Um manifesto pelos quietos
1. Um temperamento tranquilo é um superpoder secreto.
2. Existe uma palavra para descrever as “pessoas que passam muito tempo fechadas em si”: pensadores.
3. A maioria das grandes ideias nasce da solidão.
4. Você é capaz de se expandir como um elástico. Pode fazer tudo que um extrovertido faz, inclusive ser o centro das atenções. Sempre haverá tempo para ficar quieto depois.
5. Mesmo que precise se expandir de vez em quando, deve voltar a ser você mesmo ao final.
6. Dois ou três amigos íntimos valem mais do que 100 conhecidos (embora os conhecidos também sejam legais).
7. Introvertidos e extrovertidos são yin e yang – gostamos e precisamos uns dos outros.
8. Não há problema em atravessar a rua para evitar conversa fiada.
9. Para liderar, você não precisa ser líder de torcida. Pergunte ao Mahatma Gandhi.
10. E, por falar em Gandhi, foi ele quem disse: “Com gentileza é possível sacudir o mundo.”
Introdução
“Por que você está tão quieta?”
Amigos, professores, conhecidos e até pessoas que mal conheço já me fizeram essa pergunta. Quase todos têm boas intenções. Querem saber se estou bem ou se há alguma razão para eu estar no meu canto. Alguns perguntam de um jeito que dá a entender que acham estranho eu ficar em silêncio por um tempo.
Nem sempre tenho uma resposta simples e direta para essa pergunta. De vez em quando fico calada porque estou pensando ou observando alguma coisa. Às vezes estou mais empenhada em ouvir do que em falar. No entanto, quase sempre estou quieta porque sou assim mesmo. Quieta.
Na escola, “sociável” sempre pareceu ser o maior elogio que alguém podia receber. Nas aulas, era frequente os professores pedirem que eu falasse mais. Nas festas da escola, eu ia para a pista de dança com meus amigos, mas, se dependesse de mim, simplesmente passaríamos o tempo juntos na casa de alguém. Na faculdade, frequentava festas barulhentas e abarrotadas de gente, mas não conseguia me livrar da sensação de que estaria mais feliz jantando com um ou dois amigos e indo ao cinema. No entanto, nunca me queixei disso. Achava que devia fazer essas coisas para ser considerada “normal”.
Com o passar do tempo, construí uma rede pequena, mas sólida, de amigos íntimos e colegas mais chegados. Nunca me importei com o nível de popularidade deles, o que significa que alguns de meus amigos eram “descolados” e outros, nem um pouco. Como sempre gostei de ter conversas íntimas, minhas amizades foram construídas com base na confiança recíproca, no prazer proporcionado pela companhia uns dos outros e no amor. Tinham pouco a ver com panelinhas ou disputas de popularidade.
As pessoas começaram a me elogiar por minhas perguntas perspicazes, meu pensamento independente e minha serenidade ao lidar com situações tensas. Cumprimentavam-me por fazer reflexões profundas e por ser uma ótima ouvinte. Também começaram a me escutar. Notaram que, quando eu falava, era porque tinha algo sensato a dizer, fruto de uma reflexão. E, quando ingressei no mercado de trabalho, as pessoas arrojadas e francas que antes haviam me intimidado começaram a me oferecer empregos.
Com o tempo, fui percebendo que meu jeito tranquilo de lidar com a vida tinha sido desde sempre um grande poder. Foi uma ferramenta que eu simplesmente precisei aprender a usar. Olhei em volta e vi que muitas das grandes contribuições feitas ao mundo – do computador Apple a alguns livros infantis que influenciaram gerações – tinham sido obra de introvertidos, que as criaram exatamente por terem um temperamento tranquilo, e não apesar disso.
Reuni minhas ideias num livro para adultos chamado O poder dos quietos – Como os tímidos e introvertidos podem mudar um mundo que não para de falar. Ele entrou na lista dos mais vendidos do The New York Times, permaneceu nela durante anos e foi traduzido para 40 idiomas. Milhares de pessoas me disseram que esta ideia simples – a de que, se usado corretamente, seu jeito discreto pode ser uma grande força – mudou sua vida. O livro as tocou de um modo que eu nem poderia ter imaginado.
Em pouco tempo eu estava fazendo coisas que me pareciam impossíveis quando era mais jovem. Quando estava no segundo ciclo do ensino fundamental, por exemplo, eu tinha pavor de falar em público. Não conseguia dormir na véspera de apresentar um resumo de um livro. Uma vez, fiquei tão desconcertada que travei diante de todo mundo e não consegui sequer abrir a boca. Hoje, como defensora dos quietos, apareço em telas do mundo inteiro e faço palestras diante de milhares de pessoas. Fiz uma TED Talk sobre introversão que se tornou uma das mais vistas de todos os tempos, com muitos milhões de visualizações. (“TED” significa tecnologia, entretenimento e design e é o nome de uma organização que promove conferências em que as pessoas compartilham ideias relevantes.)
Inspirada por essas experiências, ajudei a fundar a Quiet Revolution, empresa que tem como missão capacitar introvertidos de todas as idades. Quero que nós, os quietos, sintamos que podemos ser nós mesmos em qualquer lugar – na escola, no trabalho e na sociedade em geral. A Quiet Revolution defende a mudança e promove a voz dos introvertidos. O movimento é de inclusão – qualquer um pode participar, seja quieto ou sociável. (Você pode conhecer mais sobre o projeto no site Quietrev.com, em inglês.)
É comum as pessoas me perguntarem se me tornei extrovertida, agora que fico tão à vontade falando em público e aparecendo na mídia. A verdade, porém, é que não mudei nenhum aspecto fundamental meu ao longo dos anos. Às vezes ainda sinto timidez. E adoro meu lado introvertido e reflexivo. Abracei o poder dos quietos – e você também pode fazer isso.
Muitos dos meus leitores dizem que gostariam de ter ouvido falar da Quiet Revolution quando jovens – ou quando se tornaram pais e precisaram criar filhos introvertidos. Também soube que alguns jovens inspiradores gostariam que houvesse uma versão de O poder dos quietos só para eles.
É aí que entra este livro.
Afinal, O que é um introvertido?
Existe um termo psicológico para definir pessoas como eu. Somos chamados de introvertidos – e não existe uma forma única de nos descrever. Gostamos da companhia dos outros, mas também de ficar sozinhos. Podemos ter grandes habilidades sociais e, ao mesmo tempo, ser reservados. Somos observadores. Ouvimos mais do que falamos. Ser introvertido tem a ver com possuir uma vida interior profunda e considerá-la importante.
Se o introvertido é alguém que olha para dentro, o extrovertido é justamente o contrário: ele se realiza em grupo e tira energia da companhia dos outros.
Ainda que você não seja uma pessoa introvertida, é provável que haja alguns de nós na sua família ou no seu círculo de amizades. Entre um terço e metade das pessoas é introvertida. Às vezes é fácil nos identificar. Somos aqueles que ficam encolhidos no sofá, com um livro ou um tablet nas mãos, e não cercados de pessoas. Nas festas, você provavelmente nos encontrará conversando com um grupo pequeno de amigos – e não dançando em cima da mesa. Na sala de aula, às vezes desviamos o rosto quando o professor procura voluntários. Estamos prestando atenção, mas preferimos acompanhar a aula quietos e contribuir quando estivermos prontos.
Em outras situações, nós, introvertidos, somos muito hábeis em esconder nossa verdadeira natureza. Conseguimos passar despercebidos na sala de aula e no refeitório da escola, parecendo agir com desinibição, quando, no fundo, mal podemos esperar para fugir da multidão e passar um tempo sozinhos. Desde que publiquei o livro, fiquei admirada com o número de pessoas aparentemente extrovertidas – inclusive atores, políticos, empresários e atletas – que me “confessaram” ser introvertidas.
Ser introvertido não significa necessariamente ser tímido. É importante fazer essa distinção. Os introvertidos podem ser tímidos, claro, mas também existe o extrovertido tímido. A timidez pode ser semelhante à introversão – faz as pessoas parecerem quietas e reservadas. Assim como a introversão, a timidez é complexa e tem diversas camadas. Pode surgir do nervosismo ou da insegurança provocada pela vontade de ser aceito pelos outros. Pode surgir do medo de cometer erros. Na sala de aula, é possível que o aluno tímido não levante a mão por medo de dar a resposta errada e sentir vergonha. E a menina introvertida sentada ao lado dele também pode manter a mão abaixada, mas por motivos diferentes. Talvez ela não sinta necessidade de contribuir. Ou talvez esteja ocupada demais para falar enquanto escuta e processa as informações.
Tal como a introversão, a timidez tem suas vantagens. Estudos mostram que as crianças tímidas tendem a construir amizades leais e a ser conscientes, empáticas e criativas. Tanto os tímidos quanto os introvertidos são excelentes ouvintes, e é pela escuta que costumamos amadurecer e desenvolver a capacidade de observar e aprender.
Este livro é sobre a introversão e a timidez – e sobre suas vantagens. Sou uma pessoa introvertida e naturalmente tímida (embora, com o tempo, tenha passado a sentir menos timidez). Mas talvez você seja apenas uma coisa ou outra. Tire proveito das partes do livro que se aplicarem a você e não se preocupe com o resto.
Você é introvertido, extrovertido ou ambivertido?
A psicologia é o estudo do comportamento humano e da mente humana e de suas funções. É claro que a mente de cada pessoa tem suas conexões especiais, mas todas seguem mais ou menos a mesma estrutura e todos temos muita coisa em comum. Carl Jung, renomado psicólogo do século XX, introduziu os termos “introvertido” e “extrovertido” para descrever diferentes tipos de personalidade. O próprio Jung era introvertido e foi o primeiro a explicar que os introvertidos se sentem atraídos pelo mundo interior dos pensamentos e sentimentos, enquanto seus opostos, os extrovertidos, preferem o mundo exterior formado por pessoas e atividades.
Jung também disse que ninguém é inteiramente introvertido ou extrovertido. Esses traços existem no que chamamos de espectro. A melhor maneira de entender um espectro é imaginar uma régua comprida. Digamos que numa ponta da régua estão os superextrovertidos e, na outra, os superintrovertidos. Há pessoas que se posicionam no meio do espectro – os psicólogos as chamam de “ambivertidas” –, porém mesmo as que tendem mais para uma das extremidades misturam traços dos dois opostos. Muitos introvertidos dizem que, quando estão com amigos íntimos ou discutindo um assunto interessante, se portam como pessoas extrovertidas. Por outro lado, mesmo que os extrovertidos gostem da companhia de outras pessoas, a maioria deles também precisa de um tempo para relaxar.