Dança pra mim?
Dança pra mim?”, eu pedi a ela enquanto estávamos deitados na cama sob aquele lençol que cobria somente uma de nossas pernas. Mesmo sabendo que ela ficaria com as bochechas vermelhas ao ouvir aquilo, resolvi, sem pudores, dividir uma de minhas vontades secretas.
Quando nos relacionamos com alguém e não temos vergonha de compartilhar nossos desejos com essa pessoa, nossas loucuras ou fantasias mais obscuras, sabemos que estamos no caminho certo. Ela sempre foi muito tímida e retraída e, por isso mesmo, pedi para ela dançar. Não só pela dança em si, nem unicamente por mim, mas porque eu queria muito que ela se libertasse aos pouquinhos das correntes que tinha em volta do corpo. Queria que ela aprendesse a se entregar, não exclusivamente a mim, mas a ela mesma. Eu sabia que ela precisava se sentir bonita, atraente, segura, mesmo quando meus olhos brincassem de polícia e ladrão com seu corpo.
Lembro um dia em especial quando transamos embaixo do chuveiro. Talvez, só de ler isso, ela já morresse de vergonha na época. Naquela ocasião, no meio de um sexo comum, daqueles convencionais, na cama, com posições triviais e previsão para acabar ainda em horário comercial, sugeri: “Vamos transar no chuveiro?” Fiz o convite com os olhos, a cabeça e o corpo, pois se usasse as palavras daria tempo demais para ela pensar, ponderar e recusar aquela situação tão inédita. E eu sabia que ela era daquelas que precisam ser levadas pela mão até a porta de uma nova experiência.
Puxei-a gentilmente pelos braços, liguei o chuveiro, demorando um pouco até acertar a temperatura ideal, mas continuei com os beijos, como se nada tivesse acontecido. E tudo aconteceu. Entre a água que corria pelo seu corpo e o olhar pensativo decidindo se molharia o cabelo ou não, o mais gostoso foi vê-la não conseguindo se apoiar em nada, com as mãos trêmulas, perdidas, de olhos fechados, começando a se jogar no que não conhecia. Naquele momento, ela estava inteiramente ali, presente, vivendo o que devia ser vivido. Se ela soubesse como foi lindo vê-la se entregando sem questionar, apenas confiando em mim e, principalmente, confiando nela mesma, tenho certeza de que já teria feito isso antes.
Mesmo após várias aventuras e redenções como essa, ela ainda tem receio de muita coisa, inseguranças que, dia após dia, tento ajudá-la a apagar com as mãos. Aos poucos, ela me dá brechas, breves espaços, para mostrar que uma mulher bonita por dentro, quando coloca com segurança suas vulnerabilidades no varal do coração, também se torna bonita por fora. Ajudar e apoiar a mulher a desenraizar suas inseguranças é uma das coisas mais bonitas que um homem pode fazer por ela. Não que tenhamos todo esse poder, longe disso, mas se pudermos estar junto de quem amamos nesses momentos, por que não fazer? E eu a amo tanto!
Pessoas que dançam, que se entregam e que cantam o que sentem no chuveiro criam lembranças e momentos que, convenhamos, seriam desperdiçados caso não fossem vividos. Por isso, sempre que tenho oportunidade, digo: como me segurar para não cantar, mesmo que um pouco desafinado, o que sinto por você? Como viver intensamente um amor sem deixar o medo de se entregar embaixo da cama? Como ser feliz amando sem deixar claro que você também está sendo amada?
Até hoje ela ainda não dançou pra mim. Mesmo assim, meu coração ainda dança por ela em ritmo de carnaval. Espero que um dia ela dance, e dance muito. Não por mim, mas por ela. Única e exclusivamente por ela.