Introdução
Eu estava no meu consultório, sentada diante de uma jovem. Ela parecia relaxada na poltrona, com os braços se movendo levemente ao falar comigo. Era uma transformação, comparada à tensão e ao nervosismo que eu vira em sua primeira sessão de terapia. Tivéramos apenas uma dúzia de encontros. Ela me olhou nos olhos, sorridente, balançou a cabeça e disse: “Que saber? Sei que vai ser difícil, mas sinto que vou conseguir.”
Meus olhos arderam e engoli em seco. Um sorriso espalhou-se por todos os músculos do meu rosto. Assim como eu, ela havia sentido a mudança. Algum tempo antes, ela entrara no meu consultório com medo do mundo e de tudo o que tinha de enfrentar. Uma insegurança generalizada a levava a sentir pavor de cada novo desafio. Agora, no entanto, estava com a cabeça um pouco mais erguida. Não por minha causa. Não tenho a capacidade mágica de curar ninguém nem de mudar a vida dos outros. Ela não havia precisado de anos de terapia que investigassem sua infância. Nessa situação, como em muitas outras, meu papel foi basicamente o de uma educadora. Transmiti lições sobre o que diz a ciência e o que funcionou com outras pessoas. Quando ela compreendeu e começou a usar os conceitos e habilidades que ensinei, iniciou-se a transformação. Ela sentiu esperança em relação ao futuro. Passou a acreditar na sua força e a lidar com situações difíceis de um jeito novo e saudável. E, cada vez que o fazia, a confiança na sua capacidade de enfrentar os desafios aumentava um pouco mais. Ao revisitar tudo o que precisava lembrar para enfrentar a semana seguinte, ela meneou a cabeça, olhou para mim e perguntou: “Por que ninguém me disse isso antes?”
Essas palavras ficaram ecoando na minha cabeça. Ela não foi a primeira nem a última pessoa a me dizer isso. O mesmo cenário se repetira inúmeras vezes. Indivíduos chegavam à terapia certos de que suas emoções intensas e dolorosas eram provenientes de uma falha no seu cérebro ou na sua personalidade. Não acreditavam ter qualquer poder de influenciá-las. Embora a terapia mais profunda e prolongada seja apropriada para muitas pessoas, algumas precisavam simplesmente conhecer um pouco o funcionamento da sua mente e do seu corpo para saber como lidar no dia a dia com a sua saúde mental.
Eu sabia que a catalisadora desse processo não era eu, e sim o conhecimento a que elas estavam sendo apresentadas. Mas as pessoas não deveriam ter que pagar para consultar alguém capaz de conduzi-las nessa jornada; bastaria ter acesso às informações certas sobre o funcionamento da mente. Claro, esses ensinamentos estão por aí. No entanto, no mar de desinformações, é preciso saber o que se está procurando.
Comecei a alugar o ouvido do meu pobre marido, falando sobre como as coisas deveriam ser diferentes. “Tudo bem, vá em frente”, disse ele. “Faça uns vídeos para o YouTube, ou algo do gênero.”
E foi o que fizemos. Juntos, começamos a postar vídeos sobre saúde mental. Como se constatou, eu não era a única interessada nesse tema. Quando dei por mim, estava fazendo vídeos quase diários para milhões de seguidores nas redes sociais. Mas as plataformas que alcançavam o maior número de pessoas pareciam ser as de vídeos curtos. Assim, criei uma grande coleção de vídeos com até 60 segundos para transmitir minhas ideias.
Embora eu tenha conseguido captar a atenção das pessoas, compartilhar algumas descobertas e fazê-las falar sobre saúde mental, ainda queria dar um passo adiante. Quando se faz um vídeo de 60 segundos, inúmeras coisas ficam de fora. Há muitos detalhes que se perdem. Portanto, aqui estão eles. Todos os detalhes e explicações que eu usaria para transmitir esses conceitos em uma sessão de terapia, bem como dicas simples sobre como usá-los, passo a passo.
As orientações deste livro são ensinadas sobretudo na terapia, mas não são habilidades terapêuticas. São habilidades de vida. São ferramentas que podem ajudar cada um de nós a atravessar tempos difíceis e a desabrochar. Vou esmiuçar o que aprendi como psicóloga e reunir a sabedoria, o conhecimento e as técnicas práticas com que me deparei e que transformaram a minha vida e a das pessoas com quem trabalhei. Aqui é o lugar para esclarecer sua experiência emocional e ter uma ideia clara do que fazer com ela.
Ao compreendermos como funciona a nossa mente e descobrirmos como lidar com as emoções de maneira saudável, não apenas desenvolveremos resiliência, como poderemos evoluir e, com o tempo, experimentar uma sensação de crescimento.
Muitas pessoas esperam sair de sua primeira sessão de terapia já com algum tipo de estratégia que possam usar para atenuar seu sofrimento. Por essa razão, este livro não pretende mergulhar na sua infância a fim de descobrir como e por que você começou a ter dificuldades. Há outros livros excelentes que se dedicam a isso. Na terapia, no entanto, para trabalharmos na cura de traumas passados, devemos dispor de ferramentas para construir a capacidade de recuperação e de tolerar em segurança as emoções aflitivas. Esse poder reside na compreensão das muitas maneiras pelas quais você pode influenciar aquilo que sente e alimentar uma boa saúde mental.
Este livro serve exatamente para isso.
Não se trata de uma terapia, do mesmo modo que um livro sobre como promover a saúde física não é medicina. Trata-se de uma caixa de ferramentas, recheada de técnicas diferentes para serem usadas em diferentes situações. Você não precisa dominar todas ao mesmo tempo. Então escolha aquelas que se encaixem nos desafios que você está enfrentando no momento e procure aplicá-las na sua rotina. Toda habilidade requer tempo para se tornar eficaz, portanto experimente e pratique algumas vezes antes de descartar qualquer uma delas. Não se pode construir uma casa só com um martelo. Cada tarefa requer algo ligeiramente diferente. E, por mais que você adquira habilidade no uso dessas ferramentas, alguns desafios são simplesmente mais difíceis do que outros.
Cuidar da saúde mental não é muito diferente de aprimorar a saúde física. Se você pusesse a saúde geral numa escala numérica em que o zero fosse um estado neutro – nem bom nem ruim –, um número abaixo de zero indicaria um problema, e qualquer número acima de zero indicaria boa saúde. Nas últimas décadas virou moda cuidar do corpo com alimentação e exercício, porém só mais recentemente tornou-se aceitável trabalhar de maneira objetiva para proteger a saúde mental. Isso significa que você não precisa esperar pelas dificuldades para usar este livro, porque desenvolver a resiliência e uma boa disposição mental é algo benéfico, mesmo que no momento você não esteja sofrendo.
Ao proporcionar ao corpo uma alimentação adequada e uma rotina de exercícios que geram energia e força, você o torna mais apto a combater infecções e a se curar quando adoece. O mesmo acontece com a mente. Quanto mais trabalhamos na construção da autoconsciência e da resiliência enquanto tudo vai bem, mais aptos nos tornamos para enfrentar os desafios da vida quando eles se apresentam.
Se você escolher uma ferramenta e aplicá-la nos momentos difíceis, não pare quando tudo começar a melhorar. Mesmo quando você se sente bem, essas habilidades são necessárias para nutrir a mente. É como pagar uma prestação da casa própria, em vez de um aluguel. Você está investindo na sua saúde futura.
Escrevi este livro baseada em pesquisas, mas não me apoiei apenas nisso. Sei que essas orientações são úteis porque também pude constatar sua eficácia na prática, na vida de pessoas reais, seguidas vezes. A esperança existe. Com as informações certas e um pouco de autoconsciência, é possível extrair força da adversidade.
Quando alguém escreve um livro de autoajuda, muita gente fica com a impressão de que essa pessoa é plenamente resolvida e não tem problemas. Tenho visto vários autores desse tipo perpetuarem tal ideia. Muitos parecem querer mostrar que os desafios da vida não lhes deixam marcas nem cicatrizes. Sugerem que seus livros contêm as respostas – todas as respostas de que alguém possa precisar na vida, para sempre. Deixe-me desmistificar isso agora mesmo.
Como psicóloga, li muitas pesquisas a respeito desse assunto e fui treinada para orientar pessoas em sua busca por mudanças positivas. Mas também sou humana e, portanto, sujeita a vulnerabilidades. As ferramentas que apresento aqui não impedem que a vida lance desafios sobre nós, mas nos ajudam a encontrar o rumo, a desviar quando necessário, a cair e levantar de novo. Não impedem que nos percamos, mas nos fazem perceber que nos perdemos – e nos prepara para retornar corajosamente a uma vida plena de sentido e objetivo. Enfim, não trago a chave para uma existência sem problemas, e sim um conjunto de ações práticas que já ajudaram muita gente, inclusive a mim, a encontrar seu caminho.
A jornada até aqui…
Não sou guru nem tenho todas as respostas para os enigmas do Universo. Este livro é parte diário, parte guia. De certo modo, sempre estive em uma busca pessoal para descobrir como tudo se encaixa. Então, o que apresento aqui sou eu utilizando todas as horas que passei lendo, escrevendo e falando com pessoas reais, na terapia, para entender um pouco mais sobre o ser humano e sobre o que nos ajuda enquanto estamos aqui. Esta é apenas a minha jornada até o presente momento. Continuo a aprender e a me admirar com as pessoas que encontro. Os cientistas continuam a fazer perguntas melhores e a descobrir respostas melhores. Assim, aqui está o conjunto das coisas mais importantes que aprendi até agora e que ajudaram a mim e as pessoas com quem trabalho a encontrar um caminho em meio à luta humana. Este livro, portanto, não garantirá que você viva o restante de seus dias com um sorriso no rosto. Ele lhe apresentará os instrumentos para ter certeza de que, quando sorrir, será por um sentimento verdadeiro. Ele vai oferecer as ferramentas de que você precisa para sempre reavaliar suas atitudes e encontrar sua direção, retornando a hábitos mais saudáveis e à autoconsciência.
As ferramentas podem parecer ótimas na caixa, mas só ajudam quando você as tira de lá e começa a usá-las. Toda ferramenta exige prática. Se você não acertar o prego com o martelo desta vez, volte mais tarde e tente de novo. Humana que sou, também continuo a fazer isso, e incluí apenas técnicas e habilidades que testei e descobri serem realmente úteis. Este livro é um recurso, tanto para mim quanto para você. Continuarei voltando a ele, repetidas vezes, sempre que sentir necessidade. O meu desejo é que você faça o mesmo e que ele seja uma caixa de ferramentas que ajude você pela vida inteira.
PARTE 1
Sobre o desânimo
CAPÍTULO 1
Compreendendo o abatimento
Todo mundo tem dias de desânimo.
Todo mundo.
Mas a frequência desses dias e a intensidade do desânimo variam de pessoa para pessoa.
Pude perceber, ao longo de anos como psicóloga, o quanto as pessoas lutam contra o desânimo sem nunca dizerem nada a ninguém. Amigos e parentes nem sequer imaginariam. Elas mascaram o abatimento, ignoram o problema e se concentram em atender às expectativas. Muitas chegam à terapia depois de terem feito isso durante anos.
Essas pessoas têm a impressão de estar errando em algo. Comparam-se com quem parece estar bem o tempo todo – com quem está sempre sorrindo e, aparentemente, cheio de energia.
Deixam-se levar pela ideia de que algumas pessoas simplesmente são assim e de que a felicidade é algo como um traço de personalidade: ou você tem, ou não tem.
Quando vemos o abatimento puramente como uma falha do cérebro, achamos que não há solução e passamos a nos empenhar em esconder o problema. Tocamos o dia cumprindo nossas obrigações, sorrindo para as pessoas certas, mas nos sentindo sempre meio vazios e derrotados pelo desânimo, sem aproveitar a vida do modo como nos dizem que deveríamos. Repare um pouco na temperatura do seu corpo. Talvez você se sinta perfeitamente confortável, ou pode ser que esteja com muito calor ou muito frio. Embora essas variações possam ser sintoma de infecção ou doença, geralmente resultam de algo à sua volta. É possível que você tenha esquecido o casaco, que costuma bastar para combater o frio. Talvez o tempo tenha ficado nublado e chuvoso. Pode ser que você esteja com fome ou com sede. Quando corre para pegar o ônibus, você nota o corpo esquentando. Nossa temperatura corporal é afetada pelo ambiente, tanto interno quanto externo. E nós também temos o poder de influenciá-la. O mesmo acontece com o nosso estado emocional. Quando nos sentimos desanimados, isso pode ter sido influenciado por diversos fatores internos e externos, mas, quando entendemos quais são essas influências, podemos usar esse conhecimento para nos guiar na direção desejada. Às vezes basta pegar mais um agasalho. Às vezes precisamos de algo mais.
Uma coisa que a ciência tem confirmado e que as pessoas aprendem com frequência na terapia é que temos mais poder de influenciar nossas emoções do que supomos.
Isso significa que podemos trabalhar pelo nosso bem-estar e tomar as rédeas da nossa saúde emocional. E também nos lembra que o nosso estado de espírito não é fixo nem define quem somos – é apenas uma sensação que experimentamos.
Não estou dizendo que podemos afastar de vez a tristeza, o desânimo ou a depressão. A vida continua a nos apresentar dificuldades, dores e perdas. Isso sempre se refletirá em nossa saúde física e mental. O que estou afirmando, ao contrário, é que podemos montar uma caixa de ferramentas com itens que nos ajudem a lidar com esses reveses. Quanto mais usarmos essas ferramentas, mais ganharemos habilidade para aplicá-las. Assim, quando surgirem problemas que possam nos abater, teremos recursos para enfrentá-los.
Os conceitos e habilidades descritos aqui são para todos. Pesquisas mostram que eles são úteis para pessoas deprimidas, mas não são um medicamento. São habilidades para viver melhor, que todos podemos usar ao passar por oscilações de humor, sejam grandes ou pequenas. Mas se você tem um transtorno mental grave ou duradouro, não deixe de procurar também a ajuda de um profissional especializado.
Como se criam os sentimentos
Dormir é uma bênção. Mas de repente o despertador agride meus ouvidos, berrando aquele som que eu detesto. Meu corpo todo vibra, surpreendido pela onda de choque. Recorro a função soneca e torno a me deitar. Minha cabeça dói e eu me sinto irritada. Função soneca de novo. Se eu não me levantar logo, as crianças vão se atrasar para a escola. Preciso me aprontar para a reunião. Fecho os olhos e visualizo a lista de tarefas que me aguarda sobre a mesa do escritório. Pavor. Irritação. Cansaço. Não quero lidar com o dia de hoje.
De onde terá vindo esse desânimo? Como foi que acordei assim? Vamos retroceder. Ontem à noite fiquei acordada até tarde, trabalhando. Quando me deitei, estava cansada demais para descer novamente e buscar um copo d’água. Depois meu bebê acordou duas vezes no meio da noite. Não dormi o suficiente e estou desidratada. O alarme alto me despertou de um sono profundo, disparando os hormônios do estresse pelo meu corpo. Meu coração começou a bater acelerado e a sensação que tive foi de já estar estressada.
Cada um desses sinais manda informações ao cérebro. A pessoa não está bem, então o cérebro sai à caça de razões para isso. Ele procura e encontra. Portanto, meu desconforto físico, acarretado pela falta de sono e pela desidratação, ajudou a criar esse estado.
Nem todo abatimento é sinal de desidratação, mas, ao lidarmos com o estado emocional, é preciso lembrar que ele não está só na nossa cabeça. Está também no corpo, nos relacionamentos, no passado e no presente, na situação atual e no estilo de vida. Está em tudo o que fazemos e não fazemos, na nossa dieta e nos nossos pensamentos, nos nossos movimentos e nas nossas lembranças. O modo como nos sentimos não é um simples produto do nosso cérebro. O cérebro trabalha constantemente para dar sentido ao que acontece. Mas dispõe apenas de algumas pistas com que trabalhar. Ele recebe informações do corpo (por exemplo, batimentos cardíacos, respiração, pressão arterial, hormônios) e extrai informações de cada um de nossos sentidos – do que podemos ver, ouvir, tocar, provar e cheirar. Extrai informações dos nossos atos e pensamentos, junta todas essas pistas com as lembranças de quando sentimos coisas parecidas no passado e dá uma sugestão, um bom palpite sobre o que está acontecendo e o que devemos fazer. Às vezes esse palpite pode ser sentido como uma emoção ou um estado de ânimo. O significado que damos a essa emoção e nossa maneira de reagir a ela, por sua vez, mandam informações de volta ao corpo e à mente a respeito do que fazer em seguida (Feldman Barrett, 2017). Portanto, quando se trata de mudar o estado emocional, os ingredientes determinam o resultado.
A via de mão dupla
Muitos livros nos dizem para corrigir nosso modo de pensar. Declaram: “O que você pensa mudará sua maneira de sentir.” Mas frequentemente perdem de vista algo crucial. A história não termina aí. A relação funciona nos dois sentidos. O modo como nos sentimos também influi nos tipos de ideias que podem surgir na nossa mente, tornando-nos mais vulneráveis a experimentar pensamentos negativos e autocríticos. Mesmo quando sabemos que nossos padrões de pensamento não estão ajudando, é incrivelmente difícil pensarmos de outra maneira quando nos sentimos para baixo – e é até mais difícil seguirmos a regra de “só pensamentos positivos”, frequentemente sugerida nas redes sociais. A mera presença dos pensamentos negativos não significa que eles tenham vindo primeiro e causado o abatimento. Portanto, pensar de outra maneira pode não ser a única solução.
Nosso modo de pensar não é tudo. O que fazemos e não fazemos também influencia nosso humor. Quando nos sentimos para baixo, tudo o que queremos é ficar escondidos. Não sentimos vontade de fazer nada do que normalmente gostamos, então não fazemos. Mas com o tempo isso faz com que nos sintamos ainda pior. Esse círculo vicioso também se aplica ao nosso estado físico. Digamos que a pessoa tenha estado atarefada demais para fazer exercícios durante algumas semanas. Ela sente cansaço e desânimo, de modo que exercitar-se é a última coisa que tem vontade de fazer. Quanto mais evita o exercício, mais se sente letárgica e com menos energia. Quando a energia se reduz, a vontade de fazer exercícios também diminui, abalando imensamente o humor. O desânimo dá vontade de fazer escolhas que desanimam ainda mais.
Figura 1: Espiral descendente do abatimento, mostrando como alguns dias de baixo-astral podem nos fazer entrar em uma espiral de depressão. Romper o ciclo é mais
fácil quando você o reconhece desde cedo e age sobre ele. Adaptada de Gilbert (1997).
É fácil entrarmos nesse círculo vicioso, porque todos os aspectos diferentes da nossa experiência impactam uns aos outros. No entanto, embora isso nos mostre como podemos ficar presos em uma rotina nociva, também nos mostra a saída.
Todos esses fatores interagem para criar nossa experiência. Mas não experimentamos nossos pensamentos, sensações corporais, emoções e ações separadamente. Nós os experimentamos em conjunto, como uma coisa só. Tal como em um trançado de vime, é difícil notarmos cada haste individualmente. Apenas vemos o cesto como um todo. É por isso que precisamos treinar para decompô-lo em partes. Ao fazê-lo, enxergamos com mais facilidade as mudanças que somos capazes de realizar. A figura 2, a seguir, mostra uma forma simples de decompor a nossa experiência.
Ao analisarmos o cenário dessa maneira, podemos começar a reconhecer não apenas o que fazemos para nos manter estagnados, mas também o que podemos fazer para melhorar.
A maioria das pessoas chega à terapia sabendo que quer mudar o modo como se sente. Elas têm alguns sentimentos desagradáveis (às vezes, excruciantes), que não querem mais vivenciar, e sentem falta de algumas emoções mais enriquecedoras (como alegria e empolgação), que gostariam de sentir com mais frequência. Não existe um botão que possamos apertar para produzir nosso conjunto desejado de emoções diárias. Mas sabemos que o que sentimos está diretamente relacionado com o estado do nosso corpo, com os pensamentos aos quais dedicamos mais tempo e com nossos atos. São essas outras partes da nossa experiência que podemos influenciar e modificar. A retroalimentação constante entre cérebro, corpo e ambiente significa que podemos usá-los para influenciar o que sentimos.
Figura 2: Quanto mais tempo passamos com pensamentos negativos, maior a probabilidade de nos sentirmos para baixo. Mas esse desânimo também nos torna mais vulneráveis a mais pensamentos negativos. Isso nos mostra como ficamos aprisionados em círculos viciosos de abatimento, mas também nos mostra a saída. Adaptada de Greenberger & Padesky (2016).
Por onde começar
O primeiro passo para começar a compreender o abatimento é desenvolver a consciência de cada aspecto da experiência. Isso significa, simplesmente, notar cada um deles. Essa consciência começa quando olhamos para trás. Repassamos mentalmente o dia vivido e escolhemos os momentos a serem examinados em detalhes. Depois, com o tempo e a prática, vamos nos tornando capazes de notá-los na hora em que acontecem. É aí que temos a oportunidade de modificar as coisas.
Na terapia, posso pedir a uma pessoa desanimada que observe como sente o abatimento e seu corpo. Talvez ela note que se sente cansada e letárgica, ou que anda sem apetite. Talvez também note que, quando se sente para baixo, tem ideias como: “Hoje não estou com vontade de fazer nada. Estou com muita preguiça. Nunca terei sucesso. Sou um fiasco.” E talvez tenha vontade de voltar a passar um tempo escondida no banheiro do trabalho, vasculhando as redes sociais.
Quando você se familiariza com o que acontece no interior do seu corpo e da sua mente, pode expandir essa consciência a fim de olhar para o que está acontecendo no seu ambiente e nos seus relacionamentos, e ver o impacto que isso exerce na sua experiência interna e no seu comportamento. Não tenha pressa para conhecer os detalhes. Quando me sinto assim, em que fico pensando? Quando me sinto assim, como fica o meu corpo? Eu estava cuidando bem de mim nos momentos que levaram a esta sensação? Isto é uma emoção ou apenas um incômodo físico proveniente de uma necessidade não atendida? As perguntas são inúmeras. As respostas podem ser claras, mas às vezes tudo parece complexo demais. Não se preocupe. Continuar a explorar e anotar as experiências ajudará a construir a autoconsciência sobre o que melhora as coisas e o que as faz piorar.
Caixa de ferramentas: Reflita sobre o que contribui para seu abatimento.
Use o diagrama transversal (ver figura 2, página 23) para praticar a habilidade de captar os diferentes aspectos da experiência, tanto positivos quanto negativos. Você encontrará na página 268 um diagrama em branco que poderá preencher. Faça uma pausa de 10 minutos e escolha um momento do dia sobre o qual refletir. Talvez você note que alguns quadrantes são mais fáceis de preencher do que outros.
Refletir sobre os momentos depois que eles acontecem ajudará você a desenvolver aos poucos a capacidade de notar as ligações entre esses aspectos da sua experiência, à medida que eles acontecem.
Experimente: Você pode usar estas perguntas para preencher o diagrama. Ou pode usá-las para simplesmente escrever em um diário.
-
- Qual era o contexto do momento sobre o qual você está refletindo?
- O que estava acontecendo logo antes de você notar esse novo sentimento?
- Quais eram os seus pensamentos na ocasião?
- Onde você estava concentrando sua atenção?
- Quais eram as emoções presentes?
- Em que parte do corpo você sentiu isso?
- Que outras sensações físicas você notou?
- Que vontades você sentiu?
- Você agiu a respeito dessas vontades?
- Se não agiu, o que fez em vez disso?
- De que modo os seus atos influenciaram as emoções?
- De que modo os seus atos influenciaram seus pensamentos e crenças a respeito da situação?
Resumo do capítulo
- A oscilação de humor é normal. Ninguém fica feliz o tempo todo. Mas também não precisamos ficar à mercê disso. Há coisas que podemos fazer para ajudar.
- O desânimo tende mais a refletir necessidades não atendidas do que um mau funcionamento do cérebro.
- Cada momento da nossa vida pode ser decomposto nos diferentes aspectos da nossa experiência.
- Todos esses elementos influenciam uns aos outros. Isso nos mostra como podemos cair em uma espiral descendente de desânimo, ou até de depressão.
- As nossas emoções são construídas a partir de vários elementos que podemos influenciar.
- Não podemos escolher diretamente nossas emoções e ligá-las ou desligá-las, mas podemos usar as coisas que somos capazes de controlar para alterar aquilo que sentimos.
- O uso do diagrama transversal (ver figura 2, página 23) ajuda a aumentar a consciência do que exerce impacto no nosso humor e do que nos mantém estagnados.