples mortais. Coloquei em risco minha vida? Sim, é verdade. Mas queria ser ouvido pelas minhas ideias, não pela minha fama.

Ela suspirou, relaxou e depois, mais calma, indagou:

– Imagino que você deve ter sido quase linchado nesses ambientes. O que o levou a fazer essa experiência tão extrema?

– Uma das causas foi a constatação de que o sistema educacional mundial está doente, formando pessoas doentes para uma sociedade doente. Nossas sociedades digitais se converteram num manicômio global. Mesmo universidades como Harvard, MIT, Stanford, Cambridge, Oxford e outras formam, com as devidas exceções, ouvintes, espectadores passivos, que não têm resiliência, autocontrole, a mínima capacidade de proteger a própria emoção e reciclar seu lixo mental. Qualquer proprietário de terra, residência ou veículo tem um certificado de propriedade, tem proteção legal, mas nossa mente é terra de ninguém, não é ensinada a se autoproteger. Por isso, a alodoxafobia, o medo da opinião dos outros, é uma das fobias mais marcantes da atualidade.

– Espere, deixe-me respirar – disse ela, refletindo. – Preciso assimilar suas ideias. Seu diagnóstico é muito sério.

Sofia pensou um pouco antes de pedir que ele continuasse. Marco Polo completou o raciocínio:
– A mente das crianças e dos adolescentes está completamente desprotegida nessa explosão de dados e imagens da era digital. Pais usam celulares até mesmo para os bebês se aquietarem na hora de almoçar e jantar. Estão assassinando o futuro emocional dos filhos sem saber. Mas vamos deixar esse assunto de lado por enquanto. Quero lhe contar o que aconteceu anteontem.

Marco Polo começou então a relatar sua experiência sociológica como um simples anônimo. Dois dias antes, numa manhã ensolarada, ele entrara num grande anfiteatro onde estava acontecendo um congresso acadêmico. Ilustres psicopedagogos, psicólogos, sociólogos e economistas participavam, discutindo metodologias de ensino nos tempos atuais. Sentara-se na última fileira.

Depois de ouvir debatedores por quase três horas, não se conteve e se dirigiu ao palco. Sem estar inscrito para falar nem pedir licença, pegou o microfone e, com sua voz segura, declarou sem meias palavras:

“Na era digital existe uma explosão de informações que leva uma criança de 7 anos a ter mais dados em seu cérebro do que os grandes pensadores da Grécia antiga. Essa avalanche de informações desenvolve a síndrome do pensamento acelerado. De um lado, os professores ficam sem saber o que fazer com a ansiedade dos alunos. De outro, milhares de médicos em todo o mundo diagnosticam equivocadamente essas crianças como hiperativas e prescrevem, sem necessidade, drogas da obediência. Algo inadmissível! Os senhores e as senhoras não percebem que alteramos a dinâmica do psiquismo humano nesta sociedade urgente e estressada? Não entendem que a aceleração do pensamento gerou uma inquietação que faz com que o último lugar em que os alunos querem estar é dentro da sala de aula? A mente dos jovens mudou. Ou a escola muda, ou será o fim dela!”

Sofia quase perdeu o fôlego ao ouvir o que acontecera.

– Sua ousadia foi surpreendente! Você parou por aí ou falou mais alguma coisa?

O pensador se perturbava só de lembrar.

– Afirmei que o sistema educacional não precisa de consertos, mas de uma revolução socioemocional. Disse que o sistema está falido. Que a memória dos alunos está dramaticamente saturada, que considerá-la inesgotável, uma fonte de lembrança pura, é colocar mais combustível na fogueira da ansiedade deles.

– Como assim? – indagou Sofia.

– A memória é um recurso limitado que pode se esgotar. Saturá-la com dados gera um estresse cerebral intenso, por isso muitos acordam fatigados. Além disso, ela não foi feita para lidar bem com as lembranças.

– Ao ouvi-lo, os líderes acadêmicos não ficaram chocados?

– Alguns professores doutores ficaram perplexos. Me olharam de cima a baixo e indagaram uns para os outros: “Quem é esse louco que afirma que não há lembrança pura na memória? Por acaso o pilar central da educação está errado? Ensinamos para que os alunos se lembrem. Por que ensinamos então?” Vendo que se perturbaram com minhas ideias, continuei: “Pensar é interpretar, e interpretar é distorcer a realidade dos dados do passado para recriá-los no presente.” E acrescentei: “Se você quer ser um líder que forma outros líderes, tem de ter consciência de que ensinamos para que os alunos aprendam a pensar. Não para repetir dados, pois qualquer computador medíocre repete informações melhor do que um Homo sapiens.” E comentei ainda que mais de 90% dos dados que registramos se perdem nos bastidores do cérebro, tornando-se lixo mental.

– Eu não sabia disso – admitiu Sofia. Embora fosse psiquiatra, não se estudava na formação dessa especialidade a fronteira mais complexa da mente humana: o processo de construção de pensamentos.

Marco Polo continuou relatando o que acontecera no evento acadêmico.

– A verdade essencial é um fim inatingível, pois diversas variáveis estão em jogo no exato momento da construção de pensamentos e geram uma cadeia de distorções. Como estamos, quem somos, o que desejamos e onde estamos, ou seja, nosso estado emocional, nossa personalidade, nossa intencionalidade e o ambiente social em que nos encontramos, interferem na abertura de janelas da memória e, portanto, no acesso aos dados da memória. Consequentemente distorcendo a construção das ideias. Foi o que eu disse para a plateia: “Caros professores, pensar não é se lembrar. Pensar é recriar a cada momento a realidade do mundo que somos e em que estamos. Portanto, se querem formar mentes brilhantes, e não servos que só obedecem a ordens, têm de saber que as provas escolares que exigem rigidamente a exatidão das informações ensinadas pelos professores assassinam a capacidade dos alunos de se reinventarem, de pensarem estrategicamente, intuírem, ousarem, trabalharem crises.”

– Eles aplaudiram? – perguntou Sofia.

– Alguns, sim; outros me execraram. Escandalizei muitos que eram racionalistas. Principalmente porque tive a coragem de dizer que deveríamos ser capazes de aplaudir os erros que remetiam à autodeterminação, ao raciocínio esquemático e à libertação do imaginário. Concluí dizendo: “Sob certos critérios, deveríamos dar nota máxima para quem errou todos os dados numa prova.”

Ao ouvir aquela afirmação, não poucos acadêmicos a consideraram uma heresia. No entanto, alguns ficaram aliviadíssimos, pois, ainda que não tivessem a base teórica de Marco Polo, pensavam a mesma coisa. Um professor de engenharia gritou: “Calem este homem!” Um de medicina bradou: “Ele quer descontruir a educação! Silenciem esse maluco!” Marco Polo olhou para este último e o reconheceu. Fora seu aluno e o respeitava muito quando estudante. O rapaz se tornara um professor doutor respeitado na área de neurologia, capaz de dar aulas e operar tumores e aneurismas. Mas era um leigo sobre os enigmas do cérebro humano.

Sofia não se conteve e comentou:

– Eu revelaria a minha identidade, Marco Polo. Daria uma “carteirada” nesses intelectuais superficiais. Ia fazê-los engolir sua arrogância.

– Mas não sou você, Sofia. Nós nos amamos, nos respeitamos, mas somos diferentes. Fui expulso sob um coro de vaias. Mas alguns me abraçaram no meio do caminho. Ao sair, fui empurrado por seguranças truculentos.

Sofia ficou estarrecida com a história, mas o relato ainda não explicava os ferimentos de Marco Polo. Mal sabia ela que o psiquiatra tivera um dia difícil e que o congresso não fora sua única experiência sociológica.

Marco Polo então respirou fundo e começou a contar o outro acontecimento, esse mais grave e perturbador. Naquele mesmo dia, à noite, ele perambulava pelas ruas pensando na estupidez e nas incongruências que invadem nossa mente e nos tornam tão desumanos.

De repente viu um aglomerado de pessoas que entravam em um grande anfiteatro. Marco Polo se aproximou e indagou do que se tratava. Disseram-lhe que um importante partido político estava realizando sua reunião anual. Figurões da liderança nacional estavam presentes – governadores, senadores, deputados. Ele não se importou em identificar qual partido se reunia, se de direita ou de esquerda. Interessava-lhe apenas conhecer as insanidades que faziam parte dessa casta. Para o pensador da psicologia, em política os erros são pontuais, mas as loucuras são democráticas: não há partidos isentos.

Marco Polo penetrou sorrateiramente no ambiente sabendo que ali precisava ficar quieto. Mas como?

– Nossa, Marco Polo! Você entrou na reunião anual de um partido político? Os políticos são muito mais intolerantes que os acadêmicos! – exclamou Sofia.

Durante a reunião, os líderes e maiores ícones do partido passaram horas enfadonhas tratando de seus ideais e seus números. Depois começaram a tecer críticas implacáveis, uma atrás da outra, tentando desconstruir o principal partido de oposição. Eles eram deuses e os da oposição, uma casta de demônios. Marco Polo, que estava no meio do anfiteatro, observou que as duas pessoas ao seu lado cochilavam, pois não havia atratividade e inovação. Foi então que se levantou e caminhou até o palco enquanto um senador fazia seu discurso dramaticamente longo. No púlpito, foi ao encontro do orador, e disse-lhe em voz branda que o tempo dele havia acabado.

Constrangido, o senador pensou que se tratava de alguém da organização do evento. Falou mais trinta segundos e lhe entregou o microfone.

Marco Polo foi tão sutil que alguns seguranças indagaram entre si quem era o sujeito que, de posse do microfone, ia direto às suas teses. Ao notar o que acontecia, alguns organizadores, preocupados, decidiram intervir e silenciá-lo. No entanto, foram seduzidos pela primeira habilidade dos grandes líderes citada pelo orador desconhecido: “Quem vence sem riscos triunfa sem glórias. Se você é um líder político ou empresarial e tem medo dos riscos, você está fora do jogo. Não há céus sem tempestades.”

– Que bom que deixaram você falar – ponderou Sofia, embora imaginasse que o terremoto estava por vir.

– Pois é. Eu também afirmei que se um político não correr riscos para preservar sua consciência, sua ética, sua transparência e amar a sociedade mais do que seu partido, será um líder fraco. E indaguei: “Há aqui entre vocês alguém que seja frágil emocionalmente?” Ninguém levantou a mão.

– Aí entornou o caldo – comentou Sofia, apreensiva.

– Claro! E então concluí que nenhum partido político é digno do poder se não for capaz de aplaudir os projetos da oposição. A reação foi muito pior do que na seara dos professores. Primeiro fez-se um silêncio sepulcral e, em seguida, alguns perguntaram há quanto tempo eu estava no partido. Outros disseram que eu era um infiltrado da oposição. Mas continuei abalando-os. Completei dizendo que quem serve às ideias ou a seu partido mais do que à sociedade é indigno de ser um político. Foi um escândalo. Alguns membros começaram a bater os pés e gritar: “Calem esse estúpido!” “Matem esse opositor!”

– Mas por que você não se calou, Marco Polo? – indagou Sofia levando as mãos à cabeça.

– Não consegui. Vendo que poderia ser linchado, bradei ainda mais alto: “Mais de 90% dos líderes de todas as áreas, seja política, empresarial, institucional, estão despreparados para o poder, pois o poder torna-se um vírus que os infecta e os cega. Só é digno do poder quem é desprendido dele, quem o usa para se curvar à sociedade e servi-la, não quem o usa para que a sociedade se curve diante de si e o sirva.” Terminei dizendo: “A humanidade está em risco, pois em todas as nações os partidos estão doentes, formando líderes doentes, incapazes de aplaudir quem pensa diferente, de reconhecer seus erros e se colocar como simples servos da sociedade.”

– E o que aconteceu? – perguntou ela, ansiosa.

Marco Polo sorriu e mostrou os hematomas em seu rosto.

– Os seguranças invadiram o palco e, aos socos e tapas, foram me expulsando. Num ataque de fúria, muitos ajudaram no espancamento. E assim me colocaram para fora do anfiteatro como lixo indigno de viver.

Marco Polo contou ainda que foi procurar um pronto-socorro, tomou alguns pontos e recebeu a recomendação de que repousasse.

Isso deveria ter sido suficiente para dissuadi-lo de vagar disfarçado pelas ruas de Los Angeles. No entanto, mesmo ferido, insistiu em sua experiência.

No dia seguinte ao episódio de violência na reunião anual do partido político, Marco Polo entrou no metrô e notou o vagão lotado de torcedores. Torcidas organizadas de dois times ofendiam uma à outra. O clima estava tenso. Aproveitando essa oportunidade, ele se posicionou entre elas e começou a conversar sozinho em voz relativamente alta. Falava e gesticulava com seus fantasmas mentais. Todos pararam para observar o histriônico. Em seguida parou e olhou a multidão atônita a seu redor. Provocando-os, indagou:

– Que diagnóstico vocês fazem quando veem alguém falando sozinho?

Os integrantes de uma torcida bradaram:

– Louco! Maluco!

Os da outra gritaram:

– Psicótico! Perturbado!

Uma senhora de 80 anos que estava sentada próximo de Marco Polo afirmou:

– Doido varrido. Você está doido, meu filho?

Ele olhou para ela e depois para a torcida, e respondeu sem medo:

– Às vezes, minha senhora, meus fantasmas mentais me perturbam. Outras vezes são os absurdos desta sociedade que me enlouquecem. – Em seguida ele passou as mãos no rosto e completou: – Quem aqui é cineasta?

Ninguém levantou a mão. Então o intrépido psiquiatra que amava colocar em xeque tanto intelectuais quanto leigos, tanto abastados quanto miseráveis, os abalou:

– Estamos em Los Angeles, a terra de Hollywood, e não há cineastas aqui? Errado. Todos vocês são cineastas.

Todos se entreolharam e alguns debocharam dele. Acharam que era mais um delírio do atraente maluco. Mas ele foi ferino em sua próxima pergunta:

– Vou provar. Respondam honestamente: quem de vocês cria de vez em quando um filme de terror na própria mente?

Era um ambiente muito inapropriado para as pessoas se abrirem. Mas elas se abriram. Quase todas levantaram a mão.

– Quais fantasmas assombram vocês? – indagou Marco Polo.

A senhora puxou a fila. Corajosa, disse que tinha medo da solidão, de morrer sozinha. Vendo a idosa ser tão ousada, os torcedores perderam a inibição. Um começou a dizer que tinha medo de falar em público, outro que tinha medo da morte, teve até um que declarou ter medo de zumbis. Mas ninguém confessou enfrentar o vampiro mental mais comum às torcidas organizadas: a necessidade neurótica de poder e de ser o centro das atenções sociais.

Sofia ouvia tudo atentamente e não conseguiu conter o entusiasmo.

– Interessantíssimo, Marco Polo!

– Quando eles se abriram, fiz uma sugestão. Propus a “semana da humanidade”, uma semana de atitudes invertidas – contou o psiquiatra.

– Eles não entenderam nada, mas eu expliquei: seria uma semana em que poderíamos gerir nossa emoção, abrandar nossas diferenças e adotar novas atitudes, algumas invertidas. Durante esse tempo, torcedores de um time torceriam também por um outro time, de preferência por um de que não gostassem. Pessoas de religiões distintas fariam uma visita solidária umas às outras. Gente que nunca visitou presídios, orfanatos, asilos, hospitais psiquiátricos, dedicaria seu tempo a esses seres humanos. Negros e supremacistas brancos se abraçariam e festejariam o espetáculo da vida. Políticos de partidos distintos convidariam seus opositores para jantar e discutir projetos sem preconceitos. Pais e professores críticos de seus filhos e alunos observariam os acertos despercebidos e passariam a aplaudi-los. Casais diminuiriam o tom de voz quando estivessem à beira de uma discussão.

Sofia ficou impressionada.

– Quem sabe se essa semana “pegasse”, isso poderia ser um impulso à viabilidade da espécie humana. – Num estado de êxtase, indagou: – E qual foi a reação das pessoas?

– Todas manifestaram espanto e euforia. A idosa bradou: “Que bonito, meu filho!” E então saiu de seu lugar e foi beijar os torcedores dos dois lados. Emocionados, eles começaram a se abraçar. E quando saíram do metrô, alguns gritaram em coro: “Semana da humanidade, estou dentro!” Foi tímido, mas é um começo.

– Mas em que filósofo ou pensador você se inspirou para ter essa ideia? – questionou Sofia.

Marco Polo parou, respirou profundamente e confessou:

– Você sabe que tenho estudado o carpinteiro de Nazaré. Você sabe que, antes de estudá-lo, eu achava que ele fosse fruto de um grupo de galileus que queriam um herói que os livrasse do jugo do tirânico e promíscuo Tibério César. Ao conhecê-lo melhor, como psiquiatra e como pesquisador do processo de construção de pensamentos, concluí que ele não era apenas superdotado, genial, mas muito provavelmente foi o homem mais inteligente da história, o líder dos líderes, que sem derramar uma gota de sangue mudou a matriz socioemocional da humanidade. Foi nele que me inspirei. Ele viveu uma vida inteira investindo na humanidade, na contramão dos fariseus do seu tempo e também de inumeráveis religiosos ao longo dos séculos. Ele transformou prostitutas em rainhas e leprosos em seus diletos amigos. Ele abraçou seu negador e tentou resgatar seu traidor. E, mesmo morrendo sobre o madeiro, per[1]doou seus torturadores. Esse é o homem que me inspirou…

LEIA MAIS

Augusto Cury

Sobre o autor

Augusto Cury

AUGUSTO CURY é psiquiatra, cientista, pesquisador e escritor. Publicado em mais de 70 países, já vendeu, só no Brasil, 30 milhões de exemplares de seus livros, sendo considerado o autor brasileiro mais lido na atualidade. Seu livro O vendedor de sonhos foi adaptado para o cinema pela Warner/Fox. O próximo título a ganhar as telonas será O futuro da humanidade. Entre seus sucessos estão O futuro da humanidade; O homem mais inteligente da história; O homem mais feliz da história; O maior líder da história; Pais brilhantes, professores fascinantes e Nunca desista dos seus sonhos. Cury é autor da Teoria da Inteligência Multifocal, que trata do complexo processo de construção de pensamentos, dos papéis da memória e da construção do Eu. Também é criador da Escola da Inteligência, o primeiro programa mundial de gestão da emoção para crianças e adolescentes e o maior programa de educação socioemocional da atualidade, com mais de 400 mil alunos.

VER PERFIL COMPLETO

Outros títulos de Augusto Cury

Assine a nossa Newsletter

Administração, negócios e economia
Autoajuda
Bem-estar, espiritualidade e mindfulness
Biografias, crônicas e histórias reais
Lançamentos do mês
Mais vendidos
Audiolivros
Selecionar todas
Administração, negócios e economia Lançamentos do mês
Autoajuda Mais vendidos
Bem-estar, espiritualidade e mindfulness Biografias, crônicas e histórias reais
Audiolivros Selecionar todas

Sobre o uso de cookie neste site: usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao continuar navegando, você concorda com a nossa Política de Privacidade.