INTRODUÇÃO
Seja bem-vindo a este livro, que foi pensado e escrito para você que está buscando soluções para ficar em paz com a comida e com o seu corpo passando longe das dietas restritivas. Vou apresentar o melhor caminho, baseado em evidências científicas, para ter um estilo de vida com saúde e bem-estar, um peso saudável e sustentável e, com isso, também ganhar longevidade.
Se você acha que “fechar a boca e malhar” é a fórmula mais eficiente para ter saúde e emagrecer, estou aqui para convencê-lo a rever esse conceito. Sei que ouvimos e lemos isso em toda parte quando se trata de estratégias para ser mais “saudável”, mas quero mostrar que existe outro caminho, que não passa pelas ideias de viver controlando tudo que se come, deixar de consumir coisas gostosas ou ficar horas na academia.
Mas, afinal, quem sou eu para poder falar assim contra dieta? Sou uma nutricionista franco-brasileira, com doutorado pelo Departamento de Endocrinologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) com foco em obesidade e genética. Sou especializada em tratamento de transtornos alimentares e pesquisadora em neurociência do comportamento alimentar. Atualmente sou coordenadora do projeto de genética do Ambulatório do Programa de Transtornos Alimentares (Ambulim) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (IPq- -HC-FMUSP). Sou também engenheira agrônoma formada em Paris, na França. E, antes de tudo, sou mãe de quatro filhos adultos e avó de uma netinha incrível.
Estudei bastante antes de começar a falar sobre as coisas que defendo e de me tornar uma ativista contra dietas, especialmente entre crianças. Tudo que falo aqui é embasado na ciência. Sou nutricionista com ciência e consciência.
No meu primeiro livro, O peso das dietas, lançado em 2014 (ele teve uma segunda edição, revista e atualizada, em 2018), expliquei por que oriento as pessoas a pararem de fazer dieta restritiva para emagrecer: porque simplesmente não é algo saudável nem sustentável e pode piorar sua saúde, sua relação com a comida e até fazer ganhar mais peso a longo prazo. Queria ajudar o máximo de pessoas possível a entender que é normal fracassar na dieta e voltar a engordar depois de ter perdido peso de maneira rápida e com restrições.
Os estudos mostram que fazer dieta não funciona em 95% dos casos; não é culpa sua! Não se trata de falta de disciplina ou de força de vontade. Nosso cérebro odeia restrição e faz de tudo para você fracassar na dieta e voltar a comer.
Dietas restritivas podem até dar resultado a curto prazo, mas hoje está claro que, a longo prazo, levam a um risco maior de engordar, além de prejudicarem a saúde e abrirem caminho para uma relação conturbada com a comida e até transtornos alimentares.
Quando lancei O peso das dietas, estava insegura em relação a como ele seria recebido pelos leitores. Afinal, é um livro que vai contra muito do que estamos acostumados a escutar e do que aprendi na faculdade, tanto na França quanto no Brasil. Imagine minha surpresa e felicidade quando descobri que o livro estava fazendo grande sucesso não somente entre o público leigo, mas também com os profissionais de saúde. Ele acabou se tornando um best-seller!
Hoje está claro que precisamos parar de reduzir o peso a um simples cálculo de calorias e de condicionar nossa saúde ao emagrecimento e ao lema “foco, força e fé”, como se propaga em tantos lugares, dos consultórios às redes sociais e capas de revistas. O caminho da saúde vai muito além disso. É preciso, primeiro, fazer as pazes com o peso, o corpo e a comida.
De tanto estudar (são mais de 25 anos!), cheguei a três dicas simples que resumem tudo que aprendi ao longo do tempo investigando esse assunto:
1. Diga não às dietas.
2. Coma comida fresca e caseira.
3. Cozinhe!
Como assim, tão simples? Sim! Mas simples não quer dizer fácil.
Ao mesmo tempo que tinha o objetivo de desestimular as pessoas a fazerem dieta, eu pensava: mas, se não é para fazer dieta, vou dizer o que aos meus leitores, que confiam em mim e nos meus conhecimentos para mudar hábitos alimentares e emagrecer?
Foi com isso em mente que desenvolvi, no meu primeiro livro, sete pontos importantes a serem avaliados quando o objetivo é conquistar uma saúde mais harmoniosa, melhorar os hábitos e pensamentos ligados à alimentação e assim chegar, por consequência, a um peso saudável e sustentável.
Chamei esses sete pontos de “Os Segredos da Sophie”. Fiz isso não somente por causa do meu nome, mas porque sophie (do francês) significa “sabedoria” em grego. Assim, os segredos da Sophie são os segredos da sabedoria do corpo e da saúde. São fatores comprovados e fundamentais para uma vida saudável e em paz com a comida e o corpo.
Os sete segredos são os seguintes:
Segredo 1: Faça as pazes com o seu corpo
Segredo 2: Cuide do seu cérebro; ele controla tudo
Segredo 3: Pense sustentável; não tenha pressa
Segredo 4: Respeite sua fome e viva no presente
Segredo 5: Coma melhor, não menos! Faça as pazes com os alimentos
Segredo 6: Alimente-se de outras energias
Segredo 7: Cozinhe e celebre a comida
Desde que O peso das dietas foi lançado, recebo muitas mensagens que mostram que essas orientações vêm ajudando muito as pessoas, tanto aquelas que estão sozinhas na tentativa de perder peso quanto nutricionistas, médicos, psicólogos e outros profissionais de saúde que recebem no consultório pacientes em busca de ajuda para deixarem de brigar com a balança. Se você não leu meu primeiro livro, onde explico em detalhes esses sete segredos, vou falar deles nos próximos capítulos, fique tranquilo.
O equilíbrio do corpo envolve mais fatores do que somente o que a pessoa come e quantas calorias gasta. É uma questão de fazer as pazes com a comida e o corpo e de mudar hábitos alimentares.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o maior problema de saúde atualmente são as doenças crônicas, como as cardiovasculares e respiratórias, diabetes, hipertensão e câncer. Doenças crônicas são aquelas que se instalam lentamente ao longo dos anos. São, na maioria das vezes, evitáveis, mas difíceis de tratar.
As doenças crônicas são um problema mundial, não só do Brasil, embora por aqui elas avancem em velocidade maior do que em outros lugares e sejam responsáveis por mais de 70% do total de mortes ocorridas no país, segundo a OMS. Todas essas doenças têm em comum vários fatores de risco, como tabagismo, consumo excessivo de álcool, pressão alta e também sobrepeso e obesidade. O mundo inteiro está vendo os índices de obesidade crescerem, e nenhum país conseguiu diminuí-los nos últimos 35 anos.
Até hoje não existe tratamento para resolver o problema das doenças crônicas e do excesso de peso. Todos os medicamentos, dietas e cirurgias apontados como solução para esses casos têm riscos e efeitos colaterais. Isso deixa os profissionais de saúde um tanto perdidos. Afinal, por décadas eles aprenderam a curar doenças com remédios, o que funcionou muito bem para quase erradicar doenças bacterianas como a tuberculose, por exemplo.
Em 2020 começou a pandemia de Covid-19, causada pelo novo coronavírus, que se mostrou inédita e avassaladora. Ela desafiou toda a cadeia de saúde e criou uma crise sanitária enorme, que certamente será sentida pelos próximos anos.
Para lutar contra as doenças crônicas, não existem remédios nem vacinas. O que fazer, então, se não há comprimido ou terapia que possa resolvê-las? O que prevalece na ciência – algo com que todo mundo está de acordo atualmente – é que, em saúde, a prevenção é o melhor remédio. Mas como prevenir doenças crônicas?
O consenso na saúde hoje é que o melhor que podemos fazer para diminuir o risco de desenvolver doenças crônicas é seguir um estilo de vida saudável, trocando hábitos nocivos por outros mais saudáveis. Ou seja, a solução está dentro de cada pessoa, e não há uma receita ou fórmula que funcione para todo mundo.
É aí que está o grande desafio. Mudar hábitos é a solução para adotar um estilo de vida mais saudável. Mas não é algo que se possa prescrever em uma receita médica e mandar o paciente seguir. Mudar hábitos é algo bem mais complexo do que apenas tomar remédio ou controlar o peso na balança e perder centímetros na cintura. Infelizmente, muita gente ainda acredita que essa receita funciona porque nossa sociedade e nosso sistema de saúde se acostumaram a focar no número de quilos que a balança mostra para determinar se a pessoa está saudável ou não.
Para piorar, confunde-se saúde com magreza e magreza com beleza. Essa mentalidade gordofóbica está na origem do desenvolvimento de uma sociedade cheia de neuras frente ao ato de comer, o que leva cada vez mais ao comer transtornado, isto é, comportamentos alimentares que não são saudáveis mas não preenchem os critérios para diagnosticar um transtorno alimentar específico, como anorexia ou bulimia. Pular refeições, restringir grupos de alimentos, ter episódios de exagero ou compulsão, geralmente acompanhados de emoções negativas relacionadas à comida, como medo, culpa, vergonha e ansiedade, por exemplo, fazem parte do comer transtornado. Pode-se dizer que é o meio do caminho entre o comer normal e o transtorno alimentar.
Enquanto todo mundo se preocupa com o aumento da obesidade, uma outra epidemia silenciosa vem se alastrando pelo Brasil e pelo mundo, afetando principalmente os jovens: a epidemia dos transtornos alimentares.
Você pode me perguntar: então basta mudar hábitos para ter uma vida mais saudável? É simples assim?
Minha resposta é: sim, só temos que melhorar nossos hábitos. Mas vou repetir: simples não quer dizer fácil!
Para transformar seu estilo de vida é preciso, primeiro, entender por que você se comporta de determinadas formas, tanto em relação à comida quanto em outras áreas da vida, e então buscar hábitos mais saudáveis. Depois é importante compreender que uma mudança duradoura precisa começar dentro de você, ou seja, a decisão precisa ser sua, e não de qualquer outra pessoa. Não adianta o médico, a nutricionista ou o livro dizerem o que precisa ser feito.
Pare de terceirizar a sua saúde e volte a ser seu próprio dono. Você é seu melhor especialista.
É muito importante que você comece a se convencer disso.
Essa é uma transformação que acontece aos poucos, buscando progresso, e não perfeição. Afinal, ninguém acorda um dia pronto para colocar em prática um estilo de vida totalmente diferente.
Não é preciso buscar nenhum conhecimento complexo, mas sim desenvolver habilidades para mudar, incluindo novos e melhores hábitos de vida.
A maioria dos pacientes que chega ao consultório já sabe muito sobre nutrição e saúde. Sabe que deve comer mais legumes, menos açúcar, diminuir a quantidade de refrigerante, fazer exercício, etc. O problema é que eles geralmente chegam com muitas crenças limitantes e erradas sobre o que, quando e quanto comer, e têm dificuldade para colocar esses hábitos em prática. Julgam-se e se culpam por acharem que não têm força de vontade. Com isso, acabam levando uma vida de sofrimento frente ao comer.
Estou aqui para dizer que mudar é possível, mesmo não sendo fácil. Nenhum processo de mudança é tranquilo.
O primeiro passo é querer mudar – se você está lendo este livro é porque provavelmente já deu esse passo! Depois é importante ter paciência e calma, ir definindo metas possíveis para você e comemorando cada conquista.
Para transformar a sua relação com a comida, é mais eficiente ir devagar, respeitando seu tempo e seus limites, do que colocar na cabeça que a partir de amanhã só vai comer alimentos saudáveis – o que é insustentável e tende a não durar mais do que alguns dias, além de gerar uma porção de sentimentos negativos e culpa por sentir-se fracassado. Já viu esse filme antes?
Qualquer transformação consistente só pode acontecer quando fizer sentido para você. Mudanças gradativas levam a um novo estilo de vida. No percurso você ganha autonomia e autoconfiança.
Com este livro quero ajudar você a se empoderar, se reconectar e se apropriar das suas escolhas, parando de agir de forma automatizada e movida por modismos. Assim você terá sucesso na sua transformação e conseguirá chegar à sua melhor versão, retomando o leme do seu barco.
Saúde é autonomia e sabedoria interior.
Nesta jornada vamos conhecer a Roda dos 7 Pilares da Saúde Alimentar, uma ferramenta de autoconhecimento, autoavaliação e autogestão das mudanças no comportamento alimentar que uso com pacientes no consultório. É uma das melhores ferramentas do meu curso Método Sophie, que ofereço a profissionais.
Essa Roda é uma adaptação da Roda da Vida, um recurso bastante utilizado no universo do coaching, para trabalhar meus sete segredos para a saúde alimentar. Ela foi elaborada em 2016, quando idealizei o meu primeiro curso para profissionais de saúde, junto com as queridas Audrey Deram (minha filha) e Roselake Leiros, que são coach e master coach em PNL (programação neurolinguística), respectivamente.
Durante meus estudos e atendimentos, tanto no hospital quanto no consultório, percebi que um profissional de saúde capacitado com recursos e técnicas de coaching consegue praticar um atendimento melhor do que um que não os tenha, ou mesmo do que um coach que não possua formação em saúde (como tantos que existem por aí). Existe até pesquisa científica comprovando isso, publicada no periódico Obesity em 2013.
A Roda dos 7 Pilares da Saúde Alimentar é resultado dos meus mais de 25 anos de estudos em ciência da nutrição, nutrigenômica e neurociência do comportamento alimentar. Ela é um desenvolvimento mais abrangente e mais prático dos meus Sete Segredos, inclusive com subpilares que ajudam a visualizar os passos a seguir. O objetivo de trabalhar com ela no processo de mudança de hábitos é identificar aspectos da vida que podem estar afetando sua saúde, impedindo que você tenha uma relação saudável com a comida, o seu peso e o seu corpo. Além disso, a Roda vai ajudar você a parar de focar somente no peso e no “fechar a boca e malhar”, que é o que acaba prejudicando muita gente em processo de mudança. Saúde é muito mais do que isso.
Ao longo dos anos, percebi que a Roda dos 7 Pilares da Saúde Alimentar é um recurso capaz de estimular as pessoas a tomarem as rédeas da própria sabedoria corporal na direção de ter mais saúde e bem-estar, em vez de confiá-la a um terceiro, ainda que seja um profissional de saúde.
Este livro é um aliado em sua jornada de descoberta de uma vida mais saudável. A ideia é que ajude você a navegar seu barco pelo mar da sua vida, guiando-o na direção de escolhas melhores, vencendo as “tempestades” da preocupação com peso, das dietas, do comer transtornado e do prejuízo à saúde.
Ninguém conhece e domina seu barco melhor do que você. Você só precisa voltar a ter autonomia e sabedoria para navegá-lo.
No Capítulo 3 vou orientar em detalhes como completar a Roda dos 7 Pilares e usar os resultados para guiar as mudanças de hábito que você julgar necessárias. Por enquanto, vale saber que o momento de preenchê-la é uma oportunidade de autoconhecimento, empoderamento e conexão consigo mesmo; de entrar em contato com comportamentos muitas vezes inconscientes, mas que podem ter um peso grande no seu estado geral de bem-estar e na sua relação com a comida. Seu peso será consequência disso.
Neste livro reuni também dicas, reflexões e atividades práticas para ajudar você na sua jornada individual. De sugestões de organização para facilitar a vida na cozinha até meditações rápidas para se acalmar em momentos de ansiedade, quis oferecer informações e ideias simples que funcionem como aliadas para você se conscientizar e melhorar o comportamento alimentar. Tenho certeza de que você vai se surpreender e aproveitar muita coisa na sua caminhada.
Lembre-se: ninguém sabe melhor do que você o que está sentindo agora e de que seu corpo precisa. É importante continuar seguindo as indicações do seu profissional de saúde, caso esteja em tratamento, e entender que este é um livro não para você se tratar, mas para ajudá-lo a mudar seu estilo de vida e sua relação com a comida e o corpo.
Como qualquer transformação que valha a pena, esta que você está prestes a iniciar pode ocorrer aos poucos, sem pressa. Só assim ela vai durar para sempre. Isso vai lhe dar a oportunidade de perceber a si mesmo em cada etapa da sua jornada para ressignificar sua relação com a comida, o corpo e sua saúde.
Por fim, querido leitor, querida leitora, gostaria de dar um último conselho antes que você mergulhe para valer neste livro: esqueça tudo que você acredita que sabe sobre nutrição e adote uma mentalidade nova sobre o assunto a partir de agora.
Desejo uma boa leitura, boa prática, uma transformação satisfatória e, é claro, um bon appétit!