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“O investidor de bom senso”, por Gustavo Cerbasi
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“O investidor de bom senso”, por Gustavo Cerbasi

A vida seria mais fácil se, para tomar nossas decisões acerca de qualquer assunto, levássemos em conta tanto o aprendizado acumulado por gerações passadas quanto as lições aprendidas pela nossa sociedade atual. Aprender com nossos erros e com os erros e acertos dos outros é uma forma de evitar perdas. Evitar o que já trouxe […]

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A vida seria mais fácil se, para tomar nossas decisões acerca de qualquer assunto, levássemos em conta tanto o aprendizado acumulado por gerações passadas quanto as lições aprendidas pela nossa sociedade atual. Aprender com nossos erros e com os erros e acertos dos outros é uma forma de evitar perdas. Evitar o que já trouxe perdas ou causou danos a outras pessoas ou à sociedade é o que podemos chamar de bom senso.

Essa reflexão elementar expõe uma dificuldade fundamental do investidor brasileiro. Um país que pouco investe em educação perde boa parte das lições aprendidas por outras gerações. Além disso, como a educação de qualidade é para poucos, as informações sobre oportunidades circulam entre um número limitado de pessoas e o acesso a essas oportunidades se torna elitizado.

Para desenvolver o bom senso, é preciso contar com boas informações. Desde o início de minha carreira de investidor, por volta do ano 2000, ano após ano procurei beber da água de que bebem investidores de mercados mais maduros. Minha especialização em Finanças Empresariais foi na Universidade de Nova York, com várias visitas técnicas à Bolsa de Valores de Nova York e à Bolsa Mercantil de Chicago, e desde então procuro participar de eventos voltados a investidores americanos.

Diria o bom senso que, para investir bem no Brasil, eu deveria estudar o mercado e o investidor brasileiros. Mas, sendo o mercado brasileiro imaturo – e era ainda mais no início dos anos 2000 – e sendo o mercado americano farto em estatísticas, informações e debates, procurei sempre entender o que e como era feito por lá. Minha percepção é que mercados de investimentos mais maduros nos mostram os caminhos que o mercado brasileiro percorrerá para chegar lá.

Nos últimos vinte anos, também devorei muita literatura voltada ao mercado americano, mesmo não investindo lá. Autores como Benjamin Graham, Aswath Damodaran, Joel Greenblatt, Max Gunther, Alexander Elder e o próprio John Bogle povoaram minha escrivaninha durante todo esse tempo. Eu já tinha lido O investidor de bom senso, e comemorei muito quando soube que a Editora Sextante publicaria o título no Brasil.

Bogle se baseia minuciosamente em dados estudados acumulados durante cerca de um século para desenvolver sua visão de bom senso nos investimentos. Com argumentos lógicos fundamentados na matemática e em muita estatística, ele lapida sua teoria pautado na ideia de que o investimento de sucesso deve ser simples e eficiente. Bogle põe em xeque o trabalho e as estratégias ativas de gestores de fundos e assessores de investimentos, questionando o impacto desse trabalho e de seu custo nos resultados que os investidores terão ao longo da vida. Ele destaca também que estratégias ativas implicam realização mais frequente de lucros, o que resultaria em maior pagamento de impostos e em mais ineficiência.

Há uma importante ressalva a fazer: John Bogle atua na gestão de fundos de índices (conhecidos como ETFs) e, como não deveria deixar de ser, traça todos os seus argumentos de maneira a demonstrar as vantagens de investir na renda variável passivamente e com baixo custo – dado que, via de regra, as taxas de administração de fundos de índices são bem menores do que as taxas de fundos de gestão ativa. Os números falam por si. Os argumentos do autor são consistentes. Sua orientação é perfeitamente alinhada com a de Warren Buffett, o maior investidor do mundo e um dos maiores defensores do investimento passivo em índices.

Mas há ainda outra ressalva muito importante a ser feita. Quando Bogle, Buffett e outros defensores de fundos de índices enfatizam que esse é um meio de acessar o valor médio das empresas de mercado a baixo custo, eles pressupõem que um índice como o S&P 500 e o Ibovespa efetivamente representam o valor das maiores (ou mais sólidas) empresas do mercado. Isso pode ser verdade nos Estados Unidos, onde o número de investidores na bolsa é de dezenas de milhões, portanto o maior volume de negociações acontece, há décadas, com ações de empresas que gozam de maior solidez e previsibilidade para os investidores.

No Brasil, uma economia de maior grau de risco, muitas empresas fazem parte do Ibovespa em razão de seu maior potencial especulativo e não de sua consistência em gerar resultados. Quem não se lembra da euforia na bolsa brasileira em 2013, quando a petrolífera OGX, de Eike Batista, e outras empresas do grupo faziam parte do índice e o empurraram para cima? OGX, MMX, LLX e EBX encontravam-se em fase de abertura de capital e não tinham qualquer histórico financeiro. Apesar disso, não só faziam parte do Ibovespa como foram responsáveis pelas maiores altas da época. Essas empresas foram para o limbo, comprometendo as reservas dos investidores e também o Ibovespa por um longo período.

Os ETFs, ou fundos de índices ligados ao Ibovespa, representam o mercado brasileiro. Mas o mercado brasileiro não é caracterizado apenas por boas empresas com excelentes gestores: abrange também muitos negócios especulativos, com risco político e viés de corrupção. Por isso, em nosso país, o stock picking, ou gestão ativa de carteiras, deve, ainda durante um bom tempo, prometer maior sucesso, mesmo que isso implique custos maiores do que a gestão passiva.

No entanto, o que torna a obra de Bogle de um valor inestimável para o investidor brasileiro é sua capacidade de mostrar para onde estamos rumando. Ela nos permite enxergar adiante, o que é uma vantagem e tanto na competição do mundo dos investimentos.

Apesar de o mercado brasileiro ainda ser bastante especulativo e sofrer com a fuga de capitais em períodos de maior crise, o número de investidores individuais tem crescido consistentemente ao longo das últimas duas décadas. Com esse crescimento, multiplicaram-se também as formas de investir, os serviços de orientação, a educação e o preparo do investidor. Se ainda carecemos de educação de alto nível para todos, hoje a internet compensa parte dessa falta, permitindo, em grande medida, compartilhar o bom conhecimento e a boa informação com qualquer pessoa que tenha conectividade. A boa informação deixou de se restringir a uma elite de formação privilegiada.

E cabe destacar: cresceu muito o número de fundos de índices também. Hoje, é possível investir em diferentes tipos de índices. Além do Ibovespa, há fundos de índices de renda fixa, de fundos imobiliários e de ações de empresas de mercados específicos como bancos, varejo, energia, sustentabilidade – todos eles com as características de fundos de índices: representam fielmente seus mercados e permitem manter uma carteira diversificada a custos baixos e eficiente no longo prazo.

Para o investidor ativo, que efetivamente atua nos mercados, O investidor de bom senso é um convite a vencer mantendo a simplicidade. Para aqueles que não querem ou não conseguem se envolver com o mercado financeiro intensa ou frequentemente, o livro traz clareza sobre como investir em renda variável de maneira eficiente sem desperdiçar a força do mercado financeiro.

É um livro que entra para a minha prateleira de leituras obrigatórias. Recomendo que entre também para a sua.

Bons investimentos!
Gustavo Cerbasi

Conheça os livros de Gustavo Cerbasi:

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Pais inteligentes enriquecem seus filhos
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Dinheiro: os segredos de quem tem
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