I
Introdução
Há muitos anos, conduzo um grupo de orações católico que tem por foco principal a devoção mariana do rosário. Durante as reuniões, com base em dons espirituais, transmito revelações do Espírito Santo, falo sobre as coisas que vejo no mundo espiritual e mensagens de Nossa Senhora, de alguns santos e anjos. Essa peculiaridade mística fez com que, com o passar do tempo, o número de participantes crescesse bastante, atraindo, inclusive, a curiosidade dos meios de comunicação.
Naturalmente, surgiram diversos questionamentos por parte dos fiéis, pois percebem que, nos momentos em que rezam o terço comigo, se inserem em uma atmosfera diferente de tudo que já experimentaram. Costumam me dizer que, ao sair dos nossos encontros, se sentem amados por Deus, com uma espécie de alívio no coração e na alma. É algo palpável, que podem sentir na pele.
Segundo os relatos, não se trata apenas de sensações físicas ou metafísicas: vários pedidos feitos nas reuniões são atendidos por Deus, relativos a curas, emprego, casamento, vida financeira, entre outros. Constantemente, sou bombardeado por perguntas: Como isso acontece? Por que é possível, naquele instante de fé, sentir uma paz, algo muito forte e envolvente? Seria viável que as pessoas, no dia a dia, tivessem acesso a tal força?
Os participantes começaram a reivindicar de mim uma fórmula para se atingir, nas mais diversas situações, esse estado de graça. Nos últimos anos, no Rio de Janeiro, em São Paulo, João Pessoa, Belém, Manaus e outras cidades onde conduzo encontros de oração do terço, tenho sido cobrado incisivamente a elaborar um livro que os auxilie no caminho espiritual.
Durante muito tempo, rejeitei essa tarefa. Havia colocado na cabeça que as pessoas poderiam encontrar por si mesmas caminhos para terem um canal com Deus, para lhe apresentar suas necessidades. Meu pensamento inicial era que as reuniões comandadas por mim iriam se somar às orações diárias de cada um e especialmente à Santa Missa e já seriam o suficiente para produzir um bom efeito nos corpos espirituais dos interessados. Todos teriam condições de enfrentar as batalhas diárias com vigor, pois estariam cultivando a semente da espiritualidade no coração de acordo com as próprias inspirações.
Além do mais, do meu ponto de vista, uma abordagem abrangente do mundo espiritual por meio de um livro levaria muito tempo para ser confeccionada e eu não gostaria de fazê-la de qualquer jeito. Uma obra como a que me pediam provavelmente seria volumosa demais, o que, tenho certeza, desencorajaria a maioria das pessoas a lerem. Essa, portanto, não me parecia ser a melhor solução.
Um dia, estava lendo um livro sobre o silêncio na oração e percebi que minha atitude não era positiva: não devia negar um texto sobre o ministério que exerço para o grande número de pessoas que, ao longo de tantos anos, vem acompanhando minha missão. Naquele momento mesmo, ao buscar auxílio para questões pessoais, me valia dos ensinamentos espirituais de alguém que tinha dedicado um bom tempo de sua vida para elaborar um escrito de qualidade.
Aliás, muitos têm por hábito, durante os momentos de dificuldade, se apoiar em bons livros. Autores como o monge do deserto Thomas Merton, o frade franciscano Raniero Cantalamessa, a madre Santa Teresa de Jesus e diversos outros foram fundamentais para confortar meu coração. Por que não fazer o mesmo por aqueles que me pediam ajuda?
Refletindo mais profundamente, concluí que, na verdade, não queria me expor mais do que já vinha fazendo no exercício do meu serviço espiritual. Havia, ainda, outro ponto importante: a falta de tempo para desenvolver um trabalho desses (escrever livros é uma tarefa que exige muito!).
Em 2008, fiz uma breve peregrinação com minha esposa ao santuário mariano de Fátima, em Portugal. Com o sol da manhã brilhando forte no belíssimo céu azul de primavera, iniciamos nossa oração em frente à capela da Cova da Iria, onde, a 13 de maio de 1917, Nossa Senhora do Rosário – hoje chamada pelo povo de Nossa Senhora de Fátima – apareceu a três crianças que pastoreavam um pequeno rebanho de ovelhas: Lúcia, Jacinta e Francisco. Apresentamos nossas intenções à Virgem Maria e partimos em direção ao bosque de Valinhos, em que a Mãe de Jesus fez uma de suas aparições. Lá, faríamos a Via-Sacra, meditando sobre a Paixão de Cristo.
Durante o trajeto de aproximadamente um quilômetro até o bosque, caminhávamos rezando os mistérios gozosos do rosário, que tratam da infância de Jesus. De repente, tive uma visão: Virgem Santíssima Maria apareceu acima de nossas cabeças vestindo azul-claro, cintilante como o sol. Fiquei surpreso por aquilo acontecer em uma estrada de terra batida, sem nenhum significado especial. Resolvi me calar e esperar para ver o que Ela queria comigo.
Direta e simples como sempre, Ela me disse que, após quinze anos de missão, estava na hora de eu escrever sobre as minhas experiências místicas, porque isso auxiliaria muitas pessoas que buscavam o caminho da espiritualidade. Dado o recado, desapareceu. Depois de alguns minutos, comentei o fato com minha mulher, que ficou muito preocupada.
– Nós já estamos tão expostos por causa de seus dons, não acho uma boa ideia você escrever sobre mística. Você vai chamar mais atenção e ser mais visado do que já é.
Entendendo muito bem o ponto de vista dela, acenei-lhe com a cabeça e garanti que pensaria com calma.
A discussão ficou adormecida até o ano seguinte, pois Nossa Senhora não me falou mais sobre relatar minhas visões. Eu, por outro lado, estava bastante desconfortável com a questão. No fundo, seria bem melhor permanecer no estágio em que me encontrava. Havia gente demais ao meu redor que me considerava um importante canal de comunicação com o mundo espiritual – algo que nunca fui nem serei!
Em 2009, minha avó materna quis dar um significativo presente de aniversário a mim e à minha esposa, já que comemoramos as datas com apenas três dias de diferença, e sugeriu uma viagem. Enquanto decidíamos aonde ir, frei Juan Antonio pediu que fôssemos encontrá-lo no santuário de Fátima. Ele é meu diretor espiritual, um frade agostiniano recoleto, espanhol naturalizado brasileiro (como gosta de dizer, paraense), e queria que fizéssemos juntos um retiro. Estava determinado nosso rumo.
Logo no primeiro dia, enquanto caminhávamos na mesma estrada de terra batida em direção ao bosque de Valinhos, para meditarmos a Via-Sacra, a Virgem Maria apareceu no céu diante de meus olhos, trajando amarelo e branco. Novamente, Ela insistiu no projeto dos livros.
Na hora, minhas feições devem ter se transformado, pois frei Juan Antonio percebeu algo de sobrenatural e me questionou:
– Qué pasa, hombre? O que estás vendo? É a Virgem?
Fiquei sem graça e respondi:
– Sim, frei, é Ela mesma.
– Mas deve estar querendo algo especial, porque sempre nos fala lá em cima, no bosque, diante de sua imagem… – provocou ele, curioso.
O lugar a que o frade se referia era o belo oratório do bosque que marca a aparição de Nossa Senhora do Rosário aos três pastorinhos em 19 de agosto de 1917. Como não queria lhe mencionar a questão dos livros, apenas sorri. Minha mulher me olhou profundamente, reprovando meu comportamento, à espera de que eu desse uma resposta clara ao sacerdote.
– Você não pode nos deixar no escuro. Se Deus nos mandou juntos aqui, para estarmos com Ele, precisa partilhar tudo o que se passa durante o nosso retiro – avisou frei Juan Antonio, com toda a razão.
Após mais alguns passos, resolvi contar:
– Ela quer que eu escreva a respeito das minhas experiências espirituais. Quer que eu fale sobre as coisas que tenho visto e ouvido, vindas do mundo espiritual.
– Vai ser excelente! – vibrou o frade, alegre. – Escreva sobre assuntos que possam edificar a vida das pessoas. Você respondeu “sim” ao chamado de Maria, não foi?
– Não, frei, não dei nenhuma resposta e Ela já se foi.
– Não pode ser assim, hombre! Que coisa! Ela tem nos dado tantos presentes, graças enormes em nossas vidas, e você tem a coragem de lhe recusar um pedido?
O frade estava visivelmente decepcionado. Minha mulher, silenciosa como de hábito, me olhava preocupada.
– Calma, hombre! Tenho bastante tempo para dar a resposta – retruquei. – Ela ainda vai aparecer lá no bosque, como sempre fez. Vou pensando até lá, tudo bem?
– Não! O chamado de Maria deve ser atendido no mesmo instante. Sempre! Mas vamos rezando para que Deus abra seu coração – disse o frade, contrariado.
Adentramos o bosque e, na terceira estação da Via-Sacra, meu anjo da guarda me apareceu segurando uma coleção de livros que brilhavam com uma luz verde, da mesma cor de sua túnica e de seus olhos e cabelos. Como todo ser angélico, ele tem um nome, mas não tenho permissão para mencioná-lo aqui. Assim, quando for citá-lo, nas próximas páginas, o chamarei de “I.”. Telepaticamente, ele me disse:
– Cumpra sua missão. Isto que trago nas mãos faz parte dela. Tenha confiança e escreva da forma que melhor lhe aprouver, desde que seja fiel àquilo que você experimenta através de seus dons.
Preferi não dar nenhuma resposta. Ao final da Via-Sacra, contudo, me veio uma luz: poderia começar escrevendo um livro de ficção, pois não chamaria tanta atenção, e as pessoas ficariam na dúvida se o que eu narrava seria real ou fruto da minha imaginação (artifícios para amarrar uma boa história).
Se o escrito tivesse boa aceitação, poderia pensar em elaborar outros livros, de não ficção, abordando de forma direta temas do mundo espiritual. Eu começaria devagar, expondo um pouco da minha história e experiência nesse âmbito.
Ao final do retiro, diante da insistência do frei Juan Antonio, resolvi dizer sim à Virgem Maria, ao meu anjo da guarda e, consequentemente, a todas as pessoas que compunham, nas diversas cidades, meu grupo de oração do terço.
Voltei ao Brasil e continuei conduzindo o encontro do terço. A questão dos livros permaneceu em minha mente, como uma pequenina semente. Por algum tempo, não coloquei a mão na massa.
No segundo semestre de 2010, na saída de uma das reuniões, deparei com uma senhora, N., que já frequentava o grupo havia muito tempo.
– Pedro, sempre que venho aqui rezar, sinto uma força envolvendo todo o meu corpo, uma energia intensa. Meu peito e meu rosto esquentam. Isso é normal?
Respondi que sim, pois, quando estamos reunidos, se forma sobre nossa cabeça uma grande luz dourada, muito densa, que se espalha por todo o teto e paredes da igreja e desce sobre as pessoas que lá se encontram. Nessas horas, a presença do Espírito Santo é bem palpável.
N. continuou:
– Pois é… Outro dia estava rezando o terço sozinha, em casa, e senti a mesma coisa. Fiquei muito emocionada, até chorei! O problema é que não sei como fazer acontecer de novo. Gostaria muito que isso se repetisse, porque, na hora em que passo pela experiência com aquela força, sei que Deus está comigo. Preciso ter essa sensação outras vezes, me diga como!
Não tinha uma resposta satisfatória para dar àquela senhora. Expliquei que uma oração profunda dá um enorme trabalho e não poderia ser detalhada em poucos minutos, no pátio de uma igreja. N., então, sugeriu:
– Pedro, siga o exemplo dos que acumularam conhecimento sobre algum assunto espiritual e procuraram transmiti-lo aos outros. Compartilhe o que você sabe através de livros. Assim, muitas pessoas poderão ter acesso às suas explicações. Isso não seria bom? Deus não ficaria satisfeito com você?
Aquele discurso me despertou para o fato de que eu estava descumprindo o que tinha prometido à Maria Santíssima, a I. e ao frei Juan Antonio. Eu podia até ouvir a voz de barítono do frade: “E os livros? Já escreveu alguma coisa? Quero ler!”
Além disso, havia um fato curioso e triste que reforçava a ideia de um texto para levar as pessoas a uma vida de intimidade com Deus: muita gente que frequentava as reuniões só se dedicava à oração uma vez por mês, exatamente no dia do grupo do terço! Eles alegavam que era ali, na perceptível presença do Altíssimo, que se sentiam acolhidos e tinham segurança para entregar a Deus seus pedidos. Diante desse argumento, eu precisava tomar uma atitude.
Queria vê-los com a mesma confiança manifestada durante os encontros comigo. Desejava que, no dia a dia, eles pudessem sentir a presença e o amor do Criador. Um livro poderia servir de mola propulsora.
Levei em consideração também a situação dos que moram longe dos locais onde me reúno ou não têm como se locomover até eles. Através de meu perfil do Facebook, costumam me cobrar auxílio espiritual para os mais diversos casos, buscando formas de enfrentar seus problemas.
Em 2011, resolvi dar um basta na inércia e publiquei meu primeiro livro, mantendo firme a ideia de que fosse um romance. Como a aceitação foi boa, em dezembro de 2012 lancei outro de ficção. Então, começou a acontecer algo interessante: grande parte dos meus leitores, durante as tardes ou noites de autógrafos, passou a me cobrar uma obra sobre a minha vida, a prática da oração pessoal e, principalmente, os anjos!
Depois de refletir muito, cheguei à conclusão de que era hora de atender aos meus leitores por meio de um escrito simples, com a minha história e algumas experiências minhas e de outras pessoas no caminho da espiritualidade. Pensei ser importante também acrescentar algumas palavras sobre minha relação com a oração. Assim, configurou-se este livro.
Em meio a uma sessão de autógrafos em São Paulo, fui abordado por uma senhora engajada na Renovação Carismática Católica havia mais de quinze anos. Muito gentil, presenteou-me com um livro sobre a vida de uma beata mística e falou:
– Pedro, nós carismáticos, que temos uma caminhada longa e certa intimidade com os dons do Espírito Santo, gostaríamos que você dedicasse um livro aos temas místicos. Gostaríamos de algo que pudesse enriquecer nossa experiência.
Revelei a ela que já pensava nisso havia algum tempo e que buscava apresentar um texto que englobasse os interesses tanto dos neófitos no caminho espiritual quanto dos doutores no assunto. Apesar da dificuldade da empreitada, prometi me esforçar pela causa. Talvez este livro consiga cumprir esse papel – sem grandes pretensões, é claro! –, fornecendo subsídios para os que há tantos anos dialogam com o Pai Celestial.
Quanto aos que estão afastados de Deus, pode ser que esta leitura lhes traga algo de positivo. Terão em mãos um breve guia, que traz alguns princípios místicos, para refletirem sobre os mais diversos assuntos do cotidiano. Quem sabe esta obra poderá lhes dar um novo ânimo, para que iniciem um exercício espiritual.
Para ilustrar os princípios sobre os quais discorro, conto com exemplos verídicos, retirados da minha vida e da vida de pessoas com quem convivi nesses vinte anos do grupo do terço. A única providência que tomei foi não divulgar seus nomes, pois não acho de bom-tom expor a privacidade delas. Procurei citar, ainda, passagens bíblicas, para dar embasamento à teoria.
Procurei impor uma redação ágil ao texto, não permitindo que ficasse muito extenso, pois sei que muitas pessoas não gostam de se embrenhar em livros grossos. O resultado é uma obra de leitura rápida, para ser aberta em qualquer lugar ou ocasião. Suas páginas não tomam tempo demais e, assim, creio que possam incentivar uma vida de oração diária.
Este livro foi concebido para todos, independentemente de crença, raça, sexo ou idade. Minha intenção inicial é a de que as pessoas se aproximem cada vez mais de Deus. Sejam amigas de Deus! Que nosso Criador abençoe aqueles que colocarem em prática o conteúdo das páginas que se seguem com amor, perseverança, fé e gratidão!
Que as palavras do apóstolo de Cristo São Tiago em sua carta (capítulo 1, versículo 22) sirvam de guia para os leitores: “Sejam praticantes da Palavra, e não apenas ouvintes, iludindo a si mesmos.”